Jovens que trabalhem para o estrangeiro também têm direito a devolução de propinas
Devolução das propinas foi anunciada como uma das medidas para fixar os jovens em Portugal. Contudo, quem fique por cá, mas trabalhe remotamente para o estrangeiro também terá direito a apoio.
O Governo criou um novo prémio para valorizar os “jovens qualificados que trabalham no país“, mas deixou a porta aberta a que também aqueles que trabalhem remotamente para empresas estrangeiras a partir de Portugal tenham direito a este apoio, que visa devolver as propinas pagas no ensino superior.
Vamos por partes. Em setembro, na rentrée do PS, António Costa anunciou a devolução das propinas pagas no ensino superior aos jovens qualificados que, terminados os estudos, decidam ficar a trabalhar em Portugal.
Este foi um dos “presentes” anunciados pelo agora primeiro-ministro demissionário com vista a fixar jovens no país e mitigar a fuga de cérebros.
Quase quatro meses depois, o Governo publicou as regras dessa medida, a que chamou prémio salarial de valorização da qualificação. O objetivo, segundo o decreto-lei conhecido no final de dezembro, é incentivar financeiramente o exercício da profissão em território nacional.
“[Há] o duplo objetivo de recompensar o prosseguimento de estudos superiores e de contribuir para a valorização dos rendimentos dos jovens qualificados que trabalham no país“, insiste o Governo, no diploma em questão.
Mas também os jovens que, residindo em Portugal, escolham trabalhar remotamente para empresas estrangeiras vão ter direito a este prémio, que varia entre 697 euros anuais para os licenciados e 1.500 euros anuais para os mestres. Isto já que basta ser residente em Portugal e declarar rendimentos por cá (de trabalho por conta de outrem ou a recibos verdes) para ter acesso a esta medida.
Por exemplo, um jovem que termine a licenciatura — e não precisa de ter estudado necessariamente por cá — e seja residente em Portugal, mas trabalhe para uma empresa que esteja na Alemanha também vai ter direito à devolução das propinas.
É que, explica o advogado Guilherme Dray, sócio da Macedo Vitorino, em regra, esse jovem declara o seu rendimento em Portugal, mesmo que este seja pago por uma empresa alemã. “Em princípio, este rendimento não deverá ser tributado na Alemanha já que toda a atividade é desenvolvida em Portugal“, detalha, em declarações ao ECO.
Logo, este jovem cumpre os critérios de acesso ao prémio salarial. “O facto de os rendimentos de trabalho resultarem de um trabalho remoto para uma empresa alemã não deveria afastar a aplicação do prémio desde que o jovem mantenha a residência em Portugal“, sublinha Guilherme Dray.
Patrícia Cabriz, associada da CCA Law Firm, é da mesma opinião, realçando que baste que o jovem esteja registado com residente fiscal em Portugal e pague IRS por cá.
A propósito, Gonçalo Pinto Ferreira, sócio coordenador da área de Trabalho da Telles, adianta que são consideradas residentes em território português as pessoas que no ano a que respeitam os rendimentos hajam nele permanecido mais de 183 dias, seguidos ou interpolados. Quer isto dizer que mesmo um jovem que se desloque frequentemente para outro país para trabalhar numa empresa estrangeira tem direito ao apoio.
“Tendo em conta que apenas se exige que o trabalhador seja residente fiscal em território português e consequentemente declare o respetivo IRS (categoria A ou B) em Portugal, na minha opinião não é expectável que tenha impacto negativo a circunstância de o jovem poder estar a trabalhar remotamente para outro país“, entende o advogado.
Convém notar, ainda assim, que a atribuição deste apoio não será automática. Os jovens, trabalhando para empresas portuguesas ou estrangeiras, têm de preencher um formulário eletrónico, que ainda não foi divulgado. Falta uma portaria do Ministério das Finanças para definir os detalhes desses procedimentos.
Conforme já escreveu o ECO, também os estrangeiros que venham trabalhar para Portugal têm direito a este apoio, mesmo que não tenham estudado por cá.
Daí que os especialistas já tenham frisado que, afinal, não está em causa a devolução das propinas, conforme anunciado, mas um prémio para os jovens qualificados que trabalhem em Portugal ou, pelo menos, a partir do país.
Esta medida deverá custar aos cofres do Estado 215 milhões de euros só em 2024, de acordo com o Orçamento do Estado para este ano.
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