Exclusivo Marquês. Defesa vai à Relação tentar provar doença de Alzheimer de Salgado

Sessão poderá acontecer a 10 de maio, depois da defesa do ex-banqueiro ter pedido em sede de recurso uma audiência para argumentar o que considera de nulidades do acórdão de condenação em seis anos.

O recurso de Ricardo Salgado — relativo à condenação a seis anos de prisão efetiva por abuso de confiança no contexto da Operação Marquês — vai ter uma audiência na Relação de Lisboa. A data proposta pela juíza é a de 10 de maio mas ainda está dependente do ‘ok’ do presidente do Tribunal da Relação. Em causa o pedido feito pela defesa do ex-líder do BES, à juíza responsável por este recurso, especificando os pontos que quer debater.

Uma audiência que poderá acontecer um ano depois de ter dado entrado esse mesmo recurso na Relação de Lisboa e um ano e dois meses depois da decisão em primeira instância que condenou Salgado por abuso de confiança a seis anos de prisão efetiva.

E o que pedem os advogados?

Segundo o pedido dos advogados de defesa, Francisco Proença de Carvalho e Adriano Squilacce, a que o ECO teve acesso, em causa está a omissão do juiz da primeira instância “quanto à anomalia psíquica referente à Doença de Alzheimer do arguido que ficou demonstrada no facto, o que constitui nulidade”. Acrescentando que o “acórdão recorrido violou os princípios da dignidade humana, proporcionalidade e garantias de processo criminal”. Nesta audiência, a defesa pretende ainda debater “que, caso se entenda que a anomalia psíquica superveniente do arguido não está suportada pela matéria do facto provado, a primeira instância tinha de ter determinado a realização de perícia médica para determinar se o arguido tem anomalia psíquica superveniente, mas, não o fez, pelo que o próprio acórdão recorrido violou o Código Penal e, ainda, incorreu em nulidade”, já que há uma insuficiência para a decisão da matéria de facto provada. Os advogados invocam ainda o acórdão de novembro de 2021, em que o ex-presidente da Câmara de Santa Comba Dão, João Lourenço, foi condenado a uma pena suspensa de sete anos de prisão, pelo facto do arguido sofrer da doença de Alzheimer.

Recurso parado há um ano na Relação de Lisboa

Em janeiro deste ano, esse recurso tinha voltado à estaca zero. Em causa a baixa médica – que já durava há três meses – do juiz a quem tinha sido distribuído o processo, em maio. O processo acabou por ser redistribuído e ficou a cargo da magistrada Maria Leonor Botelho, da terceira secção da Relação de Lisboa.

Em maio, a defesa do ex-presidente do BES, Ricardo Salgado, recorreu da condenação a seis anos de prisão no processo separado da Operação Marquês e pediu a revogação do acórdão, considerando que a decisão de pena efetiva vai causar ou acelerar a sua morte do cliente.

“Afigura-se evidente que uma qualquer prisão efetiva — ainda para mais na duração determinada no acórdão recorrido — causará ou, pelo menos, acelerará o falecimento do ora arguido recorrente“, pode ler-se no recurso com 792 páginas para o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL).

Os advogados do ex-banqueiro, Francisco Proença de Carvalho e Adriano Squilacce, lembraram o diagnóstico de Doença de Alzheimer que foi atribuído e criticam a decisão do tribunal de primeira instância por aplicar “esta pena de prisão efetiva sem sequer ter ‘gasto’ ou ‘dedicado’ uma única palavra para apreciar a concreta relevância” da patologia, tornando uma “questão absolutamente essencial numa ‘não questão’”.

O próprio acórdão recorrido fez questão de omitir e não apreciar os concretos efeitos jurídicos que daí advêm para a determinação da pena e respetiva suspensão”, refere a defesa de Salgado, sublinhando que “a mera leitura do acórdão recorrido afigura-se, no mínimo, chocante no que diz respeito à aplicação de uma pena de prisão efetiva” e que a omissão de pronúncia relativamente à doença de Alzheimer constitui uma nulidade.

Embora a defesa do ex-banqueiro defenda que este “deve ser absolvido das imputações dos três crimes de abuso de confiança que lhe foram dirigidas”, é também admitido que, no limite, seja imposta pena menor do que cinco anos e suspensa na execução a Ricardo Salgado.

“A ser aplicada uma pena única de prisão (…), esta pena única deve ser muito inferior a cinco anos, que deve ser suspensa, porquanto a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”, indica o recurso, que nota ainda que se o ex-banqueiro cometeu os crimes de abuso de confiança imputados, “então será forçoso concluir que está em causa um único crime de abuso de confiança qualificado continuado”, ao qual não deve corresponder a um ano de prisão com execução suspensa.

Na mesma altura, também o MP apresentou recurso, pedindo a condenação no julgamento de primeira instância em seis anos de prisão seja “revogada e substituída por outra que condene o arguido [Ricardo Salgado] na pena única de 10 anos de prisão”. Caso o pedido não seja acolhido pela Relação, o MP solicita que “no mínimo” seja condenado na “pena única de seis anos e oito meses de prisão”, o que acrescenta oito meses à condenação de primeira instância.

Condenação de Ricardo Salgado por abuso de confiança

Ricardo Salgado foi condenado por três crimes de abuso de confiança (apropriação ilícita de dinheiro de terceiros) em penas parcelares de quatro anos de prisão (por cada um dos crimes) e, em cúmulo jurídico, na pena única de seis anos de prisão, sendo que o crime de abuso de confiança qualificado (ou de elevado valor) é punido com pena de 1 a 8 anos.

O juiz presidente do coletivo, Francisco Henriques — o mesmo que pertencia ao coletivo que julgou Armando Vara por um crime de lavagem de dinheiro, também saído do Marquês — não leu sequer o que se poderia chamar de uma súmula do acórdão. Limitou-se a dizer que crimes estavam em causa, baseados em que transferências e valores correspondentes, a que penas Salgado estava condenado (quatro por cada um dos crimes) e a pena final, por cúmulo jurídico, de seis anos.

No acórdão, o juiz considerou que ficou provado que o ex-banqueiro sofre desta doença neurológica mas não referiu esse mesmo estado de saúde ao aplicar a pena de prisão efetiva de seis anos. Por um lado, admitiu que existia mas, por outro não ponderou esse fator para a aplicação da pena.

O ex-banqueiro esteve acusado de 21 crimes no processo Operação Marquês, mas, na decisão instrutória proferida em 9 de abril de 2021, o juiz Ivo Rosa deixou cair quase toda a acusação que era imputada ao arguido. Ricardo Salgado acabou pronunciado por apenas três crimes de abuso de confiança, devido a transferências de mais de 10 milhões de euros, para um julgamento em processo separado, cujo acórdão foi conhecido no dia 7 de março do ano passado.

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