Efeito positivo da inflação nas contas públicas vai desaparecer “rapidamente”, avisa o CFP
Este efeito não será duradouro. "No médio prazo, a inflação irá necessariamente provocar uma pressão significativa na despesa pública", alerta o Conselho das Finanças Públicas.
O Conselho das Finanças Públicas (CFP) vem esta quarta-feira validar a ideia da oposição ao Governo de que o Estado está e vai beneficiar ainda mais da aceleração da inflação em Portugal, com a receita de impostos a aumentar. Contudo, os peritos em contas públicas alertam que esse efeito é visível no “muito curto prazo” e “rapidamente” se esgota.
“Sendo 2022 o primeiro ano de um processo inflacionista não totalmente antecipado, o saldo orçamental tende a melhorar no muito curto prazo por via de vários mecanismos que, contudo, rapidamente se esgotam“, lê-se no relatório da instituição que analisa a proposta do Orçamento do Estado para 2022 (OE2022). O CFP prevê que a taxa de inflação (IHPC) se situe nos 3,9% e o Governo nos 4%.
A instituição liderada por Nazaré Costa Cabral detalha os mecanismos através dos quais o Estado fica a ganhar, começando logo pela “não atualização dos escalões (não desdobrados) de IRS”, cuja decisão tem sido criticada pela oposição. Em sua defesa, o ministro das Finanças, Fernando Medina, tem argumentando que essa atualização teria um impacto mínimo e que o desdobramento (já previsto no OE2022 original) tem um impacto muito maior.
Além disso, há uma “reação automática” de aumento da receita de IVA — taxa fixa que incide sobre o preço dos bens e serviços — por causa da subida do preço dos bens e serviços consumidos pelos cidadãos. Acresce que em 2022 o aumento da função pública já estava “pré-determinado”, tendo como referência a inflação registada de 2021, e que a aquisição de bens e serviços por parte da administração pública “beneficia por algum tempo do preço de contratos fixados anteriormente”.
Porém, este efeito não será duradouro. “No médio prazo, a inflação irá necessariamente provocar uma pressão significativa na despesa pública“, alerta o Conselho das Finanças Públicas, elencando as vias pelas quais a despesa vai aumentar no futuro. O CFP começa pelo “custo das novas colocações de dívida pública subirá”, um fenómeno que já é visível e que se intensificará assim que o Banco Central Europeu (BCE) começar a subir as taxas de juro diretoras, tal como sinalizou Christine Lagarde na semana passada.
Do ponto de vista dos salários, a entidade admite que “as negociações salariais serão pressionadas pela perda de poder de compra em 2022” e lembra que no caso das pensões há uma fórmula de atualização “legal” e automática que tem em conta o IPC (Índice de Preços no Consumidor) e a evolução do PIB, duas variáveis que vão registar variações expressivas em 2022.
“Os novos contratos de aquisição de bens e serviços refletirão preços necessariamente mais elevados; os próprios concursos para investimentos suportados pelo PRR sofrerão o impacto, o que se pode traduzir num menor volume de investimento para os mesmos fundos“, acrescenta ainda o CFP. Nos últimos meses já têm sido noticiados alguns casos de investimentos cujos concursos ficam desertos ou empresas que reclamam uma atualização dos valores contratuais face à subida recente dos preços.
Se o OE2022 pode colher os “frutos” desta inflação, será o Orçamento para 2023 a colher os impactos potencialmente negativo. “Todos estes efeitos vão criar pressões sobre o próximo Orçamento do Estado para 2023“, avisa o CFP, assinalando que “a ausência do referido enquadramento plurianual dificultará ainda mais o seu processo de elaboração”. O Conselho refere-se à Lei das Grandes Opções, que inclui o quadro plurianual das despesas e receitas públicas que deveria definir os tetos máximos da despesa para os anos seguintes, à qual os Orçamentos de Estado deveriam submeter-se.
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