Greenvolt. A renovável que Manso Neto carregou da biomassa até uma OPA
A Greenvolt ainda não conta quatro anos de atividade, mas já teve tempo de expandir para novas áreas de negócios, mais de uma dezena de geografias e chegar à bolsa de valores. Agora é alvo de uma OPA.
A Greenvolt “renasceu” do negócio de biomassa da Altri e pela mão de João Manso Neto, o CEO que lhe veio dar uma nova vida. Da biomassa expandiu para outras áreas das renováveis, do solar de grande escala até ao solar descentralizado, e foi trilhando o seu caminho por várias geografias, passando pela bolsa nacional e desembocando agora numa oferta pública de aquisição (OPA), lançada pelo fundo americano KKR. Em apenas três anos, são vários os marcos. Relembre aqui esse percurso.
No início, estava a biomassa. A Bioelétrica da Foz, desde 2018 que deixou de ser a “EDP Bioelétrica” para passar inteiramente para as mãos da Altri, a qual já tinha uma participação de 50% nesta empresa “de elevado potencial” desde 2006. E bastaram três anos para uma nova reviravolta no destino da empresa de biomassa: em 2021 foi anunciada uma contratação de peso para agarrar as rédeas da empresa. João Manso Neto, afastado da liderança da EDP Renováveis na sequência de um processo judicial, abraçou o desafio, e a Bioelétrica não só ganhou um novo CEO como também uma nova identidade: nasceu a Greenvolt.
João Manso Neto assumiu as rédeas da empresa em março de 2021. Os 17 anos ao serviço da EDP terminaram com a suspensão das suas funções como CEO da EDP Renováveis, após ter sido constituído arguido por suspeitas de crimes de corrupção ativa. Foi substituído, interinamente, por Miguel Stilwell de Andrade, o homem forte das finanças da EDP, que se mantém hoje como CEO da EDP e da EDP Renováveis. Manso Neto não só não voltou, como também não quis aceitar os 1,7 milhões de euros que a EDP lhe prometia caso este assinasse um pacto de não concorrência, o qual o impediria de trabalhar noutras empresas da área. Preferiu um novo desafio, o mesmo que ainda hoje abraça. Em entrevista ao Expresso, o gestor confessou que o processo lhe pesava, mas garantiu que não condiciona de forma alguma o trabalho na Greenvolt.
Do antigo ninho para o PSI em seis meses
De facto, o trabalho na Greenvolt seguiu com várias aquisições e com os mercados de capital como uma das grandes preocupações. Só no primeiro ano da empresa, esta operou quatro grandes aquisições que a lançaram em novas áreas de negócio, entrou em bolsa e foi “promovida” ao índice de referência na bolsa de valores nacional, o PSI.
Começou, em junho de 2021, por expandir a atividade de biomassa para o Reino Unido, adquirindo 51% da Tilbury Green Power Holdings Limited, detentora de uma central de biomassa em Terras de Sua Majestade. Avançou, na altura, em parceria com o fundo Equitix. Nem um mês depois, em julho, a totalidade da polaca V-Ridium Power Group, dedicada ao desenvolvimento de projetos solares e eólicos, passou para a alçada da Greenvolt.
Logo em agosto, a empresa liderada por Manso Neto acrescentou ao seu “saco de compras” a Track Profit Energy e Track Profit II Invest, que atuam no desenvolvimento de projetos de eficiência energética bem como de instalação de projetos solares fotovoltaicos. Em outubro, foi a vez de arrecadar a Perfecta Energía, que opera no setor das energias renováveis, na venda, instalação e manutenção de painéis de energia solar para autoconsumo de clientes residenciais.
E, no meio desta agitação, a empresa deu outro passo que a deixou na ribalta. Todos os “holofotes” se viraram para a Greenvolt quando, a 14 de julho, tocou o sino na sala da Euronext, assinalando a chegada à bolsa de Lisboa. E foi desde logo que a recém-cotada assumiu o compromisso de crescer nos mercados. “Temos a pretensão de, logo que possível, e logo que possível tem de ser setembro porque não dá antes, ir para o PSI-20. É ponto de honra. Queremos fazê-lo e muito rapidamente”, afirmou João Manso Neto, na sessão de admissão em bolsa.
Setembro era a data mais próxima possível para dar o salto para o princ índice nacional, pois nesse mês dar-se-ia a revisão trimestral das cotadas que o constituem. E de objetivo, passou a realidade. As ações da cotada mantêm-se em negociação nesta sede até ao momento. De uma avaliação de cerca de 500 milhões de euros na estreia, evoluiu para os atuais 1,1 mil milhões em capitalização bolsista. Os 4,25 euros a que cada ação começou por cotar, negoceiam agora em torno da fasquia dos 8 euros.
A empresa foi, desta forma, crescendo e transformando-se. Num esforço de harmonização, em novembro de 2022, pouco mais de um ano após a criação da marca Greenvolt, a empresa decidiu apostar numa mudança de imagem que foi, em parte, também uma reorganização das várias insígnias que iam entrando no universo da empresa.
Debaixo do chapéu Greenvolt passaram a estar a Greenvolt Biomass, que concentra o negócio de produção de energia através da biomassa, a Greenvolt Power, que agrega os projetos solares e eólicos de larga escala a nível internacional (anteriormente, sob a marca V-Ridium), e a Greenvolt Next e a Greenvolt Comunidades. A Greenvolt Next concentra a atividade solar que era antes responsabilidade da Profit Energy. Já a Greenvolt Comunidades abarca o negócio da Energia Unida, lançada em abril de 2022 pela Greenvolt para se dedicar ao desenvolvimento do conceito de Comunidades de Energia, promovendo a partilha da energia produzida a partir de painéis fotovoltaicos entre os membros da comunidade.
