Football Leaks: Inspetor da PJ diz que não foram “afinadas estratégias” com procuradora
O inspetor da Polícia Judiciária, Hugo Monteiro, sublinhou à juíza que não foram "afinadas estratégias" com a procuradora, mas antes prestados esclarecimentos técnicos.
O julgamento do hacker Rui Pinto no âmbito do processo Football Leaks retomou esta quinta-feira, dia 14 de julho, para mais uma sessão. Os inspetores da Polícia Judiciária, Hugo Monteiro e José Amador, marcaram presença. O primeiro a depor foi o inspetor da PJ Hugo Monteiro que sublinhou à juíza que não foram “afinadas estratégias” com a procuradora, mas antes prestados esclarecimentos técnicos.
“Foram prestados esclarecimentos técnicos que tinham a ver com provas do inquérito. A minha participação na reunião foi muito breve e fui dispensado muito cedo“, explicou o inspetor. Em causa está a explicação sobre o que se passou na reunião, divulgada na sessão de julgamento de 22 de abril pela inspetora Aida Freitas, entre a procuradora e os inspetores da PJ. Segundo Aida Freitas, no email de convocatória para essa reunião, José Amador invocava que o objetivo era “afinar a estratégia de inquirição” entre os vários inspetores.
Nesta sessão de julgamento, Hugo Monteiro adiantou que chegou atrasado à reunião, não teve “participação ativa” e saiu mais cedo, uma vez que o inspetor Rogério Bravo lhe disse que a sua presença não era necessária. O inspetor da PJ acrescentou ainda que não foi abordado, na sua presença, o tema do encontro na estação de serviço na A5 entre Doyen e Aníbal Pinto.
Sobre o relatório do encontro na estação de serviço na A5, Aida Freitas chegou a referir em tribunal, nas sessões anteriores, que quem elaborou o relatório foi o inspetor José Amador. Este encontro foi marcado para negociar o valor monetário que Doyen pagaria em troca da não divulgação dos documentos que Rui Pinto teria na sua posse.
O inspetor Hugo Freitas, que inicialmente tinha admitido ser o autor do relatório, já tinha esclarecido numa outra sessão que quando falou em “elaborar” falava do “conteúdo” e quem escreve o mesmo pode ser qualquer um dos elementos que participam na operação. Segundo o inspetor, o conteúdo foi “relatado” por ele, “mas quem escreveu no computador, pode até ser um estagiário”. Ainda assim, admitiu que foi o José Amador que o redigiu.
O segundo inspetor da PJ, José Amador, a ser ouvido na sessão desta quinta-feira voltou a negar qualquer tipo de coordenação com procuradora. Segundo o inquirido, foi a procuradora que solicitou a reunião para esclarecer “dúvidas técnicas”. “Não há aqui nenhuma estratégia. Há uma reunião com partes intervenientes no inquérito que pretendem ver esclarecidas dúvidas. Não queria afinar nada”, acrescentou.
Face às declarações, a defesa de Aníbal Pinto pediu ao tribunal que fossem extraídas certidões para investigar a atuação dos dois inspetores. Os juízes aceitaram o pedido e cabe agora ao Ministério Público decidir se existem ou não indícios suficientes para abrir um inquérito aos inspetores.
Rui Pinto responde por um total de 90 crimes: 68 de acesso indevido, 14 de violação de correspondência, seis de acesso ilegítimo, visando entidades como o Sporting, a Doyen, a sociedade de advogados PLMJ, a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e a Procuradoria-Geral da República (PGR), e ainda por sabotagem informática à SAD do Sporting e por extorsão, na forma tentada. Este último crime diz respeito à Doyen e foi o que levou também à pronúncia do advogado Aníbal Pinto.
Entre os visados estão Jorge Jesus, Bruno de Carvalho, o então diretor do DCIAP Amadeu Guerra ou o advogado José Miguel Júdice, João Medeiros, Rui Costa Pereira e Inês Almeida Costa.
Em janeiro, o julgamento foi interrompido uma vez que a juíza Margarida Alves pediu à PJ que Rui Pinto fosse as instalações consultar a prova do apenso F e e disco rígido RP3, que contém alguns dos mails pirateados pelo próprio.
O arguido Rui Pinto pediu o acesso aos mails que terá pirateado por considerar “indispensável para se poder defender em tribunal”. Os e-mails que alegadamente roubou encontram-se no chamado apenso F — uma parte do processo do caso Football Leaks onde a PJ guardou as caixas de correio eletrónico integrais encontradas nos discos apreendidos e que pertencem a responsáveis de clubes de futebol, a alguns dos mais importantes escritórios de advogados portugueses, como a PLMJ, aos advogados ex-PLMJ (João Medeiros, Rui Costa Pereira e Inês Almeida Costa), a magistrados do Ministério Público, como Amadeu Guerra (à data diretor do DCIAP) ou a pessoas ligadas ao universo Isabel dos Santos.
O objetivo do pedido de cópia do apenso, alegou a defesa de Pinto, seria o de “analisar os ficheiros informáticos constantes no Apenso F, exclusivamente, do ponto de vista técnico, através de pesquisa forense, procedendo à análise de metadados e estruturas de dados, com recurso a ferramentas forenses que lhe permitam ter um conhecimento diferenciado da prova.”
“Todos os elementos acedidos ilicitamente por Rui Pinto, que constam do apenso F, apenas podem ser relevantes para a defesa se forem para a acusação, pelo que o arguido não precisa de ir procurá-los, o Ministério Público já o fez e disponibilizou-os aos sujeitos processuais. Permitir ao arguido que consulte e armazene tudo o que obteve ilicitamente e que, por isso, se encontra a ser julgado, apenas com base no jargão intimidatório de ser necessário à defesa é grave e inadmissível, além de ridículo”, alegaram os assistentes, no pedido de recurso que fizeram para a Relação.
A Relação veio decidir que “em caso algum serão entregues as duas pen drives que constituem o apenso F ao arguido para que este pura e simplesmente as consulte”, dizem os desembargadores, no recurso a que o ECO/Advocatus teve acesso, à data. Mas aceita que Rui Pinto tenha acesso aos ditos e-mails, mas nas instalações da PJ, sob a supervisão da mesma. “A cópia do apenso F apenas é possível ser consultada pelo arguido e a sua defesa, não se permitindo que, realizada a consulta, a cópia fique na posse dos mesmos”, diz a decisão.
Para os assistentes e para o Ministério Público, o facto de Rui Pinto ter acesso às caixas de correio eletrónico — que no fundo é a razão pela qual está a ser julgado — seria uma duplicação do crime e de penalização das vítimas. Além dos assistentes no processo, também o Ministério Público se opôs à entrega do apenso com e-mails a Rui Pinto.
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