“Não seremos capazes de fazer reformas com quem não sabe ou não quer dialogar”, diz MJ à Ordem dos Advogados

As palavras são da ministra da Justiça, no discurso na abertura do encontro anual do Conselho Superior da Magistratura, em Vila Real, numa clara crítica à relação do MJ com a Ordem dos Advogados.

“Nestes seis meses de governo, o Ministério da Justiça não fechou as portas a ninguém. Falámos com quem pretendeu dialogar, ouvimos quem nos quis trazer preocupações, mas também propostas e soluções. Não podemos, não conseguimos, nem seremos capazes de fazer reformas com quem não sabe ou não quer dialogar”. As palavras são da ministra da Justiça, no discurso na abertura do encontro anual do Conselho Superior da Magistratura, em Vila Real, numa clara crítica à atual relação tensa do ministério com a Ordem dos Advogados (OA).

Em causa a revisão da tabela de remuneração dos advogados do Estado. Na reunião de trabalho relativa à Reforma do Sistema de Remuneração dos Advogados Oficiosos, realizada esta quarta-feira, Fernanda de Almeida Pinheiro fez-se representar por um vogal do Conselho Geral, Alberto Barreiros e, da parte do Governo, tal como a reunião anterior, esteve presente a secretária de Estado Adjunta e da Justiça (SEAJ), Maria Clara Figueiredo.

“A qualidade dos interlocutores tem sido determinante para o sucesso de algumas decisões. Isto não significa que paralisemos ou que deixemos de decidir. Ainda ontem, entregámos à Ordem dos Advogados um projeto de decisão sobre a reforma dos honorários e da classificação dos atos para efeitos de defesas oficiosas. A Ordem decidiu, já depois de termos definido este calendário, enveredar por uma forma de luta não característica de uma ordem profissional, e em nada construtiva. Não paralisámos. O minucioso trabalho de casa foi feito. Fizemos cálculos, comparámos montantes, revimos todos os atos, olhando à sua complexidade, atendemos à procura e às necessidades dos cidadãos a quem o Estado garante apoio judiciário”, disse ainda a titular da pasta da Justiça, em Vila Real.

Da parte da OA, houve tentativas de marcação de reuniões com a senhora ministra da Justiça, mas sem resposta do Governo. Bem como foi pedido que, dias antes da reunião realizada esta quarta-feira, fosse entregue o relatório à OA, mas também sem sucesso.

Assim, estiveram presentes em representação da Ordem, na apresentação do Relatório do Grupo de Trabalho, o vogal do Conselho Geral, Alberto Barreiros, o Chefe de Serviços do Gabinete Jurídico, Pedro Benodis Silva e Cláudia Pincho.

Da parte do Ministério da Justiça, o ECO/Advocatus sabe que Rita Alarcão Júdice, advogada de profissão, prefere delegar estas matérias relativas a advogados na SEAJ. Acompanha, mas delega a decisão na secretária de Estado desde que tomou posse.

“A OA considera que a proposta apresentada pelo Ministério da Justiça não vai ao encontro aquelas que são as pretensões dos profissionais e, desse modo, considera-a insuficiente. Tendo em conta que esta foi uma reunião técnica onde o Ministério da Justiça apresentou a sua proposta e que a OA tentou antecipar para que contasse com a presença da Ministra da Justiça, a OA fez-se representar por uma delegação que recebeu a proposta do Ministério da Justiça e foi informada da inclusão da OA no Grupo de Trabalho que irá negociar esta revisão. Esta proposta não foi partilhada de forma antecipada com a OA para que a mesma pudesse ser analisada e discutida de forma prévia, o que permitiria acelerar o processo de atualização da tabela aplicável ao sistema de acesso ao direito”, segundo explicou a OA em comunicado, divulgado na quarta-feira.

Assim, “mesmo levando em conta que este processo já poderia estar mais adiantado do que se encontra neste momento, a OA aguarda com expectativa o início deste processo negocial e continua disponível para prosseguir este caminho de negociação, que deverá, naturalmente, ser acompanhado com a presença da Ministra da Justiça. No âmbito deste processo de negociação, a OA considera que o mesmo deverá ser completo e integrar a discussão da revogação da portaria que retira à OA a competência exclusiva de composição das escalas de advogados para integrar o Sistema de Acesso ao Direito e Tribunais (SADT). A OA não aceita que a escolha dos Advogados seja efetuada pelo MP/Juiz/OPC sem qualquer critério objetivo ou conhecido, em manifesta violação dos mais basilares direitos de defesa dos cidadãos. Esta portaria coloca em causa todo o processo e deve ser revogada, tendo em conta a sua ilegalidade”, concluiu o mesmo comunicado.

O Grupo de Trabalho criado pelo Governo para o que chama de Reforma do Sistema de Remuneração dos Advogados Oficiosos propõe a revisão dos honorários fixados há 20 anos, uma nova classificação e listagem dos atos praticados por advogados oficiosos, para efeitos de fixação de honorários e alargar os atos praticados a processos de arbitragem, processos em Julgados de Paz e em processos de mediação extrajudicial concluídos com acordo entre as partes. Mais: a remuneração atribuída a cada ato passa a depender da complexidade jurídica e do volume presumido das horas trabalhadas, valorizando-se igualmente os atos mais solicitados. O Ministério da Justiça espera tomar uma decisão “a breve prazo, depois de ouvida a Ordem dos Advogados e recolhidos contributos de outros interessados”, segundo comunicado do Ministério da Justiça.

O relatório apresenta ainda a criação de um “sistema de controlo de qualidade do serviço prestado pelos advogados oficiosos”, a realização de inquéritos de satisfação aos beneficiários, uma revisão ampla do sistema de registo e pagamento de despesas e ainda a exigência de certidão de não dívidas ao Estado (Fisco e Segurança Social) como condição de inscrição nas escalas das defesas oficiosas.

A bastonária da Ordem dos Advogados exigiu, na semana passada, a demissão da Secretária de Estado Adjunta e da Justiça, Maria Clara Figueiredo, “que foi a interlocutora da Ordem dos Advogados para os assuntos da Justiça, e com quem nunca se dignou sequer a debater esta solução (nem sequer informá-la)”, diz Fernanda de Almeida Pinheiro.

Em causa a portaria para ser publicada com “carácter de urgência” que altera o Sistema de Acesso ao Direito e aos Tribunais (SADT), passando agora a prever-se a possibilidade de o Tribunal, o Ministério Público ou os Órgãos de Polícia Criminal (como a PJ ou Autoridade Tributária) nomearem qualquer advogado oficioso que, sendo contactado, se manifeste disponível para aceitar a nomeação em caso de falhas nas escalas definidas. Esta alteração surge no decorrer do protesto da Ordem dos Advogados que teve início a 1 de setembro.

Desde setembro que a Ordem dos Advogados (OA) apelou à não inscrição de advogados nas escalas do SADT. O SADT é o sistema que permite que os cidadãos com menor poder económico tenham acesso aos tribunais para defender os seus direitos, uma vez que a justiça não pode ser negada a ninguém. Desta forma, foi criado um sistema sustentado pelo Estado que paga a advogados, os chamados advogados oficiosos, para defender estes tipos de casos.

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