Entretanto, a empresa já saiu de baixo da asa da Altri. Em maio passado, depois da venda de várias parcelas da participação, a papeleira desfez-se dos 1,34% que lhe restavam do capital, ditando uma separação total dos negócios da pasta do papel e das energias renováveis que a Altri albergava.
Solar e eólico quase “a apanhar” a biomassa
A base de biomassa mantém-se forte na empresa, apesar de os negócios de larga escala relacionados com a energia fotovoltaica e eólica estarem a ganhar protagonismo. Nos últimos resultados apresentados, relativos aos nove primeiros meses do ano, a Greenvolt, apresentou lucros de 5,9 milhões de euros, quase 65% abaixo do período homólogo, mas afirmou que estes estão “em linha com as expectativas”.
O EBITDA de 76,9 milhões de euros, que apresentou uma quebra de 3%, apoiou-se maioritariamente no negócio da biomassa, que contribuiu com 40,5 milhões de euros. As seis centrais, cinco em Portugal e a sexta no Reino Unido, entregaram contudo 17% menos de receitas, tendo em conta a evolução dos preços da eletricidade no Reino Unido e uma paragem “por mais tempo do que o planeado” da central nesse país.
Mas se as receitas da biomassa totalizaram os 122,8 milhões de euros, o segmento de “utility scale”, referente aos projetos solares e eólicos de larga escala, não ficou muito atrás. Somou 100,3 milhões de euros, contribuindo com 38,8 milhões para o EBITDA. E estes números refletem um crescimento expressivo desta área: as receitas dispararam 396% e o EBITDA 467%.
Esta evolução foi suportada pelas receitas dos ativos em operação e as margens decorrentes da rotação de ativos, após vendas bem sucedidas no primeiro semestre de 2023. O objetivo é vender ainda 200 megawatts até ao final de 2023, dos quais um terço já foi vendido. De momento, a Greenvolt conta 172 megawatts (MW) de projetos ‘“utility scale” operacionais na Polónia, Roménia e Portugal. Prontos a construir estão um total de 1.321 megawatts.
Com menos expressão apresenta-se o segmento do solar distribuído (ou descentralizado – o solar em pequena escala dirigido ao autoconsumo). Pesou negativamente no EBITDA, em 2,8 milhões, apesar das receitas de 49,8 milhões de euros, que engordaram em 145% face aos primeiros nove meses de 2022. Ainda assim, a Greenvolt espera atingir o breakeven deste negócio no último trimestre de 2023, e as instalações até setembro já ultrapassavam o total de 2022 em 45%.
O solar distribuído da Greenvolt está, para já, presente em nove mercados europeus. Em Portugal, Espanha, Polónia, Grécia Roménia e França exibe a insígnia Greenvolt Next”. Em Itália, Irlanda e na Alemanha faz-se representar através de participações na Solarelit, Enerpower e Maxsolar, respetivamente. Adquiriu também uma empresa na Península Ibérica, a Ibérica Renováveis, para acelerar o ritmo das instalações. Tem EBITDA positivo em três localizações: Portugal, Itália e Irlanda.
2024 com mais lucros à vista
No mesmo documento de apresentação de resultados, a Greenvolt antevê um “maior crescimento e lucro em 2024”. Os objetivos para o próximo ano passam pela rotação de ativos de 500 MW, tendo já lançado três processos de venda para mais de 350 MW, e é com os ganhos destas operações e um “melhor desempenho” do solar distribuído que a cotada conta acelerar os lucros.
De resto, a empresa identifica o momento atual como benéfico para a sua atividade. Nomeadamente, aponta como fatores a favor a volatilidade dos preços da energia e a dificuldade em licenciar projetos de renováveis, problemas que podem ter resposta no negócio do solar descentralizado. Esta solução, promovida pela Greenvolt, ajuda a proliferar a energia renovável, de baixo custo, e facilita a instalação de novos projetos, ao ter uma presença mais local.
Em paralelo, as disrupções que se haviam feito notar na cadeia de fornecimento da energia solar estão “estabilizadas”, considera a empresa. Por fim, a regulação, como por exemplo o novo desenho de mercado, tem apontado para o apoio às energias renováveis, dando mais um impulso à atividade da Greenvolt.
A 21 de dezembro foi anunciado o último grande passo na vida desta empresa. O fundo KKR lançou uma oferta pública de aquisição (OPA) sobre a Greenvolt, tendo acordado com os sete acionistas de referência a compra de 60% do capital da empresa. São eles a Actium Capital, Caderno Azul, Livrefluxo, Promendo Investimentos, V-Ridium, KWE Partners, 1 Thing Investments.
Apesar do acordo, existem muitas aprovações regulatórias para obter, pelo que a compra, a realizar-se, será apenas a partir de 31 de maio do próximo ano. O dia 30 de setembro é o limite traçado pelo fundo para obter todas as aprovações necessárias.
Caso o fundo comprador passe a deter 90% ou mais dos direitos de voto da Greenvolt, pode comprar as ações restantes, resultando numa saída da bolsa. Ou, mesmo abaixo do limiar dos 90%, há a hipótese de o KKR propôr a saída de bolsa em Assembleia Geral. Mas só o tempo dirá como irá decorrer o processo, e em que mãos passará a estar a Greenvolt, que teve até agora nos mercados uma das suas maiores montras.
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