Processo EDP/CMEC: PGR ignorou aceleração processual pedida por Mexia e Manso Neto

Defesa pediu aceleração processual do processo CMEC em 2017, mas PGR não fixou prazo para os magistrados responsáveis deduzirem acusação. Investigação dura há dez anos.

Desde o dia 10 de Julho de 2017 que o processo conhecido como EDP/CMEC ficou sujeito ao regime de aceleração processual, a pedido da defesa de António Mexia (ex-líder da EDP) e João Manso Neto (ex-administrador da elétrica), ambos arguidos no processo. Segundo a lei, esse regime conduz à fixação de um prazo para o encerramento do inquérito, pelo/a Procurador/a-Geral da República, de forma a evitar que a investigação dure ‘sine die‘. Por razões várias apresentadas pelos procuradores titulares do processo, passados mais de cinco anos, continua por fixar esse “deadline” pela chefe máxima do MP.

Certo é que, feitas as contas, foi há dez anos, em 2012, que se deu a abertura do inquérito deste processo. E em que uma acusação (ou arquivamento) não viu ainda o luz do dia. O insólito da situação piorou depois de, na quinta-feira, ter sido deduzida acusação mas apenas em relação ao Manuel Pinho, Ricardo Salgado e Alexandra Pinho. E quanto ao ex-ministro de José Sócrates, os factos indiciados constantes na acusação referem-se apenas à relação de Pinho com o ex-líder do BES e a transferência de 15 mil euros mensais para a sua conta, com origem no saco azul do BES.

Quando, resumidamente, o foco da investigação centrava-se nas suspeitas de favorecimento do Governo, na altura de José Sócrates, à EDP. Mas com o decorrer da investigação várias outras suspeitas foram nascendo, como a dos subornos de Salgado, ex-líder do BES, a Manuel Pinho.

Uma investigação que pode continuar ainda mais em ‘banho maria’ depois de, no dia 5 de dezembro, o processo — originalmente chamado de processo EDP — ter sido dividido em dois. Assim, a parte que respeita aos arguidos António Mexia e a João Manso Neto, chama-se agora de processo EDP/CMEC. Nele, vai ainda estar Manuel Pinho mas pelas decisões que tomou enquanto governante e que terão beneficiado a EDP, no caso relativo a novos CMEC.

Já o ‘segundo’ processo refere-se à acusação deduzida na passada quinta-feira, contra Manuel Pinho, Ricardo Salgado e Alexandra Pinho. Em causa estão crimes de corrupção passiva, fraude fiscal e branqueamento de capitais. A acusação conta com 574 páginas e revela que Salgado e Pinho foram acusados de dois crimes de corrupção: ativa no caso de Salgado e passiva no caso de Pinho e de branqueamento de capitais. Aos crimes de Pinho junta-se ainda o crime de fraude fiscal. A ideia é a de evitar que, daqui, nasça mais um processo gigante.

Até a esta separação, o inquérito era composto não só por 85 volumes mas por um conjunto de apensos que contém inquirições (mais de 150), apensos do TCIC com recursos e arrestos (33), e cerca de 200
apensos com diversa documentação em papel e digital. Ou seja, para além dos 85 volumes já se terá ultrapassado os 400 apensos, contando com os apensos que ainda estão a ser preparados pelo MP.

Os despachos de separação de processos -a que o ECO/Advocatus teve acesso — justificam que o facto de existirem recursos pendentes no Tribunal Constitucional e no Supremo Tribunal de Justiça, não lhes é permitido (ao Ministério Público) encerrar a investigação contra António Mexia e João Manso Neto. Tese refutada pela defesa dos arguidos: “estranha-se a alegação de constrangimentos associados a recursos pendentes no Supremo Tribunal de Justiça e no Tribunal Constitucional, uma vez que não há um único recurso pendente no Palácio Ratton e o único recurso pendente no Supremo é de fixação de jurisprudência, o que significa que não tem qualquer tipo de efeito suspensivo na marcha do processo – é, aliás, pressuposto de admissibilidade do recurso, que a decisão de que se recorre tenha já transitado em julgado e seja, por isso, definitiva”, segundo explicaram ao ECO/Advocatus os advogados destes dois arguidos, João Medeiros, Rui Costa Pereira e Beatriz Duarte Santos.

João Medeiros critica ainda o facto da equipa de defesa só ter sido notificada quase quinze dias depois do despacho de separação dos ditos processos. “É uma profunda falta de respeito pelos direitos processuais dos arguidos e dos seus advogados, que se veem na contingência de ter mendigar junto de jornalistas conhecidos que lhe enviem as peças processuais dos processos onde têm procuração. É que isto diz muito justiça de espetáculo que vivemos”,segundo declarações do advogado, ao jornal Observador.

E então que argumentos usou o Ministério Público para a separação de processos?

  • A investigação que” tem decorrido tem como objeto dois núcleos essenciais de factos que, embora tendo um denominador comum (a atuação de Manuel Pinho), são distintos e podem ser descritos e julgados de modo individualizado”;
  • Assim, por um lado, existe “a matéria relativa aos atos praticados (entre 2005-2009) pelo então Ministro da Economia, Manuel Pinho, relativamente ao grupo BES/GES e, por outro lado, as questões que giram em torno dos CMEC em que se investigam as decisões do mesmo arguido, e de elementos da sua equipa governativa e da EDP, relativamente ao favorecimento indevido a essa mesma entidade do setor elétrico com a contrapartida da sua ida para a Universidade de Columbia, nos EUA”;
  • O tentar evitar os mega-processos “com os correspondentes mega-julgamentos – com todos os inúmeros problemas que lhes são reconhecidos;
  • Tentar ultrapassar os constrangimentos “de ainda existirem pendentes diversos recursos, quer no STJ (para fixação de jurisprudência), quer no Tribunal Constitucional que, na realidade, dificultam a possibilidade de se avançar para um despacho de encerramento do inquérito quanto a todos os factos, complicando a utilização de diversos elementos probatórios recolhidos no inquérito”;
  • E ainda por “razões de celeridade processual, nomeadamente impostas pela existência de um arguido que se encontra sujeito a uma medida limitativa da sua liberdade (permanência na habitação com vigilância eletrónica), também beneficiam com esta solução”;

António Mexia foi constituído arguido a 2 de junho de 2017, na sequência de buscas à EDP. Tal como João Manso Neto, antigo administrador da elétrica, é suspeito de quatros crimes de corrupção ativa e de alegados subornos ao antigo ministro Manuel Pinho (Governo Sócrates), ao ex-diretor-geral da Energia Miguel Barreto e a João Conceição, antigo consultor de Pinho no Ministério da Economia e atual administrador da REN.

Quer a Mexia quer a Manso Neto, o MP imputa ainda o crime de participação económica devido ao negócio relacionado com alegadas irregularidades na adjudicação da construção da barragem do Baixo Sabor ao consórcio Grupo Lena/Odebrecht.

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