Não é só o azeite que sobe. Prepare as carteiras

O aumento dos preços das matérias-primas tende a ser uma má notícia para as famílias, mas pode ser uma oportunidade de investimento. Saiba porquê e como aproveitar essa realidade.

O azeite vai ficar mais caro. E a culpa é de quem? Do mercado. A produção nacional de azeitona caiu 30%, no ano passado, devido às condições climatéricas adversas que também penalizaram a oferta de países produtores como a Tunísia, Grécia e a Itália. Com menos matéria-prima disponível, o efeito imediato é o aumento dos preços que os produtores de azeite já estão a antecipar. O mesmo aconteceu recentemente também com as curgetes. Em fevereiro, no intervalo de poucos dias, o preço deste legume tão utilizado na culinária nacional quase triplicou. Tudo por “culpa” das baixas temperaturas que se abateram sobre alguns dos países onde existem as maiores plantações de curgetes da Europa, o que acabou por afetar a produção do legume.

Ou seja, trata-se da lei da procura e da oferta e o mercado a funcionar. A mesma lei e o mesmo mercado que acaba por reger os preços dos alimentos que chegam à mesa dos portugueses todos os dias por mais distante em termos espaciais esteja a sua produção. Por isso, se os Estados brasileiros da Bahia e do Espírito Santo, ou a Índia têm sofrido com a seca, ou a doença de citrus greening está a afetar as laranjeiras na Florida e no Brasil, o mais certo é que venha a pagar por isso. É que estas regiões dispõem de algumas das maiores produções mundiais de matérias-primas que ajudam a compor a mesa dos portugueses: o café, o açúcar e o sumo de laranja. Quando há constrangimentos no lado da oferta, quem procura não encontra e se encontra precisa de desembolsar mais por isso.

Evolução do índice de matérias-primas agrícolas

Fonte: Bloomberg

Mas se o que cai no prato ou no copo das famílias fica mais caro por esse tipo de constrangimentos, também é possível tirar partido dessa realidade como investidor. Ou seja, através do investimento em matérias-primas. Essa aposta pode ser feita de diversas formas: diretamente nas matérias-primas onde acredita existir maior potencial de ganhos, ou de forma indireta através de produtos financeiros como os fundos de investimento ou de títulos de empresas ou setores que beneficiam dessas tendências.

Matérias-primas em alta

Tendo em conta sobretudo constrangimentos impostos pela natureza, mas também da procura, existe um conjunto de matérias-primas que podem apresentar algum potencial de valorização. Com base em previsões de analistas e os recentes sinais de alerta relacionados com constrangimentos do lado da oferta, fique a conhecer algumas das matérias-primas agrícolas que poderão oferecer maior potencial de valorização nos próximos tempos.

  • Sem energia? Sim, é que não há café

O Brasil é o maior produtor do mundo de café, mas abriu a porta à importação da matéria-prima durante quatro meses. Pode parecer estranho, mas a decisão resulta da necessidade de colmatar as falhas de produção num tipo específico de café: o robusta. Grande parte da responsabilidade dessa falha na oferta da matéria-prima resulta da seca que atingiu principalmente o Estado do Espírito Santo. Contudo, não é o único fenómeno que leva a antecipar um desequilíbrio entre a procura e a oferta desta matéria-prima que serve de base ao expresso que toma todos os dias, e por isso mesmo a expectativa aponta para um aumento de preços.

De acordo com dados complicados pela Bloomberg, a média das estimativas atribuídas pelos analistas atribui um potencial de subida dos preços do café em torno de 7% no segundo trimestre e de 11% até ao final do ano, tendo em conta o atual nível de preços. O Goldman Sachs aposta na subida do preço desta matéria-prima. O banco de investimento antecipa que a aceleração do crescimento económico mundial — 3,5% (para 2017) e 3,75% (para 2018) — combinado com a rotação do consumo para os países emergentes, como a China, vai no sentido de um aumento da procura global da matéria-prima, valorizando ainda o impacto dos constrangimentos provocados pela seca no Brasil. “Não acreditamos que a oferta seja capaz de recuperar suficientemente em 2017-18 de modo a compensar o crescimento continuado da procura”, dizia o Goldman Sachs num research recente, acrescentando que os riscos em termos de preço vai “no sentido da subida”.

