“Adversidades” levam acionistas a injetar mais 20 milhões de euros na CaetanoBus

Toyota Caetano e japonesa Mitsui voltam a financiar fabricante de carroçarias e autocarros, que faturou 108 milhões em 2023. Há "grandes obstáculos” no Brexit e veículos de aeroportos sem "descolar".

A Toyota Caetano Portugal (TCP) e os japoneses do Mitsui Group avançaram no ano passado com um “apoio adicional” à CaetanoBus para contrariar os “impactos das adversidades” sentidas pela maior fabricante de carroçarias e autocarros em Portugal. À data de fecho do exercício relativo a 2023 encontrava-se registado um empréstimo por contrato de suprimentos de 7,6 milhões de euros e um novo aumento de capital próprio (via prestações suplementares) em 12,4 milhões de euros.

Este reforço do “compromisso” sobre a empresa industrial de Vila Nova de Gaia segue-se às duas injeções no valor conjunto de 25 milhões de euros que os dois acionistas já tinham concretizado nos dois anos anteriores. A totalidade do capital foi subscrita na proporção das respetivas participações – a TCP com 62% e a Mitsui & Co com 38% –, a mostrar também agora que “não abdicaram do plano estratégico de expansão e crescimento”.

“A injeção de capital, conjuntamente com o apoio via contrato de suprimentos, permitiu continuar e implementar os projetos de inovação em curso em tecnologias de mobilidade com zero emissões e responder aos objetivos de expansão para outras áreas geográficas, capacitação dos quadros da empresa e de crescimento do volume de produção”, justifica a empresa no último relatório anual. O conglomerado sediado em Tóquio entrou no final de 2017 através da compra de uma participação inicial de 15%, justificada na altura pela aposta na mobilidade elétrica.

A injeção de capital, conjuntamente com o apoio via contrato de suprimentos, permitiu [à CaetanoBus] continuar e implementar os projetos de inovação em tecnologias de mobilidade com zero emissões e responder aos objetivos de expansão para outras áreas geográficas, capacitação dos quadros da empresa e crescimento do volume de produção.

Relatório anual de 2023 da Toyota Caetano Portugal

Embora o início da construção de carroçarias (ainda em madeira) remonte a 1946 e pela mão do empresário Salvador Fernandes Caetano – fundador do grupo com o mesmo nome e primeiro importador da Toyota em Portugal – a CaetanoBus foi fundada em 2002. Nasceu como uma parceria com a então designada Daimler-Chrysler, tendo o grupo português ficado com 100% do negócio em 2010, quando adquiriu a quota de 26% da gigante de origem alemã.

É na empresa liderada por Patrícia Vasconcelos – substituiu Jorge Pinto há quase quatro anos – que fica concentrada toda a atividade industrial de fabricação de carroçarias e autocarros, com diferentes especificações, destinados ao serviço de transporte urbano, turismo, aeroporto e miniautocarro. Vendeu 355 unidades em 2023, 31% acima do ano anterior, mas ainda muito distante do registo obtido antes da pandemia (656 em 2019). Em termos homólogos, dobrou o volume de negócios para 108 milhões de euros no último exercício, com perdas apenas no segmento dos miniautocarros.

Este crescimento da atividade foi insuficiente, porém, para colocar o EBITDA em terreno positivo (-3,9 milhões de euros) no final do ano. “Face ao EBITDA negativo apresentado e ao plano de investimento, a gestão de liquidez em 2023 obrigou a uma estratégia cuidada e na procura de oportunidades junto da banca nacional e internacional”, descreve a Toyota Caetano Portugal no documento enviado à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) e consultado pelo ECO.

Apesar da “contínua dificuldade” em contrariar os resultados negativos dos últimos anos, prevê alcançar resultados operacionais positivos em 2024. Que, antecipa, será também um ano de “promoção de alterações na gestão, através da otimização para o crescimento, que face a uma concorrência cada vez mais feroz dos OEM [Original Equipment Manufacturer] asiáticos, não deixa alternativa senão de seguir por uma estratégia de alianças, promovendo a partilha de custos, investimentos e desenvolvimento de novas tecnologias”.

Fábrica da CaetanoBus

Na lista de “condicionantes” que estão a afetar a performance inclui a manutenção de um “perfil tendencialmente mais conservador do investimento público, com interferência na disponibilização de subsídios, e no pacote de investimentos privados pela incerteza futura e os excessivos custos do financiamento”. Assim como a “elevada rotatividade de colaboradores”, em particular nas equipas de engenharia e de produção, que provocaram “inevitáveis atrasos nos projetos de desenvolvimento internos e também na capacidade produtiva da empresa”.

Outras das dificuldades citadas pela empresa-mãe do Grupo Toyota Caetano – inclui ainda a importação de veículos das marcas Toyota e Lexus, a divisão de equipamentos industriais e a divisão fabril de Ovar (fabricação e montagem de viaturas Toyota e componentes para autocarros) – são a pressão sobre os custos de produção, nomeadamente os salários; os custos energéticos que “voltaram à agenda com uma preocupação adicional”; ou as elevadas taxas de juro com “significativos impactos” no custo financeiro da empresa, agravados por uma “maior necessidade de financiamento” durante o exercício de 2023.

