INE lança “questionário inédito” sobre etnia e discriminação

  • Mariana Marques Tiago
  • 5 Janeiro 2023

Começou esta semana o ICOT, o inquérito do INE que explora temas como a autoidentificação étnica, experiência e perceção sobre discriminação e condições de vida. Mais de 35 mil pessoas vão responder.

O Instituto Nacional de Estatística (INE) iniciou esta semana o Inquérito às Condições de Vida, Origens e Trajetórias da População Residente (ICOT). O objetivo é traçar, até ao final deste ano, um perfil do país relativamente a temas como a autoidentificação étnica, experiência e perceção sobre discriminação e condições de vida. Serão inquiridos mais de 35 mil residentes em Portugal.

O inquérito chega dois anos depois de o INE ter chumbado a proposta de incluir nos Censos 2021 uma pergunta sobre a origem étnico-racial da população. Para o instituto português, era necessária uma avaliação e estudo com uma dimensão adequada para medir aspetos como situações de racismo. Era necessário “um estudo que fosse direto à questão e a abordasse em toda a sua dimensão”, explicou Francisco Lima em conferência de imprensa. Para o presidente do INE, este “é um questionário inédito, inovador mesmo em termos europeus”.

Após um projeto-piloto que ocorreu entre outubro de 2021 e janeiro de 2022, a versão final do inquérito terá como público-alvo residentes em Portugal com idades compreendidas entre os 18 e 74 anos, sendo que a recolha irá abranger mais de 35 mil pessoas. Durante a manhã desta quinta-feira, na apresentação do novo inquérito, o instituto registava já dez respostas.

Habitação e rendimentos são tema em estudo

O ICOT contém dois módulos iniciais (que permitirão fazer um ponto de situação relativamente aos residentes no alojamento em análise), aos quais se juntam outros cinco. O INE irá recolher dados acerca de:

  • Características sociodemográficas (como o nível de escolaridade, nacionalidade, imigração, acesso a cuidados de saúde);
  • Origem e pertença (naturalidade dos pais e avós, escolaridade dos pais, trabalho do cônjuge, grupo étnico, religião e sentimento de pertença na comunidade em que se insere);
  • Discriminação (irá avaliar a perceção de discriminação no país e ainda as situações em que o próprio inquirido se sentiu discriminado – razão, local, a relação com as autoridades);
  • Línguas faladas (em casa, com a família, e também a própria aprendizagem da língua portuguesa);
  • Habitação e rendimento

O último módulo pretende explorar questões como as condições habitacionais (se há acesso à internet e eletricidade, por exemplo), mobilidade, dificuldade em dar resposta face às despesas e ainda os rendimentos. Este foi um dos principais módulos que o INE pretendia testar no projeto-piloto, partilhou o presidente. “A taxa de recusa foi abaixo de 3%”, um valor que se considera bastante satisfatório, acrescentou. Agora, na versão final, o módulo mantêm-se, mesmo que algumas perguntas tenham sido melhoradas.

Além dos dois primeiros aspetos do inquérito (acerca dos residentes no alojamento), as perguntas dos restantes módulos são facultativas. “Os inquiridos terão sempre a oportunidade de dizer “não sei” ou “não quero responder” “, como, por exemplo, em perguntas relacionadas com a saúde e acesso a cuidados de saúde, esclarece o instituto português.

Situação económica é motivo de discriminação em Portugal?

Com a possibilidade de responder em português ou inglês, o ICOT pode ainda ser traduzido em outros dez idiomas: árabe, bengali, francês, hindi, italiano, mandarim, nepalês, romeno, russo ou ucraniano. “O INE está aqui para servir com estatísticas a sociedade”, afirmou o presidente.

Por isso mesmo, o instituto abordará questões como a etnia e a perceção da discriminação de forma calculada. No que toca ao primeiro, estará em causa uma auto-classificação. O inquirido poderá dizer se se considera asiático, branco, cigano, negro, origem ou pertença mista, outro ou optar por não responder. O objetivo é dar liberdade. “Não está em causa a cor da pele. Queremos liberdade para responder, por isso não fechamos a pergunta”.

Já no que toca à discriminação, Francisco Lima explica que o objetivo é perceber se o inquirido considera que viveu situações de discriminação ou se testemunhou alguma. “Estamos a medir perceções, por isso mesmo é preciso um equilíbrio naquilo que questionamos”, explica.

Desta forma, a experiência de situações de discriminação pode tocar em pontos como discriminação contra opiniões políticas, religião, escolaridade, orientação sexual ou até a situação económica/condição social.

Inquérito com “uma das maiores amostras” a nível europeu

Toda a elaboração do ICOT contou com a contribuição do Observatório das Migrações, Alto-Comissariado para as Migrações e da Secção Permanente das Estatísticas Sociais do Conselho Superior de Estatística (que inclui membros do INE, BdP, CGTP, UGT, CIP, DECO e outros). O inquérito será respondido, numa primeira fase, através da Internet, avançando para o telefone e, por fim, presencialmente. A recolha dos dados irá decorrer até maio de 2023. No final do ano, serão apresentadas as conclusões e os dados devidamente trabalhados.

A recolha dos dados será feita com base em unidades de alojamento (UA) distribuídas por todo o território nacional, “uma das maiores amostras de inquéritos realizados pelo INE e até a nível europeu“, concretamente 35.035 UA. O maior número de dados será obtido na Área Metropolitana de Lisboa (através de 11.625 UA), seguindo-se a região Norte (8.055 UA) e Centro (6.605 UA).

Questionado acerca da Proteção dos Dados dos inquiridos (e face à multa de 4,3 milhões de euros aplicada pela Comissão Nacional de Proteção de Dados em dezembro), Francisco Lima assegura que o organismo está preparado: “Estamos aqui para isso [receber e analisar dados]. Sempre lidámos com dados para fins estatísticos. A questão da proteção de dados sempre foi inerente ao INE“.

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