Adiar PRR “não será boa resposta” para travar inflação, defende ex-governador do Banco de Portugal
Ex-governador envia mensagem ao Governo sobre como deve reprogramar o PRR: os investimentos devem ter em vista o impacto no produto potencial do país. Assim, ajudará a combater a alta inflação.
O antigo governador do Banco de Portugal considera que adiar a execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) “não será uma boa resposta” para aliviar a inflação. Pelo contrário, Carlos Costa defende que a bazuca pode ajudar no combate às tensões nos preços, devendo ser encarada como um “mecanismo de expansão da oferta”. Nessa medida defende uma reprogramação tendo em vista o impacto no produto potencial dos países.
“Caso se admita que o PRR vai impactar o produto potencial, o que não é automático nem está garantido, tenho muitas dúvidas que o adiamento da execução seja a boa resposta”, refere Carlos Costa num artigo de opinião com o título “Mensagem para um amigo com responsabilidades na formulação da política económica”, publicado esta quinta-feira no Observador (acesso pago).
O ex-governador não identifica esse “amigo”, mas quem tem responsabilidades de política económica é o Governo, nomeadamente António Costa, com quem tem mantido uma relação turbulenta nos tempos mais recentes por causa da acusação de que foi pressionado pelo primeiro-ministro a manter Isabel dos Santos no EuroBic para que se resolvesse o impasse no BPI, onde a empresária angolana tinha interesses.
No entender de Carlos Costa, agora aposentado, o PRR deve ser encarado como um “mecanismo de expansão da oferta”, o que permitiria ajudar a aliviar a escalada inflacionista, ao lado da política monetária dos bancos centrais.
Admite que, no curto prazo, o PRR pode implicar uma expansão da procura e, portanto, um aumento da pressão sobre os preços. Porém, admitindo que os fundos estão focados no investimento – e não na sustentação da procura – e que o investimento tem efeitos sobre o produto potencial, então, executar o “PRR é necessário”.
O economista e antigo governador do banco central adianta que uma “boa resposta” com o PRR tem de passar por três planos – e isto quando o Governo se prepara para entregar a Bruxelas a reprogramação do PRR:
- que a revisão do PRR tem de se “concentrar no investimento com efetivo impacto no produto potencial, eliminando todas as parcelas que não tenha outro objetivo que não fosse garantir a execução”;
- que a reprogramação vise aumentar o produto potencial do setor dos bens transacionáveis;
- reduzir a procura agregada que não tem impacto no produto potencial, nomeadamente através “do aumento da poupança pública e do estímulo da poupança privada”, o que, “desejavelmente”, poderia ser feita através da promoção do mercado de capitais e da atração da tomada de participações no capital das empresas.
Para os países europeus é um “imperativo” e “premente” promover o crescimento do produto potencial pois está a “registar uma crescente tensão entre a sua capacidade produtiva e a salvaguarda do modelo social”, situação que tem resultado da desindustrialização, da evolução demográfica e do aumento da taxa de população dependente.
Credibilidade do BCE “minimizou custo da resposta tardia” à inflação
Carlos Costa vai às origens da inflação e dá a sua receita sobre como atuar sobre os fatores que estão a pressionar os preços em alta. Diz que os bancos centrais se atrasaram na resposta, quando achavam que ia ser um fenómeno temporário, e que não souberam antecipar os efeitos de segunda ordem, que tornou o fenómeno mais resistente.
Ainda assim, recuperaram a mão e atualmente as expectativas de inflação a cinco e dez anos têm estado ancoradas em torno do objetivo da estabilidade de preços. “O que permite concluir que os agentes económicos têm, até agora, assumido que a política monetária reagirá de forma rápida e na justa medida do que é necessário para inverter a trajetória da inflação e atingir um valor em linha com a definição de estabilidade de preços”, argumenta.
Para tal, considera o ex-governador, contribuiu a “credibilidade dos bancos centrais”, que “minimizou o custo da resposta tardia”.
Isto constitui em si mesmo, prossegue Carlos Costa, “a demonstração de que a credibilização da política monetária e a independência dos bancos centrais tem sido, em si mesma, um fator de estabilidade nominal, uma espécie de dividendo da forma como foi conduzida a política monetária nas últimas décadas”.
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