Pensões, IVA zero e portagens. Governo arrisca coligações negativas de Chega e PS no OE2026
Aumento extraordinário das reformas, isenção de IVA num cabaz de alimentos essenciais e eliminação de portagens são algumas das propostas em comum entre Chega e PS contra a vontade do Executivo.
A margem do Orçamento do Estado para 2026 (OE2026) é curta. São apenas 260 milhões de euros, ou seja, o correspondente a 0,1% do PIB, o equivalente ao excedente orçamental, como já referiu o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento. Mas os partidos desdobraram-se em propostas de alteração com peso significativo do lado da despesa e algumas poderão ver a luz por via de coligações negativas entre Chega e PS contra a vontade do Governo.
Aumento extraordinário e permanente das pensões, IVA zero para um cabaz de bens alimentares essenciais ou o fim das portagens nalgumas autoestradas poderão passar à revelia de PSD e CDS, os partidos que suportam o Executivo da Aliança Democrática (AD), uma vez que não têm maioria absoluta no Parlamento. E, neste caso, há o risco de serem aprovadas medidas que comprometem o equilíbrio das contas públicas, ainda que os socialistas tenham condicionado as suas propostas à manutenção de um saldo orçamental positivo ou pelo menos neutro. Isto é, sem défice.
A iniciativa socialista de aumento permanente das pensões faz depender a sua atribuição da decisão do Governo aplicar ou não um bónus entre 100 e 200 euros, o mesmo que pagou este ano e em 2024.
Se o Executivo considerar que tem folga para acomodar um novo suplemento, então o PS quer que esse valor não só seja transferido para as contas bancárias dos reformados no mês do seu pagamento como também conte para a formação da pensão a atribuir em 2026, convertendo assim o bónus numa subida estrutural destas prestações.
Caso, ainda assim, as contas possam entrar no vermelho, o partido de José Luís Carneiro defende a reversão da descida de um ponto percentual do IRC, de 20% para 19%, para financiar o aumento extraordinário das reformas.
É uma proposta cheia de condicionantes que, ainda assim, pode passar com o apoio do Chega, uma vez que o partido de André Ventura também é apologista da subida estrutural das pensões.
A proposta do partido de direita radical é, no entanto, mais ambiciosa e estabelece logo uma atualização adicional das pensões em 1,5% para prestações até 1.567,50 euros, o correspondente a três vezes o valor do Indexante dos Apoios Sociais (IAS). E o Chega não é o único partido a apregoar um aumento dos pensionistas. Também o PCP defende um aumento das prestações em 5% não podendo o montante da atualização ser inferior a 75 euros por reformado.
A pressão é grande, mas a AD não desistiu da batalha e apresentou uma proposta na qual recomenda ao Governo a atribuição de um suplemento aos pensionistas, dependendo da execução orçamental e sem colocar em causa a sustentabilidade da Segurança Social e o futuro das pensões das novas gerações.
O IVA zero num cabaz de bens alimentares essenciais é outra das medidas que poderá ter o acordo de Chega e PS. O partido de André Ventura é taxativo na proposta e apresenta uma norma transitória que permite aplicar a isenção do imposto durante o ano de 2026 a um conjunto de alimentos como pão, leite, frutas, legumes, arroz, massas, azeite, carne, peixe e ovos.
Já os socialistas fazem depender a medida da receita que o Estado encaixar com o fim do desconto no Imposto sobre os Produtos Petrolíferos (ISP).
“A aplicação da receita fiscal proveniente da eliminação total ou parcial do desconto atualmente em vigor nas taxas unitárias do Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e Energéticos (ISP) é objeto de decisão da Assembleia da República, prioritariamente para efeitos de uma redução da taxa do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) incidente sobre um conjunto de bens alimentares essenciais”, de acordo com a proposta do PS.
Há outras alterações em sede de IVA que deverão merecer um consenso mais alargado entre Chega e PS, ainda que com impacto menos significativo na arrecadação de receita fiscal. Os dois partidos defendem a redução da taxa normal, de 23%, para a taxa mínima, de 6%, do IVA dos frutos secos cortados ou laminados como avelãs ou amêndoas.
