Quase 14 mil trabalhadores, 600 milhões em receitas e 28 unidades: como é o negócio da Luz Saúde?
Com quase 14 mil funcionários, dos quais "cerca de 4 mil médicos" e 3 mil enfermeiros, o Hospital da Luz é o principal ativo do grupo. É este grupo que vai para a bolsa.
O que é o grupo Luz Saúde, hoje detido pela Fidelidade e prestes a regressar ao mercado de capitais? Fundado em 2000 sob a denominação de Espírito Santo Saúde, o atual grupo Luz Saúde tinha um único dono: a família Espírito Santo, ainda que através de várias participações. Contudo, em 2014, o grupo liderado por Ricardo Salgado decidiu abrir a empresa a novos investidores, colocando na bolsa portuguesa 49% do capital da Espírito Santo Saúde, e mantendo os 51% remanescentes no seio da família Espírito Santo.
Já em outubro de 2014, a Fidelidade lançou uma oferta pública de aquisição (OPA), após garantir a aquisição de 51% do capital da Espírito Santo Saúde. Assim, a seguradora acabou por adquirir 96% do capital da empresa e foi, aliás, nesse mesmo ano que o grupo se passou a chamar Luz Saúde.
Já em fevereiro de 2018, a Fidelidade vendeu 49% do capital da empresa aos chineses da Fosun (que é acionista da seguradora). Assim, atualmente, a Fidelidade é a acionista maioritária deste grupo de saúde privado, com 99,86% do capital social da empresa. E, se em 2018, o grupo liderado por Isabel Vaz saiu do mercado de capitais português, cinco anos volvidos a seguradora Fidelidade está a estudar voltar a colocar a Luz Saúde em bolsa, através de uma oferta pública inicial (IPO).
Apesar de nenhuma decisão ter sido oficialmente confirmada, a Fidelidade espera obter uma avaliação de mais de mil milhões de euros para o grupo de saúde. Depois de uma auscultação de mercado, o Citigroup e o UBS deverão ser os bancos internacionais responsáveis pela venda de 30% a 40% do capital do grupo de saúde, liderando um sindicato bancário de seis bancos, entre os quais estarão a CGD e o BCP, além de outros bancos internacionais, segundo apurou o ECO junto de duas fontes que conhecem a operação. Objetivo é haver uma decisão para levar a Luz Saúde para a bolsa no último trimestre do ano, caso as operações de mercado o permitam. Mas, afinal, o que é o negócio da Luz Saúde?
14 hospitais, 13 clínicas e uma residência para idosos
Dona de 14 hospitais privados (Hospital da Luz, Hospital do Mar, Hospital da Misericórdia de Évora), 13 clínicas em regime de ambulatório e uma residência sénior, a Luz Saúde fechou o ano passado com receitas de quase 600 milhões, o que representa uma subida de 10,6% em relação ao ano anterior, “impulsionados pelo crescimento do segmento de saúde privados”, que atingiu os 585,9 milhões (subida de 10,8%), segundo consta no relatório e contas da empresa, referente a 2022. Já o lucro antes de juros, impostos, amortizações e depreciações (EBITDA) cresceu 26,9% para 82 milhões, enquanto o resultado líquido atribuível aos acionistas subiu 63,8% para 26,9 milhões.
O grupo conta atualmente com 13.819 funcionários, dos quais “cerca de 4 mil médicos” e “cerca de 3 mil enfermeiros”, avançou fonte oficial da Luz Saúde, em resposta ao ECO. Com 650 gabinetes para consultas, 64 especialidades, 55 blocos de partos, 1.200 camas para internamento e presença na região Norte, Centro, Centro Sul e Madeira, o grupo detém, “em certas regiões, o único hospital privado em exploração”, pelo que a atividade assistencial ocupa grande parte do modelo de negócio da Luz Saúde.
Neste contexto, e após o “embate” da pandemia, “os números de produção clínica apresentados em 2022 constituem o melhor desempenho de sempre do segmento de negócio privado” do grupo, segundo consta no relatório e contas do ano passado.
Das consultas à urgência, a atividade assistencial em números
No ano passado, o grupo liderado por Isabel Vaz realizou cerca de 2,1 milhões de consultas, valor que contrasta com as cerca de 1,9 milhões realizadas em 2021 e as cerca de 1,6 milhões registadas no primeiro ano de pandemia.
Por outro lado, em 2022 foram realizados quase 1,2 milhões de exames de imagiologia, o que contrasta com os mais de 1,1 milhões realizados no ano anterior e os 849 mil realizados em 2020.
Ao mesmo tempo, e num ano em que o SNS enfrentou problemas com vários serviços de urgência, o grupo Saúde atendeu 393 mil episódios de urgência, o que representa uma subida de quase 42% face aos 277 mil atendimentos em serviço de urgência em 2021. Em 2020, o grupo tinha atendido 253 mil episódios de urgência.
Em 2022, o grupo Luz Saúde realizou 64 mil cirurgias e partos, isto é, um ligeiro aumento face aos 60 mil realizados em 2021. Em 2020, tinham sido realizados 53 mil. Deste total, 4.230 dizem respeito a partos realizados na rede do Hospital da Luz, segundo avançou fonte oficial do grupo ao ECO.
O grupo tem ainda dois serviços de apoio ao cliente para a prestação de cuidados de saúde: a linha LUZ 24 e Linha Direta Oncologia. A LUZ 24 foi lançada no primeiro ano de pandemia e é em muito semelhante à Linha SNS 24. Serve, por isso, de linha telefónica de triagem clínica de apoio ao atendimento urgente para crianças e adultos, estando disponível 24h por dias todos os dias do ano.
Nesse sentido, a equipa de enfermeiros dedicada a este serviço pode, por exemplo, encaminhar o doente e a respetiva informação clínica para a equipa de urgência da rede do grupo a que se tiver que deslocar, ou até sugerir a realização de uma videoconsulta urgente. Só no ano passado, esta linha efetuou mais de 50 mil triagens.
Já a Linha Direta Oncologia, é responsável por agilizar o acesso a cuidados de diagnóstico e tratamento de doenças oncológicas, estando também disponível.
Planos para o futuro: mais clínicas e um novo hospital em Santarém
Para este ano, o grupo espera abrir no segundo semestre “duas novas unidades ambulatórias“: a Luísa Todi em Setúbal e Carreira no Funchal, bem como terminar até junho as obras de requalificação do Hospital da Misericórdia de Évora, segundo consta no relatório e contas de 2022.
Já para 2024, contam abrir “duas novas unidades ambulatórias na zona de influência do Hospital da Luz Coimbra, em Leiria e Figueira da Foz”, enquanto que para o primeiro trimestre de 2025 está previsto a abertura de uma nova clínica em Vila Franca de Xira e um novo hospital em Santarém, a partir da segunda metade do ano.
“O Grupo também reforçará a sua presença no sul do país com a expansão e upgrade clínico do Hospital da Luz Setúbal, que se prevê ficar concluída no segundo semestre de 2026″, lê-se ainda.
Da PPP de Loures ao impacto da pandemia
A pandemia teve um impacto na atividade assistencial dos serviços de saúde, levando ao adiamento de consultas e cirurgias, concentrado a atividade no tratamento de doentes Covid. E o grupo Luz Saúde não foi exceção, pelo que a recuperação só começou a surgir no segundo ano de pandemia.
“A partir do segundo trimestre de 2021, foi possível uma franca recuperação da atividade em todas as unidades do grupo, tendo o ano terminado com uma atividade superior à verificada em 2019 em todas as áreas, com exceção das urgências”, aponta o relatório e contas referente a 2022, acrescentando que esta situação “reforçou-se” no ano passado “com todas as linhas assistências a apresentarem crescimento significativo” à exceção das análises clínicas que tiveram uma “redução drástica da testagem para Covid-19”.
À semelhança de outros grupos de saúde privados, a pandemia levou a Luz Saúde a avançar para um tribunal arbitral contra o Estado, tendo em vista a “reposição do reequilíbrio financeiro”. Em causa está um litígio entre a SGHL – empresa detida pelo grupo Luz Saúde e que geria o Hospital Beatriz Ângelo aquando da Parceria Público-Privada (PPP) neste hospital – e o Estado, no qual esta sociedade pede a “reposição do equilíbrio financeiro do contrato de gestão, com fundamento na situação epidemiológica feita sentir no território nacional nos anos de 2020 e 2021 decorrente do surto do vírus SARS-CoV-2 e da correspondente condenação do Estado Português ao pagamento da alegada “perda de remuneração” e das alegadas “despesas adicionais” em que a mesma terá incorrido”, segundo um despacho publicado no início de março.
Em fevereiro, o Jornal de Notícias, já dava conta desta intenção, referindo que em causa estarão entre 45 milhões e 48 milhões de euros pelos prejuízos decorrentes da pandemia. Apesar de ainda não haver um desfecho sobre este processo, o grupo referia ser “expectável que o processo seja considerado encerrado ainda no decurso do primeiro semestre de 2023”, lê-se no relatório e contas do ano passado.
Já antes o Estado e o grupo Luz Saúde tinham entrado em litígio, nomeadamente por causa dos pagamentos para o tratamento do VIH/Sida ou sobre o pagamento dos encargos com a formação de médicos. Recorde-se que o primeiro contrato de gestão para a PPP do Hospital Beatriz Ângelo foi assinado em 2009, tendo terminado em janeiro do ano passado.
No primeiro ano de pandemia, esta PPP provocou perdas de dezenas de milhões de euros ao grupo, num ano em que “o desempenho consolidado global do ano foi negativo”. “O impacto do Hospital Beatriz Ângelo foi absolutamente determinante, tendo o resultado operacional do segmento público sido negativo em 29,9 milhões de euros”, apontava o relatório e contas do grupo referente a 2020.
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