O que ganha a atual bastonária dos advogados com a marcação de eleições antecipadas?

O cargo de bastonária é remunerado – desde que exercido em exclusividade – como acontece atualmente, com o salário bruto de 7119,50 euros, equiparado ao de Procurador-Geral da República (PGR).

Quando nada o fazia prever, a atual bastonária da Ordem dos Advogados (OA) marcou eleições antecipadas para março de 2025. Em causa a entrada em vigor do novo Estatuto da OA – em abril deste ano – e que obriga ou a criação de dois novos órgãos na estrutura da Ordem dos Advogados ou a convocação de eleições antecipadas.

À data, Fernanda de Almeida Pinheiro decidiu dar posse ao dito Conselho de Supervisão. Mas, dois meses depois dessa tomada de posse, em novembro, a líder dos advogados volta atrás e decide convocar eleições antes do previsto, alterando toda uma tradição relativamente aos atos eleitorais, previsivelmente marcados em novembro e com tomada de posse em janeiro seguinte.

Com esta manobra política, Fernanda de Almeida Pinheiro, caso seja reeleita, ganha assim a possibilidade de cumprir mais seis anos de (dois) mandatos à frente da OA, o máximo de mandatos permitidos por lei para o cargo. E o tempo que até agora foi cumprido (quase dois anos) será ‘apagado’ da contabilização. Isto porque a deliberação da Comissão Eleitoral para o ato eleitoral já marcado para março, define que “nos termos do nº 6 do artigo 5º da Lei nº 6/2024, de 19 de janeiro (EOA), o mandato em curso, interrompido por antecipação do calendário eleitoral, não é contabilizado para efeitos de limitação de mandato”. Num cenário em que a líder dos advogados ganhe de novo estas eleições e as próximas, ficará mais de sete anos a ocupar este cargo, algo inédito na história da instituição centenária.

Um cargo que é remunerado – desde que exercido em exclusividade – como acontece atualmente, com o salário bruto de 7119,50 euros, equiparado ao de Procurador-Geral da República (PGR).

Tomada de posse da nova bastonária da Ordem dos Advogados, Fernanda de Almeida Pinheiro - 09JAN23
Tomada de posse da nova bastonária da Ordem dos Advogados, Fernanda de Almeida Pinheiro, em janeiro de 2023.Hugo Amaral/ECO

Ao ECO/Advocatus, a líder dos advogados já fez saber que “a convocação de eleições não é ilegal e muito menos inconstitucional”.
Mas, apesar desta tomada de posição da bastonária, o Conselho Superior da mesma OA, liderado pelo advogado penalista Paulo de Sá e Cunha, está a avaliar a legalidade desta convocação de eleições antecipadas. Este é o órgão jurisdicional supremo da Ordem dos Advogados que tem ainda competência para julgar os recursos das decisões dos Conselhos de Deontologia em matéria disciplinar e para dar parecer sobre os honorários a pedido dos tribunais, dos advogados ou dos seus clientes.

Num artigo de opinião, publicado no jornal Público, o reconhecido constitucionalista, ex- presidente do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, Bacelar Gouveia, defendeu que a bastonária anunciou “antes das férias de Natal eleições para os órgãos nacionais que apanharam todos os seus possíveis e legítimos adversários desprevenidos; menos ela própria, claro”.

Indo mais além, o jurista considerou que “esta decisão consubstanciou uma aplicação inconstitucional e inadmissível de uma oportunidade legislativa que, sendo acionada, põe em crise princípios do Estado Constitucional, como o democrático e o da tutela da confiança”.

Em primeiro lugar, diz Bacelar Gouveia, “a cessação antecipada dos mandatos iniciados em janeiro de 2023 é uma violação da capacidade eleitoral para cargo público, protegida pelo art. 50.º da Constituição: o seu titular, eleito para três anos, de repente, por uma lei ordinária o permitir, é lançado “borda fora”, para se ajustar mandatos que nasceram depois. Em segundo lugar, a cessação antecipada dos mandatos é a aceitação acrítica de uma norma inconstitucional, porque retrospetiva, ao reduzir em cerca de 1/3 o tempo de vigência de cargos eletivos, hipótese que prejudica a duração de cargos que se iniciaram no passado. Em terceiro lugar, a cessação antecipada dos mandatos, perante as duas normas oferecidas pelo legislador, é um resultado sem dúvida inconstitucional na medida em que tal deve ser feito com medida menos gravosa possível, que é a de o novo órgão e membros não cumprirem os três anos, e não a de, à socapa, decepar os mandatos daqueles que antes foram eleitos sem que tal perspetiva restritiva estivesse no horizonte”.

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

O que ganha a atual bastonária dos advogados com a marcação de eleições antecipadas?

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião