Parlamento vota lei do lóbi à pressa, com a Operação Influencer como pano de fundo
A regulamentação do lóbi volta ao Parlamento depois de quase uma década de avanços e recuos, com um veto presidencial de Marcelo Rebelo de Sousa pelo meio, em 2019.
A regulamentação do lóbi está de volta ao Parlamento – com o diploma a ser votado esta sexta-feira – depois de quase uma década de avanços e recuos, com um veto presidencial de Marcelo Rebelo de Sousa pelo meio, em 2019.
Por lobismo entende-se o conjunto de comunicações e contactos estabelecidos de forma a influenciar decisões públicas e políticas. Em Portugal já esteve perto de ser regulamentado. Depois do veto de Marcelo – há quatro anos – o tema voltou a ficar “parado” na agenda política, em 2021, depois da dissolução da Assembleia da República.
Agora, surge à pressa na agenda parlamentar, num contexto de crise política e com eleições legislativas à porta – marcadas para 10 de março – depois das suspeitas de terem existido favores e influências por parte do ex-chefe de gabinete de Costa Vítor Escária e do advogado Diogo Lacerda Machado, amigo de Costa, junto do Governo, no processo da Operação Influencer, que levou à demissão de António Costa e à queda do Governo.
Em 2019, a lei foi aprovada com votos a favor do PS e do CDS e abstenção do PSD, mas o decreto acabou por ser vetado pelo Presidente da República. Agora, Portugal já vai atrasado, já que os lóbistas que defendem interesses dos clientes junto dos decisores públicos é uma atividade legal em grande parte dos países europeus e desenvolvidos.
Na quarta-feira, o PS desafiou as restantes bancadas com iniciativas legislativas sobre a matéria a votar uma lei antes da dissolução do parlamento, com vários partidos a criticar a falta de tempo para o processo de especialidade.
“O repto que lançamos às bancadas que vieram hoje ao debate com as suas propostas é que tentemos ainda no final desta legislatura oferecer algo que tem vindo a ser debatido neste parlamento há quase uma década”, apelou o deputado socialista Pedro Delgado Alves na abertura do debate.
De acordo com o socialista, a regulamentação do lobismo “não é uma bala mágica, mas é uma ferramenta que faz falta há vários anos”. Pedro Delgado Alves defendeu que este “é um trabalho de vários anos que pode ser aproveitado” e que “o facto de ser difícil não o torna impossível” até à dissolução do Parlamento prevista para dia 15 deste mês.
A questão que se coloca é se esta lei do lóbi já estivesse em vigor, a investigação em torno da Operação Influencerteria acontecido na mesma? Qual a linha que separa o lóbi do tráfico de influências?
“Não me parece que a regulamentação do lóbi impedisse esta investigação, pela simples circunstância de a ausência de regulamentação também não significar que a atividade lobista não é possível, ou que não é lícita. É evidente que é. Só não está regulada. E, por conseguinte, mesmo não sendo proibida, temos em curso a investigação que temos”, disse Rui Costa Pereira, advogado associado coordenador da MFA Legal.
Mas o advogado não tem dúvidas sobre a importância e necessidade de Portugal regular o lóbi, considerando que é mais uma área em que Portugal está profundamente atrasado. “Já era assim em 2019 e continua a ser, na medida em que essa regulamentação potenciaria a transparência das relações estabelecidas entre lobistas e as entidades públicas”, disse.
Alexandra Mota Gomes, sócia da Antas da Cunha Ecija, alertou que é necessária essa lei, até devido ao número crescente de casos de corrupção e de tráfico de influências que têm surgido. A advogada defende que a regulamentação da atividade de lóbi iria contribuir para a existência de uma “maior transparência nas decisões legislativas”.
“Acredito que esta atividade, se for devidamente regulamentada, poderá contribuir para uma maior igualdade de acesso ao poder legislativo, uma maior capacidade de informação no que toca aos representantes políticos e, principalmente, um aumento exponencial da confiança no poder político, porquanto qualquer cidadão poderia aceder livremente aos registos que determinaram todo o percurso efetuado até à tomada de decisões políticas e legislativas”, explicou.
Também Miguel Pereira Coutinho, advogado associado sénior da Cuatrecasas, apesar de não conseguir afirmar se a investigação estaria em curso ou não com uma possível lei do lóbi, garante que pelo menos traria mais “transparência”. “Certamente que haveria hoje em dia mais transparência na interação com o setor público e uma definição bem clara sobre o que é, e não é, o lóbi”, referiu.
O advogado sublinhou ainda que, apesar do veto de Marcelo em 2019, o chefe de Estado fê-lo não por discordar, mas antes por ter identificado no diploma importantes lacunas. Entre elas, a ausência de obrigação de declaração dos rendimentos obtidos com a atividade exercida, bem como a sua origem, a ausência de identificação da estrutura acionista e beneficiários últimos no que diz respeito a pessoas coletivas e o facto de o diploma não se aplicar a interações com o Presidente da República ou os representantes da República nas Regiões Autónomas.
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