Governo propõe subida do salário mínimo no Estado aquém do previsto no acordo
Governo quer aumentar a base remuneratória em 48,67 euros ou 5,9% face ao valor atual. E mostrou abertura para atualizar os restante níveis salariais acima de 2%. Sindicatos defendem, pelo menos, 6%.
O Governo quer aumentar o salário mínimo no Estado em 48,67 euros ou 5,9% para 870,50 euros em 2025. Significa que a base remuneratória da Administração Pública (BRAP) vai ficar 50 cêntimos acima da retribuição mínima definida para o setor privado, de 870 euros, revelou esta quarta-feira a presidente do Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado, Maria Helena Rodrigues, à saída da primeira ronda negocial sobre a atualização do acordo plurianual com a secretária de Estado da Administração Pública, Marisa Garrido.
Mas esta atualização fica aquém da subida de cerca de 52 euros ou de 6,3% que está plasmado no acordo assinado pelas estruturas sindicais da UGT (STE e Fesap) e que o Executivo assegurou que iria cumprir. O ECO questionou o Ministério das Finanças se iria manter ou corrigir a proposta e aguarda uma resposta.
Este encontro ocorre no mesmo dia em que o Conselho de Ministros aprovou o Orçamento do Estado para 2025 e na véspera da entrega da proposta no Parlamento.
“Em relação à BRAP, a proposta é de 870,50 euros. Para já, é o que temos e é o que vamos estudar”, afirmou a líder da Frente Sindical que desvalorizou a diferença curta de 50 cêntimos em relação ao salário mínimo, que consta do acordo assinado entre Governo, patrões e sindicatos. Apenas a CGTP ficou fora deste pacto.
Já o coordenador da Frente Comum, Sebastião Santana, foi bem mais crítico e classificou esta proposta de “provocação” por representar apenas uma diferença de 50 cêntimos face ao salário mínimo. O dirigente sindical indicou que “o Governo disse que vai cumprir com o acordo assinado com as outras estruturas sindicais de aumentos de 52 euros ou de 2%” e confirmou que a atualização da BRAP proposta “fica aquém do acordado”.
Do mesmo modo, o secretário-geral da Fesap, José Abraão, considera que “não faz sentido” uma proposta de aumento da BRAP para 870,5 euros, “porque nem sequer cumpre os 52 euros de que está no acordo”. No entanto, o sindicalista reconheceu que, no passado, Marisa Garrido tinha garantido que o Governo iria cumprir com o pacto, pelo que espera um avanço nas próximas reuniões. “O Governo disse que no que diz respeito ao acordo e aos aumentos salariais iria procurar cumprir”, frisou.
Neste momento, a base remuneratória da Administração Pública (BRAP) está nos 821,83 euros mensais brutos, isto é, 1,83 euros acima do salário mínimo no privado. Assim, o Governo pretende encurtar a distância entre o ordenado mínimo do público e do privado para 50 cêntimos.
Esta evolução, de 821,83 euros para 870,50 euros, em 2025, representa uma atualização de 48,67 euros ou de 5,9%, ou seja, é ligeiramente abaixo do salto definido para o privado, de 50 euros ou de 6,1%. Em outubro de 2023, em outubro de 2023, um quinto dos funcionários públicos, isto é, 164 mil trabalhadores em 749,7 mil, ganhavam o salário mínimo possível no Estado.
De lembrar que a BRAP subiu 52,63 euros para 821,83 euros, este ano, face ao valor de 769,2 euros praticado em 2023, o que corresponde a uma variação positiva de 6,8%. O que o Governo propõe agora de uma subida de 48,67 euros ou de 5,9% é menor que o firmado no pacto plurianual para a valorização dos trabalhadores da Administração Pública. Nesse acordo, ficou definido que os trabalhadores seriam aumentados em cerca de 52 euros até 1.754 euros e em 2% no caso de vencimentos superiores.
Para além disso, Santana referiu que, “não havendo alteração às tabelas de retenção na fonte de IRS e das próprias tabelas de IRS, “estes trabalhadores vão passar a pagar IRS por 50 cêntimos”. “Isto é nitidamente uma provocação”, insistiu. No entanto, é preciso lembrar que salários até cerca de 934 euros não fazem descontos e, com a apresentação de despesas à coleta, estes rendimentos também ficam praticamente isentos do imposto.
