Maioria das empresas em Portugal precisa de ajuda para implementar programas de prevenção da corrupção

Agravar penas, aumentar prazos de prescrição ou criar novos tipos de crimes é algo que não deve ser equacionado já. Regime geral de prevenção da corrupção nacional é bom, só deve ter ligeiros acertos.

A maioria das empresas em Portugal precisa de ajuda na implementação dos programas de prevenção da corrupção e o Mecanismo Nacional de Anti-Corrupção (MENAC) é a entidade que o poderá fazer. No entanto, carece de um reforço de meios.

“Olhando para o tecido empresarial português, é verdade que a esmagadora maioria das empresas precisam de ajuda na adoção e na fomentação dos programas”, afirma Cristina Minoya Perez. E quem pode dar essa ajuda é o MENAC emitindo guias e privilegiando a função pedagógica, deixando de lado, pelo menos nesta primeira fase, a sua função sancionatória”, sugere a head of compliance do Grupo Jerónimo Martins.

Mas, para que o MENAC desempenhe bem esta função é fundamental assegurar que é dotado de recursos, que estes têm formação e que avalie a real eficácia dos programas de prevenção da corrupção, não se limitando a “avaliar se o programa cumpre uma checklist de requisitos”.

Ana Brito Camacho, consultora da Sérvulo, defende que o regime geral de prevenção da corrupção, que determina que as empresas com mais de 50 trabalhadores tenham de ter um plano de prevenção de riscos de corrupção e infrações conexas; um código de conduta; ou um canal de denúncias (entre outras obrigações) deveria sofrer algumas alterações porque “o critério de determinar a aplicação através do número de trabalhadores é sempre escasso. “Não tem a ver com o volume de faturação da empresa e para o regime de prevenção da corrupção não tem ligação àquilo que é o risco efetivo daquele operador no contexto da corrupção”, justifica.

Carolina Mouraz, coordenadora de contencioso e diretora de legal compliance da TAP Portugal, Ana Brito Camacho. advogada da Sérvulo, Cristina Minoya Perez, head of compliance da Jerónimo Martins, Mónica Silvares, editora executiva do ECOHugo Amaral/ECO

Apesar de “tudo poder ser corrido a risco baixo”, admite Ana Brito Camacho, o problema coloca-se a montante. “Até que ponto uma indústria conserveira com 50 trabalhadores tem de ter os mesmos instrumentos de prevenção da corrupção do que uma empresa tecnológica com o mesmo número de trabalhadores que tem relações privilegiadas com o setor público, numa área que é particularmente sensível que é a da contratação pública?”, questiona a advogada da Sérvulo.

“O regime estabelece um critério de entrada demasiadamente objetivo e desligado do risco, por isso é que o regime de branqueamento de capitais é gradativo – as obrigações que estabelece são distintas em função do risco da atividade. Acredito que o futuro nos vai trazer essa evolução”, alvitra, sugerindo que se comece a fazer uma diferenciação entre formas reforçadas e simplificadas ou mitigadas, de cumprimento das obrigações, que permita uma maior colagem ao tecido económico nacional.

“Se quisermos implementar um programa robusto de prevenção da corrupção, com avaliações, com monitorização constante, com tecnologias adequadas, podemos gastar entre 750 mil euros até 1,7 milhões de euros. Foi uma estimativa que fiz, considerando tudo aquilo que o regime impõe e os preços que as ferramentas têm. E nem sequer estou a contar com o custo dos recursos humanos”, sublinha Carolina Mouraz. A coordenadora de contencioso e diretora de legal compliance da TAP sublinha ainda que outra das questões com as quais as empresas se defrontam é a necessidade de “convencer a gestão de topo a apostar no compliance e a considerá-la uma prioridade da empresa. Isso também é um desafio. Depois temos de convencer as outras áreas de negócio que estes procedimentos que queremos implementar não são só um entrave, porque é isso que eles veem. É preciso convencê-los que não, que isto é um retorno a médio-longo prazo, que é muito relevante”, acrescentou.

“Os programas de cumprimento normativo são e devem ser vistos como fator competitivo”, complementa Cristina Minoya Perez. “Por um lado, traz uma grande responsabilidade às empresas no sentido da sua adequada implementação e do seu reforço e melhoria para permanente adequação aos riscos das companhias, sejam elas grandes, pequenas, cotadas e não cotadas. Mas, por outro lado, é indiscutível que é um fator competitivo e deve sim ser visto como tal”, especificou a head of compliance do Grupo Jerónimo Martins.

Para a responsável “o maior selo de reconhecimento público” de qualquer entidade, seja ela pública ou privada, “é a credibilidade e a reputação”. Mais do que certificações ou outros selos atribuídos por entidades reguladoras, o “o maior incentivo à criação de programas de cumprimento normativo é a credibilidade e a reputação que confere às entidades que funciona como uma porta de entrada junto do mercado, nas relações com acionistas, com fornecedores, com parceiros, com comunidades envolventes, com clientes, com consumidores. Portanto, é da maior valia”, defende.

Promover programas de certificação dos programas de compliance é algo que Carolina Mouraz vê com bons olhos, e até poderia ser um critério de ponderação nos concursos públicos, assim como a aposta em incentivos positivos para o cumprimento normativo, ou incentivos fiscais para as empresas que demonstrem ter programa eficazes e robustos de prevenção da corrupção.

Não faz muito sentido, nesta altura do campeonato, pensar em agravar penas, aumentar prazos de prescrição, criar novos tipos de crimes. Não acho que seja esse o caminho” diz a coordenadora de contencioso e diretora de legal compliance da TAP. “A nossa legislação é boa, é forte, do melhor que a União Europeia tem. Portanto, acho que não faz sentido fazer grandes alterações. Mas, a fazer-se alguma, seria no artigo 11 do Código Penal, que prevê a responsabilidade penal das pessoas coletivas, para dar relevância expressa aos programas de cumprimento normativo para efeitos da desresponsabilização da pessoa coletiva”, sugeriu.

Cristina Minoya Perez recorda que o direito premial já existe na lei nacional e que se devem aproveitar os bons passos que já foram dados. “Não quero com isto dizer que não há sempre espaço para melhoria, seguramente, mas este é um bom passo”, sublinha

“A solução como está delineada é um primeiro passo, mas é curta”, considera Ana Brito Camacho. “Vamos ter de criar um mecanismo mais evidente nos seus resultados para as empresas que se veem envolvidas”, defende a advogada da Sérvulo.

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