Turistas ainda não têm “sustentabilidade no mindset”, mas aposta é inevitável

  • Capital Verde
  • 28 Junho 2024

Tecnologia, inovação e cooperação terão papel decisivo na adoção de boas práticas de sustentabilidade pelo setor do turismo, defendem especialistas.

O preço e as características do destino procurado ainda dominam o processo de escolha dos turistas, mas a adoção de práticas sustentáveis será determinante para a atratividade futuras das empresas do setor. A tecnologia, a inovação e a cooperação podem facilitar a jornada, defenderam os oradores do segundo think tank “A Inovação Energética e a Competitividade Setorial”, uma iniciativa da Helexia Portugal, com a Deloitte, a PLMJ e o ECO.

“Quando lançámos a Estratégia 2027, em 2017, houve um compromisso coletivo do setor. A sustentabilidade é um objetivo central da nossa estratégia porque acreditamos que o desenvolvimento turístico tem de ser sustentável como base, e, depois, assumimos compromissos específicos de metas económicas, ambientais e sociais“, começou por explicar Sérgio Guerreiro, diretor coordenador da Direção de Estratégia e Gestão do Conhecimento do Turismo de Portugal, durante o think tank que decorreu esta terça-feira, na Deloitte.

Hoje em dia, temos 70% das empresas do setor do turismo a reportarem boas práticas na área da gestão da energia, da água e de resíduos.

Sérgio Guerreiro, Senior Director for Strategy & Knowledge Management at Turismo de Portugal.

O responsável pelo Turismo de Portugal acrescentou, ainda, que “todos, sem exceção, nos diversos segmentos da atividade turística, têm abraçado este tema. Hoje em dia, temos 70% das empresas do setor do turismo a reportarem boas práticas na área da gestão da energia, da água e de resíduos, que são temas cada vez mais relevantes”.

Neste sentido, Sérgio Guerreiro referiuo programa “Empresas Turismo 360º”, criado pelo Turismo Portugal com o objetivo de “guiar as empresas do setor nas práticas ESG, que serão obrigatórias na gestão das empresas”. Para já, este programa conta com 300 empresas, que já assumiram o compromisso de reportar as suas medidas. “É um universo pequeno, mas é um caminho”, disse.

Apesar dos esforços que o setor do turismo tem vindo a fazer para se tornar mais sustentável, há outros setores que, apesar de não pertencerem a esta indústria, acabam por estar associados a ela. Exemplo disso é o setor dos transportes, principalmente a aviação, que, com o crescente número de turistas, também tem vindo a aumentar o número de viagens e, consequentemente, o nível de emissões.

Há diversos estudos e análises disponíveis sobre os setores relacionados com o turismo que geram emissões e o transporte é o primeiro que salta à vista, em particular com a aviação. Contudo, apesar de não ser o turismo a influenciar diretamente todas as emissões da indústria da aviação, ele é relevante para o turismo. No panorama geral, tirando as emissões diretas no turismo, todas as outras são uma consequência de outros planos”, explicou Pedro Antão Alves, diretor comercial da Helexia Portugal.

Em 2030, não deveríamos ter mais emissões de gases com efeito de estufa do que 55% da base, que foi medida em 1990. A partir de 2050, deveríamos ser neutros em emissões.

Pedro Antão Alves

Diretor comercial da Helexia Portugal

Apesar de haver uma correlação viagens e turismo, o responsável da Helexia considera que não é da responsabilidade do setor do turismo resolver a sustentabilidade do setor dos transportes. Ainda assim, assumiu a importância de endereçarem aquilo que está ao seu alcance: “Em 2030, não deveríamos ter mais emissões de gases com efeito de estufa do que 55% da base, que foi medida em 1990. A partir de 2050, deveríamos ser neutros em emissões. E o setor do turismo alinha com estas metas genéricas“.

O preço ainda é o que mais ordena

O impacto está, muitas vezes, relacionado com as escolhas dos próprios viajantes. Mas estará a mudança na mão de quem viaja ou de quem oferece as soluções? De acordo com Rui Gidro, partner da Deloitte, “no curto prazo, quando as pessoas estão a tomar a decisão de viajar, não têm a sustentabilidade no seu mindset nem como um critério de decisão. Os principais critérios de decisão são o preço e a caracterização do destino que a pessoa pretende ir”.

No entanto, o partner da Deloitte considera que os destinos, se quiserem garantir que continuam a ter oferta daqui a 10/15 anos, deverão começar a adotar práticas mais sustentáveis. “Se quero continuar a ter o meu destino e a minha oferta genuína, distintiva, com a atração e os valores que tem hoje em dia, então tenho de ter um conjunto de práticas sustentáveis. Diria que não é tanto uma decisão da parte do viajante, mas também diria que não é uma questão isolada do turismo”, referiu.