Frente Comum ameaça com greve geral a 25 de outubro
Quanto aos restantes níveis remuneratórios, segundo Maria Helena Rodrigues, a secretária de Estado mostrou-se disponível para aumentos acima de 52 euros até 1.754 euros mensais brutos e de 2% para montantes superiores, tal como estão definidos no acordo plurianual para a valorização dos rendimentos da Função Pública. O STE, afeto à UGT, defende um impulso remuneratório de 6% para todos. “Sobre essa proposta de 6%, o Governo ficou de estudar. Não há ainda uma decisão. Esta é a primeira reunião”, indicou Maria Helena Rodrigues.
Maria Helena realçou que o Governo referiu que a diferença entre os 2% de aumento, previstos no acordo, e a proposta de 6% é de apenas quatro pontos: “Então, quatro mais dois dá seis, diz o Governo, é uma conta fácil de fazer, o que até nos surpreendeu. Vamos ver até onde podemos ir”, indicou.
A Fesap defende antes uma atualização salarial de 6,5% num mínimo de 85 euros. Mas, no encontro com o Executivo, José Abraão apenas teve a indicação de que a “intenção do Governo é cumprir o que está no acordo”. “Já anteriormente a secretário de Estado tinha dito que o acordo, no que respeita a política salarial seria garantido. Estamos a falar de política de mínimos e o mínimo já foi ultrapassado em 2024 quando em vez de 2% tivemos 3%, não podemos caminhar no sentido dos atuais níveis remuneratórios”, afirmou o líder da Fesap, sublinhando que a estrutural sindical está disponível “25 horas por dia para ser parte da solução”.
“Temos um acordo de mínimos que tem de ser cumprido, para melhorá-lo tem de acontecer como aconteceu em sede de concertação social com os parceiros sociais. Como é que é possível que o maior empregador do país nem sequer dá o exemplo face ao que exige no setor privado”, atirou, classificando o atual acordo de “insuficiente”. Ainda assim, o líder da Fesap diz que “ainda há espaço para a negociação” e acredita que o acordo será aperfeiçoado.
Sebastião Santana, da Frente Comum, mostrou-se mais cauteloso com a “contraproposta” que o Governo deverá apresentar para a semana com atualizações salariais mais ambiciosas: “A proposta em cima da mesa é a da manutenção de um acordo que apelidamos de acordo de empobrecimento, com um aumento de 52 euro ou 2%. Isto não serve de maneira nenhuma para fazer face a um aumento de 23% dos bens alimentares essenciais, e de mais de 50% nos créditos à habitação”. No entanto, o coordenador da Frente Comum também referiu que “o Governo sinalizou que estaria preparado para evoluir na negociação”.
Se a aproximação face às reivindicações da estrutura sindical, afeta à CGTP, de aumentos salariais de 15% com um mínimo de 150 euros, for residual, a Frente Comum ameaça já com uma greve geral. “Esta proposta vai trazer muitos milhares de trabalhadores para Lisboa no dia 25 de outubro. Temos uma manifestação agendada e o Governo vai ser confrontado com a força da administração pública”, sublinhou Santana.
Quanto ao subsídio de refeição, que está, atualmente, nos seis euros por dia, o STE exige uma atualização para dez euros e a Frente Comum defende 10,50 euros. “Não temos ainda a proposta do Governo. Esta foi a primeira reunião. Vamos ter de ver a resposta do Governo na segunda reunião. Em termos remuneratórios, não temos mais do que isto”, apontou Maria Helena Rodrigues. O coordenador da Frente Comum indicou apenas que está à espera da “contraproposta do Governo”.
Nesta primeira reunião para a negociação anual geral, o Governo apenas apresentou uma proposta para a atualização da BRAP sem mostrar o caminho que pretende trilhar em relação aos restantes patamares remuneratórios. Uma vez que o Conselho de Ministros desta quarta-feira já vai fechar a proposta do Orçamento do Estado (OE) para 2025, Maria Helena foi questionada se não estranha o facto de o Executivo ainda não ter mostrado aos sindicados o desenho da revisão do acordo plurianual, que terá de ter uma dotação no OE.
Mas a líder do STE desvalorizou o timing. “Todos sabemos que o Orçamento do Estado que entra é uma proposta que tem um calendário e o processo da negociação entre os vários partidos e, em princípio, esse processo altera para melhor a proposta e é o que esperamos”, sublinhou.
Para além disso, a sindicalista lembrou que “o OE têm, normalmente, todos os anos uma dotação provisional, que serve para exceções, mas que tem servido, no passado, para acompanhar as atualizações remuneratórias da Administração Pública”, acrescentou.
“Já cá andamos há algum tempo e já fizemos processos negociais depois do Orçamento aprovado. Queríamos ter neste momento não só a proposta de um aumento bom e razoável, mas nunca assim aconteceu, estamos no processo negocial e continuamos a dizer que se houver boa-fé negocial conseguiremos chegar a um ponto”, frisou.
A Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas determina, no artigo 351.º que “a negociação coletiva geral tem periodicidade anual, devendo iniciar-se a partir do dia 1 de setembro”. No entanto, não indica que o processo tem de se iniciar antes da aprovação do OE. “A negociação inicia-se com a apresentação, por uma das partes, de proposta fundamentada sobre qualquer das matérias previstas no artigo anterior, procedendo-se seguidamente à calendarização das negociações, de forma que estas terminem tendencialmente antes da votação final global da proposta de lei do Orçamento do Estado“, de acordo com o mesmo diploma.
Para Sebastião Santana, a decisão de o Governo começar a negociar em plena véspera da entrega do OE é um mau sinal. “Isto revela muito da boa-fé negocial deste Governo. No dia em que aprova o OE, em Conselho de Ministros, é que se senta à mesa com os trabalhadores da administração pública para discutir os aumentos. Isto é um enviesamento”, criticou.
De igual modo, o líder da Fesap frisou que “houve tempo para que este processo tivesse começado a 1 ou 15 de setembro”. “Podíamos ter construído um processo que não tinha que se iniciar agora. O nosso desconforto é evidente”, lamentou José Abraão.
Revisão das carreiras de inspeção e técnico superior de saúde só a partir de 2025
Ainda sem adiantar muitos detalhes sobre a proposta do Governo, a secretária de Estado da Administração Pública voltou a comprometer-se com a atualização das carreiras ainda não revistas, tal como está previsto no acordo plurianual para a valorização da Função Pública que as federações sindicais da UGT assinaram com o anterior Governo socialista, de António Costa.
“Tivemos da parte do Governo uma proposta de reuniões tendo em conta a revisão das carreiras ainda não revistas como as de técnico superior de saúde, das inspeções, da administração hospitalar, das carreias de reinserção social. Já estava no acordo plurianual do anterior Governo e este Governo disse que iria manter”, afirmou Maria Helena Rodrigues. A dirigente sindical considera que “esta questão é relevante” e, por isso, faz “um balanço positivo” do encontro.
De acordo com o calendário apresentado ao STE, o Governo pretende, ainda este ano, rever as carreiras de oficiais de justiça e bombeiros sapadores. Para 2025, serão as de técnico superior de saúde, medicina legal e de reinserção social/reeducação a serem revistas. E, em 2026, avança a atualização das carreiras inspeção.
De recordar que, em julho, a secretária de Estado já tinha assumido que iria rever as carreiras não revistas como as de técnicos profissionais de reinserção social, polícias municipais, técnicos superiores de saúde, administradores hospitalares e de inspetores externos. Mas, entretanto, as negociações ficaram paradas.
O acordo plurianual assinado entre o anterior Governo de António Costa e as federações sindicais afetas à UGT (Fesap e STE) – a Frente Comum, da CGTP, ficou de fora – previa que a revisão dessas carreiras deveria ocorrer durante este ano para produzir efeitos em 2025. No entanto, só as carreiras de oficiais de justiça e de bombeiros sapadores devem avançar já. As restantes serão a partir do próximo ano, tal como indicou a secretária de Estado à Frente Sindical.
Face a este atraso na revisão de algumas carreiras, cujo processo já deveria ter avançado, o líder da Fesap, José Abraão, exige maior celeridade por parte do Governo: “Não aceitamos que um conjunto de carreiras que, até agora, eram prioridade, cujas revisões já deviam ter sido feitas, como a dos técnicos superiores de saúde e como os técnicos da reinserção social, não aceitamos que se empurre para a frente, para 2025 e 2026, sem um calendário definido”.
No final do encontro, o Ministério das Finanças emitiu um comunicado, dando conta que “as propostas iniciais”, apresentadas pelo Governo, “centram-se nas carreiras não revistas que o Governo considera prioritárias para revisão ao longo da legislatura, bem como na Base Remuneratória da Administração Pública para 2025”, mas sem indicar valores concretos para os aumentos apresentados na reunião.
A tutela referiu ainda que “o Governo tem uma visão estratégica para uma Administração Pública competitiva, tendo já sido adotadas medidas com alcance estrutural e estratégico”. “Pretende-se ter uma Administração Pública motivada, competente e eficaz, com serviços públicos de excelência. Para tal, estão a ser criadas condições de atratividade com o objetivo de atrair e reter talento, defendeu.
As próximas reuniões entre as federações sindicais representativas dos trabalhadores da Administração Pública e a secretária de Estado, Marisa Garrido, estão marcadas para dias 16, 21 e 29 de outubro.
(Notícia atualizada pela última vez às 19h46)
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