Mortágua: “Este negócio vai ter elevados custos para os contribuintes”
Entre o que já foi pago e a garantia pública agora assumida, o Estado assumirá até 90% das perdas com o Novo Banco, defende Mariana Mortágua.
O Governo não cumpriu as promessas que fez relativamente ao Novo Banco e o negócio que foi acordado com o fundo norte-americano Lone Star vai ter custos para os contribuintes, ainda que o Executivo de António Costa negue que estes custos existem. Quem o diz é Mariana Mortágua, deputada do Bloco de Esquerda, que abre o debate de urgência convocado pelo seu partido para discutir a venda do banco que resultou da resolução do Banco Espírito Santo (BES).
A deputada bloquista começou por lembrar as promessas feitas por Mário Centeno, em janeiro, relativamente ao Novo Banco. Na altura, o ministro das Finanças garantiu que a extinção do banco estava fora de causa, bem como a existência de uma garantia pública, além de assegurar que o Governo não iria “ficar refém de soluções”.
"Como já sucedeu no caso do Banif, seremos a chacota da Europa, porque um país que se leve a sério jamais aceitaria isto.”
Passados estes meses, “cada uma destas certezas foi agora desmentida por quem as apresentou”, atira Mariana Mortágua. “Estamos a correr para trás. Com esta decisão, cerca de 60% dos ativos bancários ficam em mãos estrangeiras. Como já sucedeu no caso do Banif, seremos a chacota da Europa, porque um país que se leve a sério jamais aceitaria isto“, disse. Por outro lado, acrescentou, não se recuperaram os 3,9 mil milhões de euros injetados no Novo Banco, aquando da sua criação, em 2014, como o banco foi entregue ao Lone Star “em condições inaceitáveis”.
A deputada exige, por isso, “clareza sobre as consequências das opções tomadas”, o que implica “assumir que este negócio vai ter, sim, elevados custos para os contribuintes“. Desde logo, porque o Lone Star “leva consigo os 3,9 mil milhões já injetados”, pagando “zero pela compra” e injetando mil milhões “no banco que já é seu”.
Depois, porque o fundo norte-americano “não quer assumir as futuras perdas de uma carteira de oito mil milhões de empréstimos duvidosos”, detalha Mortágua, referindo-se aos ativos tóxicos para os quais foi criado uma garantia, na forma de “mecanismo de capital contingente”, que pode ter de cobrir perdas até um máximo de 3,89 mil milhões de euros. O valor destes ativos, anteriormente alocados ao chamado side bank, não é ainda público. Será apurado no momento da conclusão da venda, cuja data ainda não está definida. Sabe-se apenas que estes ativos valerão um pouco menos do que 10 mil milhões de euros.
"O Lone Star tem 75% do Novo Banco mas só assumirá perdas até aos mil milhões que ele próprio injetou. O Estado fica com 25%, mas pode ter de assumir perdas até 3,89 mil milhões.”
E é precisamente aqui, diz Mortágua, “que entra a garantia pública que o Governo assegurou que nunca existiria”. Como? “O Lone Star tem 75% do Novo Banco mas só assumirá perdas até aos mil milhões que ele próprio injetou. O Estado fica com 25%, mas pode ter de assumir perdas até 3,89 mil milhões“. Feitas as contas, e na pior das hipóteses, “o Lone Star gasta mil milhões para ficar com um banco limpo e o Estado paga 7,79 mil milhões para ficar sem banco nenhum”.
O mecanismo de capital contingente, não sendo tecnicamente uma garantia pública — já que é assegurado pelo Fundo de Resolução, por sua vez suportado pelos bancos nacionais — pode, de facto, obrigar o Estado a voltar a emprestar dinheiro ao sistema financeiro. Isto porque, se os rácios do Novo Banco caírem abaixo de um determinado nível acordado com o Lone Star, o Fundo de Resolução terá de capitalizar o banco para repor os rácios — e, nesse cenário, o Estado tem de emprestar dinheiro aos bancos que suportam o Fundo de Resolução.
“Entre o que já foi pago e a garantia pública agora assumida, o Estado assumirá até 90% das perdas com o Novo Banco. Por que deve então o Estado, em nome de 10% das perdas potenciais, entregar de borla um banco onde já enterrou tanto dinheiro?”, questiona Mortágua.
Perante este cenário, o Bloco de Esquerda defende que “face a tudo o que já foi sacrificado, vale a pena assumir o custo da injeção imediata de capital no Novo Banco” — ou seja, o banco deveria ser nacionalizado.
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