Operação Marquês. Ida de Salgado para a prisão depende de médicos e de nova perícia, decide Supremo

Recurso de Salgado confirmou a pena a oito anos por três crimes de abuso de confiança. Mas o ex-banqueiro pode ter pena suspensa com nova perícia que confirme a fase de Alzheimer do arguido.

O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) confirmou a condenação de oito anos por abuso de confiança aplicada a Ricardo Salgado – no âmbito da Operação Marquês – mas admite que pode vir a ser suspensa antes de começar a ser cumprida. Nova perícia e diagnóstico dos médicos serão decisivos para saber se o ex-banqueiro vai ou não para a cadeia.

Ou seja, o recurso é improcedente mas é favorável ao arguido na medida que os juízes acrescentam que “sem prejuízo porém dessa verificação cautelar avaliativa (que será feita pelos médicos) até à detenção do arguido”.

En passant, não cremos que se deva concluir (…) que a competência para a suspensão da execução da pena deva ser aferida apenas ou necessariamente apenas pelo tribunal de execução de penas mas, antes, nada impede (…) que a sua avaliação seja ou possa ser efetuada desde o momento em que seja possível e justificado, o que poderá ocorrer bem antes do início de execução da pena”, dizem os juízes conselheiros.

“Se, até ao início da execução da pena e desde que a anomalia psíquica superveniente ao crime seja detetada, havendo elementos suficientes que a comprovem no sentido em que a mesma determine e justifique uma suspensão, ela pode e deve ser aplicada mesmo antes da respetiva execução”:

Ou seja, o STJ contraria a tese dos anteriores acórdãos – de primeira instância e da Relação de Lisboa–- que diziam que a doença de Alzheimer e consequente pena suspensa só faria sentido ser decidida pelo Tribunal de Execução de Penas. Cuja função é o de garantir os direitos dos reclusos, pronunciando-se sobre a legalidade das decisões dos serviços prisionais. Agora, os juízes conselheiros defendem que essa avaliação deve ser feita à priori, antes de Salgado entrar na cadeia.

Continuando, diz o Supremo que “se a incapacidade de compreensão, entendimento e adaptação ao sentido e finalidade da pena fosse já de tal modo grave que não colocasse dúvidas relevantes, também não vemos impossibilidade legal direta e decisiva no sentido de declaração suspensiva mesmo antes da fase de execução propriamente dita”, explicam.

“Numa situação clínica em que seja evidente, indubitável, seguro e convincente a inapropriedade de aplicação da pena de prisão, face à doença indicada (ou outro tipo qualquer de anomalia psíquica superveniente ao crime) seria de todo injustificável e desumano sujeitar o condenado à execução da pena ou mesmo a iniciá-la para depois a suspender. Por isso, a Justiça deixa nas mãos de médicos especialistas para se concluir se Ricardo Salgado terá ou não de se apresentar na prisão.

Em janeiro, mais uma perícia independente confirmou que Ricardo Salgado sofre da doença. O relatório foi assinado por uma neurologista, um psiquiatra e uma consultora de psicologia do Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses (INMLCF). “A doença de Alzheimer é causa mais provável do quadro clínico do arguido”, dizia a perícia médica de quase 50 páginas. Já em dezembro, Instituto Nacional de Medicina Legal (INML) confirmou: o ex-banqueiro está no segundo grau mais grave da doença, com “dependência de terceiros para algumas atividades básicas”. O ex-presidente do Grupo Espírito Santo (GES), Ricardo Salgado, apresentou, a 30 de outubro, uma reclamação para que o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) admitisse o recurso da pena de oito anos de prisão a que foi condenado no processo da Operação Marquês. Recurso esse que foi agora decidido pelo STJ.

Em maio, o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) aumentou a pena de prisão efetiva – da primeira instância – de Ricardo Salgado de seis anos para oito anos pelos três crimes de abuso de confiança, que saíram da Operação Marquês.

Ricardo Salgado (E), ex-presidente do BES, à saida do Tribunal Central de Instrução Criminal para uma audição no âmbito da Operação Marquês, Lisboa, 8 de julho de 2019. . MANUEL DE ALMEIDA/LUSAMANUEL DE ALMEIDA/LUSA

Em causa está o processo separado da Operação Marquês, no qual o antigo presidente do Banco Espírito Santo (BES) foi condenado na primeira instância, em março de 2022, a seis anos de prisão efetiva por três crimes de abuso de confiança.

À data, o juiz presidente do coletivo, Francisco Henriques — o mesmo que pertencia ao coletivo que julgou Armando Vara por um crime de lavagem de dinheiro, também saído do Marquês — não leu sequer o que se poderia chamar de uma súmula do acórdão. Limitou-se a dizer que crimes estavam em causa, baseados em que transferências e valores correspondentes, a que penas Salgado estava condenado (quatro por cada um dos crimes) e a pena final, por cúmulo jurídico, de seis anos.

Mas um dos aspetos essenciais e que mais curiosidade suscitava neste processo em concreto era o de saber até que ponto a doença de Alzheimer de Salgado seria ponderada para a aplicação da pena. No acórdão, o juiz considerou que ficou provado que o ex-banqueiro sofre desta doença neurológica mas não referiu esse mesmo estado de saúde ao aplicar a pena de prisão efetiva de seis anos. Por um lado, admitiu que existia mas, por outro não ponderou esse fator para a aplicação da pena.

O ex-banqueiro esteve acusado de 21 crimes no processo Operação Marquês mas, na decisão instrutória proferida em 9 de abril de 2021, o juiz Ivo Rosa deixou cair quase toda a acusação que era imputada ao arguido. Ricardo Salgado acabou pronunciado por apenas três crimes de abuso de confiança, devido a transferências de mais de 10 milhões de euros, para um julgamento em processo separado.

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