Exclusivo TAP acusa ex-CEO de ter escondido consultora de viagens e aviação
Christine Ourmières-Widener trabalhou para a O&W Partners, que fundou em 2019, quando era CEO da TAP e sem autorização, "violando clamorosamente" o Estatuto do Gestor Público, aponta a companhia.
A TAP acusa Christine Ourmières-Widener de ter “sonegado informação” sobre uma empresa de consultoria de viagens e aviação para a qual trabalhava como administradora enquanto era CEO da companhia aérea portuguesa. A acumulação de cargos é incompatível à luz do Estatuto do Gestor Público, pelo que a gestora francesa “violou clamorosamente o regime de exclusividade”, sendo um motivo para a demissão por justa causa, de acordo com a contestação que a defesa da TAP entregou esta segunda-feira no tribunal face ao pedido de indemnização milionária da ex-CEO por causa da sua saída polémica no ano passado.
Segundo a defesa da companhia aérea, desde dezembro de 2019 que Christine Ourmières-Widener é “fundadora, acionista e administradora da O&W Partners, com sede em Londres”, uma “empresa de consultoria de viagens e aviação (travel & airline consulting)”.
Porém, a gestora francesa nunca “informou ou sequer solicitou qualquer autorização” à TAP e aos acionistas para se manter o cargo de administrador da O&W Partners enquanto liderou a transportadora portuguesa. “Manteve, durante todo o período em que exerceu funções enquanto CEO das TAP, um cargo de administradora que nunca revelou ou que mereceu o assentimento de qualquer dos seus acionistas ou de qualquer representante do Governo“, alega a defesa.
“Na verdade, só no âmbito da preparação da presente ação é que a TAP tomou conhecimento de que a autora [Christine Ourmières-Widener] havia sonegado esta informação”, acrescentam os advogados da TAP.
A defesa lembra que, ao abrigo do Estatuto do Gestor Público, “o exercício do cargo de administrador com funções executivas em empresa pública tem lugar em regime de exclusividade” e que “o cargo de gestor público com funções executivas é incompatível com o exercício de quaisquer funções profissionais, remuneradas ou não, bem como com a integração em corpos sociais de quaisquer pessoas coletivas”.
Ora, durante o tempo em que foi CEO da TAP, prossegue ainda a defesa da companhia aérea, Christine Ourmières-Widener acumulou funções em mais duas empresas sem “o consentimento de qualquer dos órgãos e pessoas mencionados supra para poder desempenhar funções em clara violação do regime de exclusividade que se lhe exigia e aplicava. Foi administradora da ZeroAvia, uma empresa que se encontra a desenvolver um sistema de propulsão a hidrogénio para a aviação e onde ainda se encontra; e, entre 12 de fevereiro de 2021 e 15 de maio de 2023, exerceu o cargo de administradora não executiva do MetOffice, recebendo uma remuneração anual de 15 mil euros.
Para a defesa, independentemente das razões que levaram à destituição de Christine Ourmières-Widener, “esta sempre deveria ser destituída, com justa causa, por violação do regime de exclusividade aplicável aos gestores públicos com funções executivas”, segundo se lê na contestação de 289 páginas ao pedido de indemnização de 5,9 milhões de euros que a ex-CEO da TAP reclama.
A defesa, levada a cabo pela sociedade de advogados Uría Menendez, fala mesmo em “violação clamorosa” do regime de exclusividade, pelo que a ex-líder da TAP devia ter sido destituída “logo em 2021”, e sem direito a qualquer indemnização.
Por mais que o exercício dos cargos na ZeroAvia e MetOffice pudessem ter sido autorizados pelas rés ou pelos seus acionistas – o que se rejeita expressamente e apenas se equaciona por dever de patrocínio — é manifesto que a autora nunca informou ou sequer solicitou qualquer autorização às rés e aos seus acionistas para manter o cargo de administradora da O&W Partners enquanto exercesse o cargo de CEO das rés.
Pelo contrário, a gestora francesa considera que saiu por “mera conveniência” e que era “elo mais fraco” no caso da saída da ex-administradora Alexandra Reis.
A demissão de Christine Ourmières-Widener aconteceu na sequência da polémica indemnização de 500 mil euros brutos paga à antiga administradora executiva Alexandra Reis para renunciar ao cargo na TAP, que foi considerada ilegal pela Inspeção-Geral de Finanças (IGF). O anúncio foi feito a 6 de março pelos ministros das Finanças e das Infraestruturas, Fernando Medina e João Galamba (que, entretanto, se demitiu), em conferência de imprensa.
O Ministério das Finanças justificou a demissão com a “violação grave, por ação ou por omissão, da lei ou dos estatutos da empresa”, conforme previsto no artigo 25.º do Estatuto do Gestor Público. O que não dá direito a receber qualquer indemnização.
Uma acusação sustentada nas conclusões da auditoria da IGF, que considerou “nulo” o acordo celebrado entre a companhia aérea e Alexandra Reis, por o Estatuto do Gestor Público não prever “a figura formalmente utilizada de ‘renúncia por acordo’ e a renúncia ao cargo contemplada naquele Estatuto não conferir direito a indemnização”, concluindo “que a compensação auferida pela cessação de funções enquanto administradora carece de fundamento legal”.
O mandato da ex-CEO terminou formalmente a 12 de abril, quase 22 meses depois de tomar posse. Além de Christine Ourmières-Widener, também foi demitido o presidente do conselho de administração, Manuel Beja. Alexandra Reis teve de devolver a maior parte da indemnização.
(Notícia atualizada às 7h26)
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