Custo mais elevado da água dessalinizada deve ser suportado por todos, defende ERSAR

A ERSAR defende que os custos da água dessalinizada não devem recair apenas pelos consumidores urbanos. Vera Eiró encerrou o Green Economy Forum promovido pelo ECO em parceria com a Águas de Gaia.

A presidente da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR), Vera Eiró, alerta que os custos da água dessalinizada, na visão do regulador, devem ser repartidos por todos os utilizadores, e não apenas aqueles que estão inseridos no abastecimento urbano, como é o caso dos consumidores domésticos e do setor do turismo. Isto, tendo em conta que os custos operacionais da água dessalinizada podem ser o dobro daqueles que se verificam para a água captada superficialmente. “Estamos num momento absolutamente transformador: vamos começar a produzir água a partir da dessalinização“, afirmou Vera Eiró, no âmbito da 4.ª conferência anual do Capital Verde, o Green Economy Forum, que decorreu esta terça-feira, em Gaia.

Mas a transformação tem um preço. A água proveniente de águas superficiais tem um OPEX (custos operacionais) de 22 cêntimos por metro cúbico, que compara com a água gerada na dessalinizadora, e que deverá ter um OPEX na ordem dos 44 cêntimos por metro cúbico, adianta a presidente.

Neste contexto, “vai ser necessário garantir quem é que paga os custos de quê”, avisa. Na ótica do regulador, “é necessário garantir a repartição dos custos da dessalinização por todos os utilizadores de água, e não só pelos utilizadores do sistema de água para fins de abastecimento urbano”.

Isto porque a dessalinizadora prevista para o Algarve vai permitir libertar água superficial da barragem de Odeleite, que é uma barragem multiusos, usada também para a agricultura. “Se estamos a produzir água que é mais cara, para garantir que há libertação de água, que por sua vez é mais barata, para outros usos que não o abastecimento urbano — sendo que o abastecimento humano é o prioritário — nós temos que garantir que há aqui uma equação financeira que garante que todas as entidades suportem este mecanismo de resiliência [a dessalinizadora]”, defendeu a presidente.

Questionada sobre o impacto que a entrada da água dessalinizada no sistema terá nas faturas da água, Vera Eiró indica que os cálculos não estão fechados. Isto porque faltam dados: ainda não é “evidente” quais serão as fontes de financiamento do CAPEX (investimento), já que os fundos do Plano de Recuperação e Resiliência não cobrem toda a verba necessária.

De acordo com a notícia avançada pela agência Lusa no início de outubro, a construção da dessalinizadora projetada para o Algarve, que deverá estar pronta até 2027, já foi adjudicada. O Agrupamento Complementar de Empresas — ACE foi o vencedor do concurso público, e é constituído pelas empresas portuguesas Luságua — Serviços Ambientais, Aquapor e a espanhola GS Inima Environment. A infraestrutura terá a capacidade inicial de 16 milhões de metros cúbicos (m3), mas a Águas do Algarve perspetiva que a mesma cresça em capacidade para tratar até três vezes mais do que esse volume, ou seja, até aos 24 milhões m3 de água.

“Não podemos continuar a aceitar perdas de 50 ou 60% de água”

O presidente da Águas de Gaia, Miguel Lemos, sublinhou que “a água não é de borla“, e que “os municípios com perdas de água elevadíssimas são os mesmos que às vezes não cobram nada” por este recurso. Neste sentido, defendeu, “não podemos continuar a aceitar perdas de 50 ou 60% de água”.

Ambos os oradores do painel procuraram dar uma noção da dimensão das perdas de água. “As perdas de água [atuais] dariam para matar a sede a 2.000 milhões de pessoas no mundo“, nomeadamente àquelas que ainda não têm acesso a água potável, lembrou Miguel Lemos. Um desígnio especialmente relevante já que em 2050 prevê-se aumento de 20% da procura de água, ao mesmo tempo que a seca é um fenómeno muito presente, enquadrou.

"As perdas de água [atuais] dariam para matar a sede a 2.000 milhões de pessoas no mundo.”

Miguel Lemos

Presidente das Águas de Gaia

Vera Eiró estimou ainda que as perdas na rede de água em Portugal são equivalentes a oito piscinas olímpicas por dia, ou seja, duas vezes o consumo de água no Algarve, a região mais afetada pela seca em Portugal e onde o consumo tem vindo a crescer. “Temos que garantir que esta água não é distribuída numa rede com buracos. É um tema financeiro e de eficiência energética”, rematou.

Miguel Lemos, presidente das Águas de Gaia

De acordo com o Relatório Anual dos Serviços de Águas e Resíduos em Portugal (RASARP) mais recentes, publicado no passado mês de fevereiro pelo regulador, o custo económico correspondente aos 184 mil milhões de litros de água perdida em 2022 ascendeu a 83 milhões de euros, depois de em 2021 ter chegado aos 89 milhões.

Para contrariar esta tendência, contratos com base no desempenho, “em que o objetivo máximo seja diminuir as perdas reais”, “ajudam muito”, considera Vera Eiró. “Mas é preciso que entidades públicas saibam contratar”, conclui.

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