No curto prazo, quando as pessoas estão a tomar a decisão de viajar, não têm a sustentabilidade no seu mindset nem como um critério de decisão. Os principais critérios de decisão são o preço e a caracterização do destino que a pessoa pretende ir.

Rui Gidro

Partner da Deloitte

Esta mudança é importante para manter a viabilidade dos negócios, até porque a confluência de gerações que se vive atualmente, “cujos valores e formas de olhar para o equilíbrio do planeta são completamente diferentes”, vai, de acordo com Sérgio Guerreiro, potenciar a adoção de boas práticas ambientais. “Estas são as pessoas que vão tomar decisões dentro de pouco tempo e é bom que a nossa indústria esteja preparada para isso“, alertou.

O responsável pelo Turismo de Portugal acrescentou, ainda: “Eu acho que a chave da competitividade do setor do turismo em Portugal, que é, de acordo com um relatório recente do World Economic Forum, o 12.º mais competitivo do mundo, é pensar o futuro antes dos outros. O nosso papel é procurar antecipar e estar na linha da frente deste processo de mudança“.

Financiamento, inovação e tecnologia são soluções

Estar na “linha da frente” implica investimento, mas esse investimento também depende do financiamento de alguns programas e de parcerias com boas soluções. Nesse sentido, Sérgio Guerreiro destacou a importância de colocar instrumentos à disposição das empresas: “Nós colocamos uma linha de financiamento dedicada às empresas que pretendem fazer a adaptação dos seus sistemas e infraestruturas para poderem fazer a racionalização do uso de energia, mantendo níveis de serviço elevados junto dos seus clientes. E criamos, com o turismo do Algarve, um selo de save water para procurar criar uma comunidade de empresas que são indutoras e que adotam este tipo de medidas”.

Estamos a cerca de dois anos de ter as baterias economicamente viáveis e, mesmo com pouca área para energia solar, com as baterias, cada vez mais os players do mercado podem ter independência energética do ponto de vista do preço.

Pedro Antão Alves

Diretor comercial da Helexia Portugal

“Hoje em dia há cada vez mais soluções tecnológicas que nos permitem ter diversidade de opções e a inovação e a tecnologia vão ter um papel crítico nesse domínio. Nós temos um ecossistema de inovação bastante interessante e diversas startups com soluções de gestão eficiente de energia, que envolve os turistas nesse processo. É bom percebermos que o turista tem de fazer parte desta equação, portanto criarmos soluções em que envolvemos o turista para que ele próprio faça parte deste processo de mudança”, disse.

Neste sentido, Pedro Antão Alves referiu um conjunto de medidas que considera fundamentais para esta transição. A primeira é a eletrificação, já que considera que “o setor do turismo, em geral, pode ter todas as suas necessidades energéticas supridas através da energia elétrica“. O segundo é o potencial de ter geração local renovável e, neste ponto, apesar da energia fotovoltaica ser uma opção, a verdade é que o responsável da Helexia lembrou que esta teria resultados diferentes para, por exemplo, um hotel na cidade (que não tem espaço para colocar um número suficiente de painéis solares para suprir as suas necessidades) e um hotel rural (com mais espaço para colocar mais painéis).

Muitas destas soluções até surgem num contexto cooperativo entre várias entidades da cadeia de valor. Se houver uma coordenação e uma cooperação entre elas, conseguem chegar a soluções e caminhar para a sustentabilidade do próprio setor.

Rui Gidro

Partner da Deloitte

A terceira medida mencionada por Pedro Antão Alves foi a eficiência na gestão da energia, acrescentando que “estamos a cerca de dois anos de ter as baterias economicamente viáveis e, mesmo com pouca área para energia solar (exemplo dos hotéis), com as baterias, cada vez mais os players do mercado podem ter independência energética do ponto de vista do preço“.

Ainda sobre as soluções, Rui Gidro destacou a importância da cooperação entre todos os players. “Muitas destas soluções até surgem num contexto cooperativo entre várias entidades da cadeia de valor. Se houver uma coordenação e uma cooperação entre elas, conseguem chegar a soluções e caminhar para a sustentabilidade do próprio setor. Acho que não devemos ver isto numa perspetiva só de empresas, mas temos de ver isto numa perspetiva mais holística“, concluiu.

Assista a toda a conversa aqui:

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Turistas ainda não têm “sustentabilidade no mindset”, mas aposta é inevitável

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião