Empresas vão pagar mais mil euros por trabalhador com subida recorde do salário mínimo
A subida recorde do salário mínimo nacional não vai apenas aumentar o rendimento desses trabalhadores. Vai também fazer crescer o valor que é preciso entregar todos os meses à Segurança Social.
É o maior aumento anual “alguma vez ocorrido”. O salário mínimo nacional vai subir em janeiro dos atuais 760 euros para 820 euros, um salto de 60 euros, que implica também um crescimento do valor a entregar todos os meses à Segurança Social. Entre os custos salariais e os encargos com a Taxa Social Única (TSU), os empregadores vão ter de pagar mais mil euros por ano por cada trabalhador que receba a retribuição mínima garantida. As confederações patronais pediram um alívio do que têm de descontar para a Segurança Social, mas o Governo fechou a porta, argumentando que, acima de tudo, há que proteger a sustentabilidade desse sistema.
“O salário mínimo vai ter uma valorização de 7,9%. Será um crescimento de 60 euros. É o maior aumento anual do salário mínimo alguma vez ocorrido“. Foi assim que a 7 de outubro o primeiro-ministro anunciou a subida do salário mínimo nacional, que ficou prevista no reforço do acordo de rendimentos assinado pelas confederações patronais (exceto a Confederação Empresarial de Portugal) e pela UGT.
E na última sexta-feira, numa audição parlamentar no âmbito do Orçamento do Estado para 2024, a ministra do Trabalho voltou a vincar a relevância dessa subida, sublinhando que é a maior de sempre tanto em termos absolutos, como relativos.
Em contraste, Armindo Monteiro, presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP) tem alertado que esse aumento, a par do referencial de 5% para a subida dos salários do privado, pode ser exigente para as empresas, já que não são colocadas no terreno, em paralelo, medidas que ajudem as empresas a serem mais competitivas e produtivas.
“Claro que as pessoas devem ganhar o melhor possível. A questão é saber qual vai ser o resultado do trabalho de cada colaborador e se está em linha com o aumento dos salários”, salienta o “patrão dos patrões, em declarações a ECO, referindo, então, que a cada acréscimo remuneratório deveria sempre corresponder “um acréscimo do valor acrescentado da economia, que, neste caso, é medido pela produtividade do trabalho”. “O salário mínimo é decretado, mas infelizmente o crescimento da economia não o é“, ironiza o responsável.
Vamos a contas. Só considerando os custos salariais, as empresas vão ter de despender todos os meses mais 60 euros do que fazem hoje por cada trabalhador que receba o salário mínimo. São mais 840 euros por trabalhador nesse nível salarial ao fim de um ano (14 meses).
Mas a subida do salário mínimo não implica só maior despesa com ordenados. Também faz subir o montante que os empregadores têm de pagar de TSU, que corresponde a 23,75% dos vencimentos.
Por mês, a TSU dos patrões por cada trabalhador com salário mínimo vai subir 14,25 euros — de 180,50 euros para 194,75 euros. Ao fim do ano, as empresas terão um custo extra de 199,5 euros com a TSU face ao praticado durante 2023.
Ou seja, contas feitas, em 2024, o trabalhador vai passar a receber como salário mínimo 820 euros em vez de 760 euros, mas para a empresa o custo passará dos atuais 940,50 euros (salário e TSU) para 1.014,75 euros (salário e TSU), o equivalente a um aumento de 74,35 euros dos gastos das empresas por mês.
Ao fim de um ano, os empregadores vão gastar mais 1.039,5 euros por mês por cada trabalhador com o salário mínimo.
Em entrevista ao ECO, a bastonária da Ordem dos Contabilistas Certificados, Paula Franco, chegou a alertar que a TSU é “um dos encargos mais elevados“, sendo um dos valores que “as empresas têm mais dificuldade em cumprir”. No âmbito do Orçamento do Estado para 2022, as confederações patronais pediram um alívio dessa obrigação, mas o Governo fechou a porta, já que esses descontos alimentam o sistema de Segurança Social, cuja sustentabilidade está sempre em discussão e análise.
Importa notar que também são exigidos descontos para a Segurança Social ao trabalhador, mesmo o que recebe o salário mínimo (que não paga, porém, IRS). Os tais 820 euros são um valor bruto e não líquido. Neste caso, o desconto para a Segurança Social é de 11%. Ora, hoje o salário mínimo líquido é de 676,4 euros. Em 2023, será de 729,8 euros.
Quer isto dizer que o empregador passará a despender, todos os meses, 1.014,75 euros, mas o que chegará à carteira do trabalhador serão 729,8 euros. Daí que a CIP esteja a pedir às empresas que criam o software que gera os recibos de vencimentos que tudo o que a empresa paga por trabalhador (incluindo os tais 23,75%) passe a vir discriminado.
“As pessoas já se desabituaram de olhar para o que ganham. Habituaram cada vez mais a olhar para o que recebem. Significa que estão a ignorar o custo efetivo. A proposta da CIP é que no recibos venha todo o custo, para que as pessoas tenham a perceção do que recebem e daquilo que efetivamente ganham“, frisa Armindo Monteiro.
Na mesma linha, Rafael Campos Pereira, vice-presidente da Associação dos Industriais Metalúrgicos, Metalomecânicos e Afins de Portugal, comenta: “Isso seria importantíssimo para literacia das pessoas”.
Este responsável — que é também vice-presidente da CIP — detalha que, no setor que representa (que é responsável, segundo o próprio, por cerca de um terço das exportações do país), há empresas que “acomodarão com alguma facilidade” o aumento dos custos já referidos, mas outras terão alguma dificuldade. Daí que Rafael Campo Pereira tenha a esperança que, na especialidade, o Orçamento do Estado absorva algumas das propostas da CIP para promover a capitalização e as exportações.
Até ao final da legislatura, o Governo quer que o salário mínimo chegue, pelo menos, aos 900 euros, sendo que, desde 2015, tem subido, ano após ano, mesmo durante a pandemia. Ainda assim, segundo a ministra do Trabalho, a fatia de trabalhadores que o recebem no total dos empregados tem encolhido. Em 2023, está em 20,8%, enquanto em 2022 estava em 24,3% dos trabalhadores.
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