  • Açúcar para adoçar as carteiras

No caso do açúcar, parte da justificação que leva a antecipar um aumento de preços tem origem na Índia, mas não é a única explicação. Existe um consenso no mercado em relação à escassez de oferta de açúcar para fazer face a uma procura em crescimento a nível global. De acordo com um estudo recente levado a cabo pelo Abares, organismo oficial para as matérias-primas da Austrália, antecipou recentemente que os preços do açúcar deverão manter-se pressionados em alta, atribuindo essa responsabilidade à força da procura. Um outlook que reflete “a expectativa de que o consumo mundial de açúcar irá crescer mais rápido do que a produção, reduzindo as reservas e o rácio de reservas-uso”, diz o Aberes. As suas previsões vão no sentido de que a produção mundial de açúcar cresça a uma média anual de 1,6%, enquanto o consumo deverá aumentar a uma média anual de 2,3%.

Num prazo mais curto as estimativas dos analistas apontam para uma valorização da cotação da matéria-prima na ordem dos 9% no segundo trimestre deste ano face à atual cotação, de acordo com dados compilados pela Bloomberg. Uma evolução a que poderá não ser alheia a quebra da colheita de cana-de-açúcar na Índia nesta época devido à seca — um dos maiores produtores mundiais — que já está a provocar alguma ansiedade no mercado.

  • Vai um sumo de laranja? Desculpe, mas não temos

A citrus greening, doença que atinge as laranjeiras, tem sido uma das principais dores de cabeça dos produtores. No Brasil — o maior exportador de sumo de laranja do mundo (80% da oferta global) — a doença que faz com que a fruta reduza de tamanho ou caia precocemente, levou os produtores a abaterem milhares de árvores e a procurarem outras regiões para cultivar laranjeiras. Em resultado a produção de laranja, que também sofreu os efeitos nefastos do El Nino, caiu no ano passado no Brasil para o patamar mais baixo das últimas duas décadas.

O efeito da doença das laranjeiras também se têm feito sentir mais a norte, nos EUA. A produção de laranja na Flórida — a segunda maior produtora mundial de sumo de laranja do mundo — há anos que vem a cair, prepara-se para atingir mínimos de cinco décadas. Quebras que têm tido impacto nos futuros sobre o sumo de laranja que só nos últimos 12 meses apresentaram uma valorização de quase 44%. Como os problemas de oferta desta matéria-prima não se deverão resolver de um dia para o outro as perspetivas vão no sentido de que os respetivos preços continuem a aumentar.

Investir através de fundos que seguem as matérias-primas

O investimento direto numa matéria-prima não é, contudo, uma forma prática de ganhar exposição — exige, regra geral, conhecimentos mais profundos de produtos financeiros complexos, de risco elevado. Mas há alternativas: pode optar por investir através de fundos, sejam eles tradicionais ou os ETF.

Nos Exchange Traded Funds (ETF), a gestão é totalmente passiva, pelo que a expectativa de quem neles investe será sempre a de obter um retorno próximo do alcançado pelo índice que lhe serve de referência, quer se trate de um cabaz de matérias-primas ou commodity em particular. Os ETF são negociados em bolsa e compram-se e vendem-se através dos bancos ou corretoras tal como se faz com ações.

Um dos pontos a favor deste instrumento prende-se com o facto de as comissões serem mais baratas do que as cobradas pelos fundos de investimento tradicionais. Mas se preferir também pode optar por apostar diretamente em fundos de investimento de commodities, procurando um retorno superior fruto da gestão ativa que está associada a estes produtos. Em Portugal existem vários produtos financeiros com estas características.

Apostar nos setores ligados às matérias-primas

Investir em empresas que produzem determinado bem é outra das formas de ter exposição a determinada matéria-prima. Isto porque, geralmente, as cotações das empresas produtoras são influenciadas pelo valor de cotação dos seus produtos no mercado. Se uma empresa que se dedica à colheita de café será consensual que a subida do seu valor se traduza numa margem de lucro superior, o que beneficia os seus acionistas.

A exposição a essas empresas pode ser feita diretamente em títulos da empresa ou, alternativamente, através de fundos de investimento expostos a empresas do setor.

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