Portuguesa Jular reveste centro Gulbenkian e prepara prédios de madeira em Lisboa

A portuguesa Jular revestiu partes do novo centro Gulbenkian com madeira. Este material, que tem sido a base de um negócio em crescimento, deverá servir também para erguer dois prédios em Lisboa.

É este fim de semana que se dá o evento de estreia do novo Centro de Arte Moderna da Gulbenkian, que se apresenta com uma nova face. No exterior, impõem-se as largas palas espelhadas, projetadas pelo arquiteto japonês Kengo Kuma. No reverso dessa estrutura, os visitantes são acolhidos por um revestimento de madeira com identidade portuguesa: foram instalados pela Jular, uma empresa nacional que se dedica à construção em madeira de forma sustentável. Este ano prepara-se para estrear um novo segmento de negócio: está em negociações para avançar com a construção de dois prédios em madeira na zona de Lisboa.

A Jular desenvolveu a solução estrutural e de revestimento do lado inferior da pala do Centro de Arte Moderna da Gulbenkian – a chamada “Engawa”, uma expressão japonesa que se refere à zona de alpendre, no exterior dos edifícios. A empreitada incluiu ainda o teto da nova galeria temporária. Partes de uma obra que custou, na totalidade, 58 milhões de euros, de acordo com o presidente da Fundação Calouste Gulbenkian, António Feijó, citado pelo jornal Público. O investimento total da obra derrapou, mas do lado da Jular não houve percalços: “executámos tudo dentro do orçamento original”, garante o administrador Hélder Santos.

Além do contributo para a construção do centro da Gulbenkian, a Jular também tem no seu portefólio o Pavilhão Inovação AIP-FIL (Associação Industrial Portuguesa – Feira Internacional de Lisboa) ou a Redbridge School, igualmente erguidos na capital portuguesa.

A Jular trabalha em construção de madeira desde 1996, mais de duas décadas depois da fundação da empresa, em 1973. Detida e gerida pelos irmãos Hélder Santos, Amaro Santos e Luís Santos, iniciou a atividade nas áreas de promoção imobiliária, comércio de materiais de construção e importação de madeiras, mas foi evoluindo na cadeia de valor, primeiro na indústria de revestimentos e, finalmente, na construção estrutural em madeira, o que aconteceu em meados dos anos 90.

"Temos negócios em desenvolvimento em Espanha, França e Angola, pelo que existem perspetivas de crescimento do volume de negócios para essas geografias nos próximos meses.”

Hélder Santos

Administrador da Jular

A empresa tem mais de 150 projetos concluídos, repartidos entre múltiplos formatos, e 20 deles estão agora em desenvolvimento. Constrói desde edifícios inteiros, tais como escolas, hotéis, habitações, restaurantes, pavilhões industriais e coberturas, ao mesmo tempo que trata da reabilitação de edifícios. A um custo mais acessível que a média do mercado: uma moradia de 100 metros quadrados, de uma gama média, custa cerca de 150.000 euros, ilustra o administrador. Mais recentemente, a Jular tem-se dedicado a construir também habitações de uma gama mais alta, com maiores áreas, telhados inclinados e acabamentos melhores, cujos preços rondam os 200.000 euros.

Este ano, a empresa está a lançar-se num novo segmento: o das habitações plurifamiliares, ou prédios, em linguagem corrente. Hélder Santos indica que tem “dois projetos na zona de Lisboa, em negociação”. Estes serão “integralmente construídos em madeira”, explica e, para já, a ideia é terem quatro pisos. Embora as negociações não estejam fechadas, conta que os preços sejam abaixo da média praticada na capital.

Em 2023, o volume de negócios da Jular ascendeu a 10 milhões de euros e o lucro a um milhão. O volume de negócios tem crescido cerca de 10% ao ano desde 2015, e em 2024 espera verificar a mesma tendência. Hoje, a construção em madeira pesa 50% nas receitas e os revestimentos e madeiras para construção dão origem aos restantes 50%.

A totalidade das receitas no ano passado foram arrecadadas com a operação em Portugal, mas os territórios onde estão ativos oscilam ao sabor das oportunidades. “[Este ano] temos negócios em desenvolvimento em Espanha, França e Angola, pelo que existem perspetivas de crescimento do volume de negócios para essas geografias nos próximos meses”, afirma Hélder Santos, administrador da Jular.

Em Espanha, a empresa de construção em madeira está negociar três projetos de casas unifamiliares, em França está a trabalhar num resort e num projeto de habitações secundárias, leia-se, casas de férias, e em Angola atua na venda de materiais.

Um mercado em crescimento, por entre alguma desconfiança

Há muito desconhecimento no nosso mercado, que ainda é dominado pelo complexo da história dos três porquinhos”, lamenta o administrador da empresa, explicando que a ideia de que a madeira não é um material robusto para construção afeta os promotores, projetistas, bancos, seguros e entidades públicas. Ainda assim, assiste a um desenvolvimento do mercado em segmentos como aeroportos, hospitais, hotéis, escolas e habitações plurifamiliares. “Todos estes nichos estão a olhar para a madeira como um material de construção a considerar quando se trata de projetar o futuro”, afirma.

"Há muito desconhecimento no nosso mercado, que ainda é dominado pelo complexo da história dos três porquinhos.”

Hélder Santos

Administrador da Jular

Um argumento a favor é o tempo de obra, mais curto, mas também algumas questões de sustentabilidade. “A madeira é uma esponja para o carbono e isso torna-a um material altamente sustentável – na verdade, o mais sustentável de todos”, defende Hélder Santos. Ao contrário de outros materiais de construção, como o aço ou o betão, que libertam elevadas quantidades de carbono na sua produção, instalação e reciclagem, a madeira absorve este gás poluente, libertando o ambiente da sua presença, explica o administrador. E ilustra com os seguintes números: uma parede de madeira com um metro quadrado fixa 80 quilogramas de carbono equivalente, enquanto uma parede de betão de um metro quadrado liberta 120 quilogramas de carbono equivalente.

Ainda no capítulo da sustentabilidade, a Jular indica que possui várias certificações, que abarcam desde a madeira que usam — controlando o impacto desde a plantação, passando pelo transporte e pelas práticas sociais — até à pegada de carbono dos edifícios. Depois do processo de construção, a totalidade dos desperdícios são reciclados.

A empresa realça também que esta indústria, ao aumentar o valor da madeira, ajuda a preservar as florestas. “Os países com a melhor gestão florestal têm excedentes de biomassa na floresta, ou seja, produzem mais madeira do que a que consomem. Essas práticas de gestão florestal devem ser copiadas por outros mercados, nomeadamente o nosso”, defende. A Jular importa sobretudo madeira de pinho com origem na Europa central e na Escandinávia.

No caso português, reconhece, a indústria madeireira não produz ainda madeira que possa competir em preço, qualidade e volume, com as indústrias do centro e norte da Europa. Questionado sobre o efeito na atividade dos incêndios frequentes que assolam o país, Hélder Santos ressalva que “um incêndio violento destrói qualquer tipo de casa”, mas que é importante que o promotor escolha espécies de madeira adequadas para os diferentes tipos de uso, assim como uma boa execução e manutenção. Existe ainda a hipótese de proteger as paredes com tintas indicadas para o efeito.

Por fim, a leveza e o facto de não enferrujar promovem uma maior durabilidade e também flexibilidade. Em paralelo, “é um excelente isolante térmico e acústico, e resiste melhor ao fogo do que o aço”, indica Hélder Santos.

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