BRANDS' ECO “Não existe proteção do ambiente sem a agricultura”
Presidente da CAP lembrou importância de “alinhar estratégias”, num encontro de especialistas sobre sustentabilidade. Biocombustíveis, biometano, biofertilizantes e regulação foram temas em destaque.
Ao fim de 50 anos de trabalho na defesa da agricultura, a CAP – Confederação de Agricultores de Portugal não perde o foco no futuro e na inovação. Foi exatamente isso que esteve em debate no seminário “Biosoluções no setor agroflorestal”, organizado pela CAP na Feira Nacional de Agricultura, que decorre em Santarém até 15 de junho. Ali, perante empresários e agricultores, discutiram-se alternativas sustentáveis para a produção de energia, a fertilização dos solos e a proteção das culturas, com a presença de especialistas nacionais e internacionais.
Na sessão de abertura, Álvaro Mendonça e Moura, presidente da CAP, assinalou que “esta é a feira do nosso 50º aniversário” e que “não existe proteção do ambiente sem a agricultura e as florestas”. Da mesma forma, lembrou, “não existe agricultura e florestas sem proteção do ambiente”, e para isso é preciso “alinhar estratégias” no setor.
Energia limpa a partir de resíduos
No primeiro painel “Biosoluções em Energia”, Nuno Soares, responsável de combustíveis renováveis da Repsol Portugal, alertou para a urgência da descarbonização e para a importância da inovação neste caminho. Entre as inovações apresentadas, destaque para um novo combustível, o AgroDiesel HVO 100 Nexa, produzido com base em resíduos agrícolas, florestais, urbanos e animais. “Garantimos que o produto que estamos a oferecer tem uma redução de emissões de 75% a 92%”, afirmou.

Quem também quer ajudar a descarbonizar a economia é a Floene Energias, que olha para o biometano como uma alternativa viável ao gás natural, além de uma forma de criar rendimento adicional para os agricultores. “A produção de biometano passa pela decomposição da matéria orgânica, e esses resíduos são essencialmente agrícolas”, explicou Nuno Nascimento, lembrando ainda que “os vossos resíduos podem transformar-se em energia”.
O responsável da Floene assinalou ainda uma das maiores vantagens do biometano: não implica investimento em nova infraestrutura. “Temos uma infraestrutura capaz de receber estes gases [renováveis] e, portanto, descarbonizar o setor”, detalhou. Desta forma, será possível reduzir as emissões de setores importantes, como o da indústria, sem qualquer alteração à rede ou aos equipamentos.
“O biometano pode substituir o gás natural que hoje existe sem nenhuma necessidade de investimento adicional”, concordou Nuno Pinto, da REGA Energy. Apresentou ainda um projeto da empresa em Sousel, que pretende valorizar 250 mil toneladas de efluentes agropecuários, reduzindo até 80% do consumo de gás natural do distrito de Portalegre.
A experiência internacional chegou com Mariana Moreira, da Câmara de Agricultura da Bretanha, que partilhou o modelo de França, onde surgem novas unidades de biometano todas as semanas. “Em janeiro de 2025 tínhamos 272 unidades de biogás em produção na região”, com impacto direto no consumo energético regional e no uso de fertilizantes orgânicos. “O processo de digestão é uma oportunidade para aumentar a competitividade do setor agrário”, afirmou, em referência ao subproduto que resulta deste processo: o digestivo, um fertilizante orgânico que pode ser devolvido ao solo agrícola.
Em Portugal, referem os responsáveis das três empresas de energia, já foi dada importância política ao tema através do Plano de Ação para o Biometano, mas, ainda assim, o país “deve dar corda aos sapatos”, sugeriu Nuno Soares. É necessária a criação de “uma via rápida” para o licenciamento, que não deve ser confundida com “uma simplificação” dos requisitos, assinalou Nuno Pinto.
Biofertilizantes e biopesticidas em testes
O segundo painel centrou-se nas biosoluções para fertilizantes e proteção de culturas, que contou com a participação de Sandra Correia, da InovPlantProtect/InsectERA, Cristina Pedraz, da Corteva, e José Rafael, da The Navigator Company. Os três apresentaram projetos que transformam resíduos em fertilizantes, uns à base de resíduos da produção de insetos e outros com o que eram antes desperdícios da floresta.
“Temos uma solução para controlo natural da mosca do olival. Conseguimos cobrir 18 mil hectares com seis armadilhas apenas”, partilhou Cristina Pedraz, que apresentou alternativas aos pesticidas convencionais.
Já José Rafael falou sobre o projeto Bioma do Solo, que está a testar biofertilizantes na floresta. “Conseguimos uma redução de 20% a 25% na utilização de azoto, o que é bastante aceitável”, considerou. Um dos grandes objetivos é valorizar os resíduos da própria indústria, “poder valorizá-los e disponibilizá-los em boas condições técnicas para que os produtores possam melhorar os solos”.
Regulação sim, mas menos burocrática
O terceiro painel foi dedicado ao quadro regulatório e contou com Pedro Borges, da Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural (DGADR), Ana Bárbara Oliveira, da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) e moderação de Ramiro Matos, da José Pedro Aguiar-Branco Advogados. Pedro Borges lembrou que “o biogás e o biometano são considerados valorização orgânica”, são “neutros em carbono” e que a agricultura e pecuária são setores estratégicos no Plano de Ação para o Biometano.
Ana Bárbara Oliveira lembrou a estratégia europeia “Do Prado ao Prato” e a meta de reduzir os químicos na agricultura. “Portugal já tem em território nacional dois terços dos biopesticidas aprovados na Europa”, afirmou. A especialista defendeu ainda o equilíbrio entre o agilizar dos procedimentos e o rigor necessário. “Podemos aligeirar, desburocratizar, mas não podemos perder a necessária avaliação técnica”, sublinhou.
Na sessão de encerramento, Armando Oliveira, administrador da Repsol Portugal, defendeu que “este abraço entre a agricultura e a energia é o caminho” e voltou a lembrar a importância do setor agrícola na descarbonização. “Tudo o que sejam resíduos agrícolas vai servir de matéria-prima para a produção do combustível”, apontou.
Luís Mira, secretário-geral da CAP, fez um balanço otimista, mas exigente “O setor agroflorestal está pronto para responder aos desafios com soluções concretas, escaláveis e nacionais”, garantiu Luís Mira. O secretário-geral da CAP defendeu menos burocracia e mais incentivos. “É preciso remover barreiras regulatórias e criar quadros de incentivos”, assim como “previsibilidade, orientação técnica e políticas públicas” que facilitem a implementação de biosoluções na agricultura. “A CAP estará sempre do lado daqueles que querem avançar”, rematou.
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