Volatilidade e escrutínio ditam rotatividade recorde de CEO
Os especialistas em governança consultados pelo ECO/Capital Verde veem vantagens nesta rotatividade, e apontam os planos de sucessão como uma resposta adequada.
No total, 202 CEO, que lideravam empresas cotadas nos 13 índices bolsistas que são acompanhados pela recrutadora de executivos Russell Reynolds, abandonaram o cargo em 2024. Os autores de um novo estudo realçam que esse número está “significativamente acima” da média dos últimos seis anos (de 186), sendo que a tendência que está em crescendo desde 2018.
“Este aumento na rotatividade é em grande parte impulsionado pela volatilidade no mercado e pelo crescente escrutínio dos CEO ao dia de hoje”, indica a recrutadora.
Na opinião do presidente do Instituto Superior de Corporate Governance (IPCG), João Moreira Rato, “a volatilidade de mercado pode significar que se deitam fora alguns CEO talentosos, mas é um preço que vale a pena pagar por mais escrutínio”.
Para o líder do IPCG, esse “é um bom sinal em termos de governance [governança]”. Diz também que o vê como algo vantajoso no caso de significar que as partes interessadas possuem uma voz cada vez mais audível.
A volatilidade de mercado pode significar que se deitam fora alguns CEO talentosos, mas é um preço que vale a pena pagar por mais escrutínio.
“A perpetuação de um CEO pode dar a imagem de uma situação de estabilidade. Mas tem um outro lado: pelo número de anos que está na casa, pode passar a ter uma autoconfiança excessiva” e assim deixar de seguir as melhores práticas em termos de governança e liderança, alerta, por sua vez, Duarte Pitta Ferraz, sócio da Ivens Governance Advisors.
Ou, simplesmente, o CEO pode não manter o mesmo dinamismo em função da elevada exigência da função, indica. Até porque a regulação é cada vez mais apertada, em particular no setor bancário. Nesse sentido, entende que a rotatividade será positiva.
Em oposição, “uma instituição que esteja sempre a mudar de CEO dá uma imagem de instabilidade”, sublinha Duarte Pitta Ferraz. De acordo com o estudo, a mudança de CEO acontece, em média, a cada 7,4 anos.
Uma instituição que esteja sempre a mudar de CEO dá uma imagem de instabilidade.
Duarte Júlio Pitta Ferraz, também sócio da Ivens Governance Advisors, salienta que hoje “é desproporcionado o peso das consequências nos CEO”, face ao resto da equipa, sendo que “a glória e tragédia estão centradas” nessa figura. “Se as coisas correm bem, atribui-se ao CEO. Se correm mal, também. O que não será verdade, sobretudo, em organizações altamente complexas”, conclui, ao mesmo tempo que observa uma exigência muito grande no que diz respeito aos resultados, mais do que quanto à forma de atuação.
Na visão do especialista, “o mundo está cada vez mais instável e volátil, com políticas relevantes que mudam de um mês para o outro, ou de um dia para o outro”, enquanto existe cada vez mais concorrência a nível da inovação e por parte dos mercados emergentes. “Isso leva a que seja cada vez mais difícil manter um negócio que vai melhorando incrementalmente”, entende.
Ainda assim, concede, não é só por maus desempenhos que os CEO mudam. Pode haver alterações em função do desejo da organização de mudar de rumo estratégico ou de desalinhamento com o restante conselho de administração.
No setor tecnológico em particular, de acordo com o estudo, o salto na rotatividade de CEO foi de 90% em 2024, o que a Russell Reynolds explica com o investimento em Inteligência Artificial, infraestrutura digital e software. João Moreira Rato considera “compreensível” esta tendência, já que a elevada “disrupção” que se vive neste setor exige uma “maior necessidade de adaptabilidade por parte dos CEO”.
“A glória e tragédia estão centradas na figura do CEO. Se as coisas correm bem, atribui-se ao CEO. Se correm mal, também. O que não será verdade sobretudo em organizações altamente complexas”
Independentemente dos motivos que levem à saída, Duarte Júlio Pitta Ferraz aponta que pode existir “um excessivo otimismo” quanto ao transtorno que decorre da mudança de CEO, relevando que estes têm uma influência muito importante na visão e estratégia que guiam a empresa.
Planos de sucessão com papel relevante
A Russel Reynolds destaca ainda que, em 2024, se regista uma percentagem alta, de 85%, de CEO que foram nomeados pela primeira vez para este cargo numa empresa cotada.
Por outro lado, a escolha de candidatos internos para subirem a CEO também atingiu, no ano passado, um recorde, “em linha com a tendência de existir um planeamento de sucessão mais a longo prazo”, lê-se na apresentação do estudo. É desejável que o momento de substituição de um CEO seja pré-estabelecido, considera Duarte Pitta Ferraz.
“Parece-me natural que os substitutos venham de dentro, de forma a assegurar prontidão e celeridade na execução da estratégia. Não há tempo para trazer gente de fora, que tem de ter tempo para conhecer a organização”, avalia Moreira Rato. “Um bom plano de sucessão, claro e pragmático, é particularmente importante em indústrias em rápida evolução”, remata.
Um bom plano de sucessão, claro e pragmático, é particularmente importante em indústrias em rápida evolução.
Uma vantagem de adotar uma solução interna, realça Duarte Pitta Ferraz, é o facto de reforçar a confiança do talento interno, no que diz respeito à capacidade de ascensão na empresa. Outra é uma menor probabilidade de disrupção.
Um candidato externo deverá trazer novos pontos de vista e levar a uma maior renovação. “Diria que a escolha de um perfil ou de outro depende muito do momento em que estivermos na empresa”, entende.
O também sócio da Ivens Governance Advisors, Duarte Júlio Pitta Ferraz, sublinha a importância de que, na passagem da ‘pasta’ da liderança, ambos os CEO, o que está de saída e o futuro, estejam durante um período de tempo ambos na empresa, assegurando uma transição mais suave. Um trabalho que não é possível no caso da demissão de um CEO, em vez de uma sucessão planeada.
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