Teletrabalho é mais frequente entre quem tem melhores salários
Edição deste ano do estudo "Portugal, Balanço Social" mostra que o trabalho remoto é mais prevalecente entre pessoas com salários mais altos, com ensino superior e entre os mais jovens (25 a 34 anos).
O teletrabalho é mais frequente entre os trabalhadores que recebem os salários mais elevados do mercado de trabalho. Esta é uma das conclusões da edição deste ano do estudo “Portugal, Balanço Social“, que revela também que o trabalho remoto é dez vezes mais comum entre os trabalhadores com ensino superior do que entre os que têm no máximo o ensino básico.
“Qual é a prevalência de teletrabalho entre os diferentes grupos sociodemográficos? O trabalho remoto é mais prevalecente entre as pessoas que trabalham mais de 35 horas por semana, entre os residentes sem nacionalidade portuguesa e de origem noutros países da Europa, nas pessoas com maior salário por hora, com ensino superior e entre os jovens com idades entre 25 e 34 anos“, salienta o trabalho da autoria de Bruno P. Carvalho, João Fanha, Miguel Fonseca e Susana Peralta.
Em contraste, o teletrabalho é menos frequente em Portugal entre os trabalhadores com origem em países fora da Europa, entre os trabalhadores com até o ensino básico e entre os trabalhadores com os salários por hora mais baixos do mercado de trabalho nacional (ver gráfico acima).
Os investigadores destacam ainda que são esses trabalhadores com origem fora da Europa, com os salários mais baixos e com habilitações menos avançadas (os que têm apenas o ensino secundário), aqueles que têm uma maior concentração de trabalho temporário.
Quanto às faixas etárias, o “Portugal, Balanço Social” aponta que metade dos jovens dos 18 aos 24 anos têm contratos temporários, concentração que vai diminuindo à medida que a idade dos trabalhadores vai avançando (entre os 55 e 65 anos, a percentagem de contratos temporário é de 5,4%).
Risco de pobreza é o dobro entre quem tem contrato temporário
Como é tradição, o “Portugal, Balanço Social” avalia também o risco de pobreza ou exclusão social em Portugal e, nesta edição, refere que, não obstante a trajetória positiva dos últimos anos, um quinto da população continua nessa situação. Em causa estão mais de dois milhões de pessoas.
“São consideradas em risco de pobreza as pessoas com rendimento disponível até 7.588 euros anuais, ou 632 euros por mês”, precisam os investigadores, que assinalam que esse risco “não atinge da mesma forma todos os grupos da população“.
“Este risco é mais elevado entre os estrangeiros (25% em 2023), entre as pessoas com menor escolaridade (23,5% para pessoas com escolaridade completa até ao ensino básico em 2024), entre as pessoas idosas (21,1% em 2024) e entre as pessoas residentes em regiões rurais (21,7% em 2023)”, afirmam os autores do “Portugal, Balanço Social”.
Já na apresentação do estudo, Bruno Carvalho, um dos autores, assinalou esta quarta-feira que em 2023 havia 346 mil crianças em risco de pobreza e 427 mil pessoas com, pelo menos, 65 anos nessa situação, sendo que, enquanto entre as primeiras houve uma redução da taxa em 2024, entre as pessoas mais idosas a tendência foi a inversa.
A taxa de pobreza das pessoas com contrato temporário (18,2%) é mais do dobro da que atinge as pessoas com contratos de trabalho permanentes.
Por outro lado, João Fanha, outro dos autores, sublinhou que a taxa de risco de pobreza seria 2,6 vezes maior na ausência total do Estado social, sendo que, neste momento, 2,7 milhões de pessoas recebem pensões de velhice (o valor médio é de 857,96 euros), 1,2 milhões recebem abono de família (o valor médio é de 91,12 euros) e 225 mil recebem o rendimento social de inserção (o valor médio é de 152,06 euros).
E desenganem-se aqueles que acreditam que só quem não tem trabalho é que está em risco de pobreza. Os desempregados estão mais frequentemente em condição de pobreza, mas a 9,2% das pessoas com emprego também estão nessa situação, fatia que se agrava com os contratos de trabalho menos estáveis.
Em concreto, os investigadores concluem que “a taxa de pobreza das pessoas com contrato temporário (18,2%) é mais do dobro da que atinge as pessoas com contratos de trabalho permanentes. E, em comparação com 2008, a diferença entre estes dois grupos tem-se acentuado, lê-se no “Portugal, Balanço Social”.
Além disso, “é nos trabalhadores do setor turístico (alojamento, restauração e similares), bem como nos do setor primário (agricultura, produção animal, caça, floresta e pesca), que a situação de pobreza é mais comum (22,8% e 22,3%, respetivamente)”, identifica o relatório.
“Enquanto no setor primário houve uma diminuição de mais de dez pontos percentuais desde 2008, no setor do turismo o risco de pobreza tem vindo a aumentar“, observam ainda os investigadores. Os mesmos acrescentam também que “a probabilidade de ser pobre é também elevada nos trabalhadores da construção (20,9%, em 2023)”.
Para muitas destas pessoas, não há salários. Há remunerações de biscates. O debate do salário mínimo tem muito interesse, mas do ponto de vista da pobreza tem efeitos muito limitado.
Na apresentação desta quarta-feira, a professora Susana Peralta, também autora deste estudo, salientou que “o mercado de trabalho não só paga menos aos mais pobres, como lhes dá menor estabilidade“.
“Não há um mercado de trabalho, há, pelo menos, dois”, disse ainda. “Para muitas destas pessoas, não há salários. Há remunerações de biscates. O debate do salário mínimo tem muito interesse, mas do ponto de vista da pobreza tem efeitos muito limitado“, atirou a professora.
Ainda assim, desigualdade nos rendimentos diminuiu
De acordo com o “Portugal, Balanço Social”, 25% dos mais pobres detêm 10,2% do rendimento total do país, enquanto os 25% mais ricos detêm 48%.
“Quando comparados com 2008, estes valores mostram uma redução ligeira da desigualdade: a proporção de rendimento detida pelos 25% mais ricos diminuiu e a proporção de rendimento detida pelos 25% mais pobres aumentou”, notam os investigadores (ver gráfico abaixo).
Segundo o estudo divulgado esta quarta-feira, em média, um indivíduo entre os 25% mais pobres tem um rendimento de 594,8 euros por mês, enquanto a média de rendimento de um indivíduo que pertence ao quartil de os mais ricos é de 1.853,2 euros por mês.
O estudo enfatiza que, de modo geral, quanto maior o nível de rendimento, maior a prevalência do ensino superior completo e a menor prevalência de intensidade laboral reduzida.
“Dos 25% mais pobres, apenas cerca de 10% têm ensino superior completo e cerca de 18% fazem parte de agregados com intensidade laboral muito baixa”, sublinham os autores, o que confirma que o nível de educação e a relação com o mercado de trabalho são “determinantes importantes da situação de pobreza”.
“Algum progresso modesto”
O encerramento da sessão de apresentação do “Portugal, Balanço Social 2025” esteve a cargo de Sandra Araújo, da Estratégia Nacional de Combate à Pobreza, que saudou esta análise estatística e sublinhou que os indicadores “revelam algum progresso modesto”. “Ainda que não consigamos fazer para já uma ligação com as diferenças medidas de política, como o aumento do salário mínimo e das pensões, podemos já presumir que possa ter existe algum contributo“, declarou a responsável.
Ainda assim, Sandra Araújo admitiu que o ritmo de redução da pobreza “é insuficiente”, sendo preciso, instou, “reforçar as políticas públicas“.
“A pobreza em Portugal é um fenómeno resistente, persistente e o seu combate exige políticas públicas sólidas, estruturais e muitas vezes prolongadas no tempo. Exige também o combate à indiferença pública, a mobilização de toda a sociedade”, enfatizou a responsável.
(Notícia atualizada às 12h54)
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