Brexit traz “grandes obstáculos” no Reino Unido

Fora de Portugal, a CaetanoBus tem duas subsidiárias, com sede na Alemanha (Cobus) e no Reino Unido (Caetano UK). A companhia germânica, instalada em Wiesbaden, fundada em 1983 e atualmente controlada pela empresa portuguesa (59%) e pela Daimler Truck AG, está especializada na venda e assistência técnica de autocarros de aeroporto. Não tem produção própria, adquirindo chassis à Daimler Busses e recorrendo à empresa portuguesa para a produção das respetivas carroçarias e montagem. Faturou 47 milhões de euros em 2023, ano em que vendeu 108 autocarros, menos dois do que em 2022.

A principal acionista da Cobus assinala que o aumento do tráfego aéreo “ainda não teve um impacto significativo nas vendas de novos autocarros, uma vez que os clientes continuaram a limitar os investimentos a um mínimo absoluto devido a perdas significativas durante a pandemia”. Para este ano, ainda assim, confia na “reabertura de negócios de venda adiados nos últimos anos” para prever um aumento das vendas superior a 20%. Um potencial de crescimento que diz estar refletido na carteira de encomendas já assegurada, que em fevereiro correspondia a cerca de 65% das vendas anuais previstas para 2024.

Patrícia Tavares, CEO da CaetanoBus

Já a Caetano UK, estabelecida há quatro décadas e detida a 100% pela empresa portuguesa, é a responsável pela comercialização e serviços de pós-venda de autocarros CaetanoBus no Reino Unido. Ali tem como principais clientes a National Express nos autocarros de turismo e a Abellio London no segmento dos autocarros urbanos com zero emissões que circulam na capital britânica. Em 2023 vendeu 125 autocarros, que comparam com 50 unidades em 2022 e 18 em 2021, registando um volume de negócios de cerca de 47,7 milhões de libras (55,6 milhões de euros à câmbio atual).

A renovação do contrato com a National Express deverá acontecer em 2025, prolongada por três anos e contemplando já veículos elétricos e a hidrogénio, “assegurando uma base sólida para os negócios no Reino Unido nos próximos anos”. Já o Brexit veio trazer “desafios logísticos” para a Caetano UK e intensificou a “preferência dos operadores pelo made in UK”, particularmente nos autocarros elétricos a bateria, favorecendo os construtores britânicos depois da saída da União Europeia. A empresa portuguesa reconhece que “estes têm sido, sem sombra de dúvida, grandes obstáculos à comercialização dos autocarros urbanos zero emissões Caetano no Reino Unido”.

Microcarro em Paris e ameaça política em Lisboa

Em termos consolidados, a Toyota Caetano Portugal, que investiu 10 milhões de euros para fabricar em Ovar um novo veículo elétrico da Toyota para os Jogos Olímpicos de Paris, num total de 260 unidades a entregar até maio, registou um volume de negócios de 512 milhões de euros em 2023, 6,5% acima do ano anterior, com os lucros a aumentarem 18%, para 17,5 milhões. A 31 de dezembro, a empresa que viu os resultados financeiros fixarem-se nos 5,8 milhões negativos, um “aumento bastante considerável” face ao ano anterior (+106%), empregava um total de 1.535 pessoas (vs. 1.629 no final de 2022).

António Costa conduziu o protótipo do modelo elétrico “Acessible People Mover” (APM), que vai ser fabricado pela Toyota Caetano em Ovar, no distrito de AveiroESTELA SILVA/LUSA 9 janeiro, 2024

Com um acréscimo de 15,4% no volume de negócios, para 273 milhões de euros, voltou a estar em destaque a operação da Caetano Auto, que engloba 11 concessões da marca Toyota e 7 da marca Lexus, tem a representação das marcas Caetano Colisão e GlassBack, e está presente desde o Minho ao Algarve com 26 showrooms e oficinas. Face ao ano anterior, vendeu mais veículos novos (21,2%) e menos usados (-3,2%), segundo os dados revelados no relatório anual de 2023, aprovado a 23 de abril na reunião do conselho de administração presidido por José Ramos.

O mesmo documento faz referência às eleições legislativas de março, que deram uma vitória magra à Aliança Democrática (AD), notando que a geometria possível de coligações e a dúvida sobre o nível de apoio parlamentar ao novo Governo “coloca incerteza no horizonte temporal imediato, nomeadamente sobre a sustentabilidade de qualquer solução governativa que poderá não conseguir fazer aprovar orçamentos e ou diplomas centrais no seu programa, em cuja eventualidade poderia o país ir novamente a eleições”.

“A situação política é vincadamente relevante na performance económica do país, designadamente pela necessária clarificação de temas centrais na vida económica do país que foram amplamente debatidos em contexto eleitoral, nomeadamente a sustentabilidade orçamental do Estado, a política fiscal, particularmente taxas de IRS e de IRC, a execução do PRR [Plano de Recuperação e Resiliência] e grandes obras públicas, ou a regulação de diversos setores económicos”, escreve a empresa nortenha.

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