Em relação às portagens, ambos os partidos têm medidas para a eliminação de pórticos em vários troços de autoestradas, sendo que o Chega defende mesmo a eliminação gradual de todas as portagens. Por isso, independentemente das propostas socialistas, o partido de André Ventura será sempre favorável à abolição das taxas seja para residentes ou de forma transversal.
O PS é mais comedido e defende, por exemplo, isenções para residentes nas portagens do Alentejo A2 e A6 ou a eliminação da totalidade dos pórticos da autoestrada A25. Os socialistas também entregaram uma proposta para isentar de portagens os veículos pesados que atravessem a circular sul de Leiria (IC36) e a variante da Batalha (A19). Ainda que sob protesto das bancadas de PSD e CDS, estas medidas poderão passar com o apoio do Chega.
Noutra frente, Chega e PS insistem no alívio das comissões por amortização no crédito à habitação. Tal como no ano passado, os dois partidos entregaram propostas que, embora com alcances diferentes, coincidem no objetivo de aliviar as comissões exigidas às famílias nestes casos.
Os bancos podem cobrar até 0,5% do valor da amortização antecipada, parcial ou total, do crédito à habitação quando há taxa de juro variável. Essa comissão sobe até um máximo de 2% no caso dos créditos com juro fixo (ou no período contratado com taxas mistas, no período do juro fixo).
Até 31 de dezembro, os bancos estão proibidos de cobrar estas comissões nos contratos de crédito à habitação que se encontrem, à data do reembolso, num período de taxa de juro variável. A isenção foi adotada em 2022 pelo anterior Governo do PS para mitigar o impacto do aumento das taxas de juro nos contratos de crédito à habitação e previa-se que vigorasse até 31 de dezembro de 2024. No entanto, no ano passado, a isenção foi prorrogada até 31 de dezembro de 2025.
Agora, e perante a “ausência de decisão do atual Governo e à proximidade do termo da vigência do regime em vigor, o PS propõe isentar de comissões, a título permanente, as operações de reembolso antecipado dos contratos de crédito à habitação em regime de taxa variável”.
Para os socialistas, a descida das taxas Euribor não justifica o fim da isenção. “As prestações continuam a representar um peso relevante nos orçamentos familiares e o recurso ao reembolso antecipado mantém-se como uma opção significativa para reduzir encargos”, defende.
Também o Chega, tal como no ano passado, apresentou uma proposta para aliviar os encargos das famílias que consigam pagar, antecipadamente, parte ou a totalidade do seu crédito à habitação. Os deputados da bancada do Chega propõem que exista uma comissão única, que designa de flat tax, de até 0,5% na amortização, independentemente da taxa de juro contratada com o banco, uma vez que a isenção em vigor desde 2022 aplica-se apenas aos créditos com taxas variáveis.
“Em 2026, o Governo implementa uma taxa única máxima de 0,5% sobre o valor amortizado para a comissão de amortização do crédito à habitação, aplicável tanto a contratos com taxa de juro variável como fixa”, lê-se na proposta do Chega, que contrapõe os “lucros históricos” da banca com o “cenário de juros elevados e prestações mensais insustentáveis” suportados pelas famílias.
Neste caso, o custo da medida é para a banca e não para os cofres do Estado. Resta saber se, em relação às outras propostas como o aumento extraordinário das pensões, o IVA zero num cabaz de bens alimentares essenciais e o fim de portagens, a folga de 260 milhões do OE é suficiente ou não para acomodar as reivindicações de Chega e PS.
O OE 2026 foi aprovado pelo Parlamento na generalidade com os votos favoráveis de PSD e CDS, a abstenção de PS, PAN e JPP e os votos contra de Chega, PCP, IL, Livre e BE. As votações na especialidade arrancam a 20 de novembro, culminando na votação final global do documento a 27 de novembro.
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