UE precisa sair do “mundo de ontem”. As receitas de Draghi para acelerar a competitividade europeia
Economista italiano defende “mudança radical” em que a UE tire partido da sua dimensão geográfica, coordene o fornecimento de bens públicos e garanta recursos para diminuir a dependência externa.
Ganhar escala, coordenar o fornecimento de bens públicos e garantir recursos sem aumentar a dependência de países terceiros são as três vertentes em que a União Europeia (UE) deve trabalhar para aumentar a competitividade da sua economia face à China e aos EUA, especialmente em setores como a energia, a defesa e a tecnologia.
Estas receitas foram propostas pelo antigo primeiro-ministro italiano e ex-presidente do Banco Central Europeu (BCE) Mario Draghi, que está a preparar um relatório sobre a competitividade da UE – a ser apresentado em junho –, e para quem o bloco comunitário precisa de uma “mudança radical” para sair do “mundo de ontem” e adaptar-se “ao mundo de hoje e de amanhã”.
Numa conferência organizada pela presidência belga do Conselho da UE esta semana, Draghi alertou para a expansão chinesa e o protecionismo norte-americano, políticas que, “na melhor das hipóteses, destinam-se a redirecionar o investimento para as suas próprias economias à custa das nossas; ou, na pior, destinam-se a tornar-nos permanentemente dependentes delas”.
Embora reconheça a existência de “iniciativas positivas”, o economista italiano considera que falta à UE uma estratégia para manter o ritmo na corrida pela liderança no domínio das novas tecnologias; proteger a indústria comunitária de condições de concorrência desiguais a nível mundial; e garantir recursos e os fatores de produção necessários às ambições europeias sem aumentar a dependência externa.
Usar a escala para intensificar aquisições conjuntas e harmonizar regras
Assinalando que os principais concorrentes do bloco europeu estão a tirar partido da sua dimensão continental para gerar escala, aumentar o investimento e conquistar quotas de mercado em setores económicos essenciais, Draghi realça que a fragmentação está a impedir a UE de usar a vantagem natural de que também dispõe em termos geográficos.
Como exemplos da falta de escala da Europa, aponta as áreas da defesa e das telecomunicações: na primeira, os governos não efetuam muitas aquisições em conjunto e compram a países terceiros; na segunda, há demasiados operadores móveis, o investimento per capita é metade do dos EUA e a implantação do 5G e da fibra ótica está atrasada.
O antigo presidente do BCE sugere, nesse sentido, “intensificar as aquisições conjuntas”, “aumentar a coordenação das despesas e a interoperabilidade dos equipamentos” e “reduzir substancialmente a dependência externa” em matéria de defesa e segurança. Nas telecomunicações, gerar mais investimento passa por “racionalizar e harmonizar ainda mais a regulamentação” nos Estados-membros.
Adicionalmente, Draghi propõe resolver a “barreira” de trazer e aumentar a inovação no mercado interno europeu através da revisão da atual regulamentação prudencial dos empréstimos bancários e da criação de um novo regime regulamentar comum para as startups no domínio da tecnologia.
Aumentar interconexões no fornecimento de bens públicos
Tornar a economia europeia mais competitiva, segundo o responsável italiano, precisa de ter em conta também a melhoria da coordenação no que diz respeito ao fornecimento de bens públicos. É o caso da energia, setor em que a existência de um mercado integrado e interconexões “reduziria os custos energéticos” para as empresas e tornaria a UE “mais resistente” a futuras crises.
Outro exemplo é a infraestrutura de supercomputação da UE, em que, apesar de dispor de uma rede pública de computadores de alto desempenho (HPC, na sigla em inglês) de nível mundial, as repercussões para o setor privado são atualmente “muito limitadas”, alerta.
Draghi sugere que esta rede seja utilizada pelo setor privado – por exemplo, startups no domínio da inteligência artificial e pequenas e médias empresas (PME) – e, em contrapartida, os benefícios financeiros recebidos poderiam ser reinvestidos para modernizar os HPC e apoiar a expansão da nuvem na UE.
Uma vez identificados os bens públicos, é necessário dotar a União Europeia dos meios para os financiar. Para o economista, a maioria do impulso financeiro deverá vir do investimento privado, o que torna “indispensável” a União dos Mercados de Capitais (UMC) para a estratégia global de competitividade europeia.
Garantir recursos e trabalhadores qualificados
Por fim, o ex-primeiro-ministro italiano realça a importância de garantir o fornecimento de recursos e os fatores de produção essenciais sem aumentar a dependência de países terceiros, em particular para atingir as metas climáticas.
Notando que a Comissão Europeia já deu início a este processo com a Lei das Matérias-Primas Críticas, Draghi considera, porém, que são necessárias medidas complementares, propondo a criação de uma Plataforma Europeia para os Minerais Críticos, que se dedicaria, especificamente, à aquisição conjunta, a assegurar aprovisionamento e financiamento diversificado e à constituição de reservas.
Por outro lado, são necessários trabalhadores qualificados com as competências adequadas. Com o envelhecimento demográfico e políticas desfavoráveis à imigração, estas competências têm de ser encontradas “internamente”, alerta o economista, apelando para que os parceiros sociais ajudem a “adaptar o mercado de trabalho à era digital” e a “capacitar os trabalhadores”.
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