Apesar de 2024 estar a ser um ano “extraordinário” para os PPR, 89% destes produtos apresentam um desempenho muito abaixo da inflação e dos Certificados de Aforro a três, cinco e dez anos.
Com o aproximar do final do ano chegam também as tradicionais campanhas de comercialização por parte de bancos e seguradoras dos Planos Poupança-Reforma (PRR) junto das famílias. No entanto, este ano a história tem sido contada de maneira diferente.
Pela primeira vez em muito tempo, os PPR estão a ser publicitados pelas rendibilidades alcançadas no último ano e não exclusivamente pelo benefício fiscal que estes produtos oferecem. Isso deve-se a 2024 estar a ser um ano prolífero para a generalidade destes produtos, quer sigam uma estratégia de investimento mais ou menos conservadora. Isso é visível pela rendibilidade média de 7,5% alcançada desde janeiro pelos 161 PPR analisados pelo ECO que se encontram em comercialização pelos bancos, sociedades gestoras e pelas dez maiores seguradoras do mercado.
Este marco é deveras significativo quando, nos últimos três anos, os PPR não foram além de uma rendibilidade anualizada de 1,3%, e nos últimos cinco e dez anos ficaram-se por um desempenho abaixo dos 2%, apresentando constantemente um desempenho abaixo da taxa de inflação, medida pelo Índice de Preços no Consumidor.
Nos últimos cinco anos, apenas 15% dos PPR foram capazes de bater o seu índice de referência, com 74% dos produtos a alcançar uma rendibilidade anualizada nominal abaixo dos 2%.
Mas o desempenho positivo alcançado em 2024 pela generalidade dos PPR esconde uma realidade menos animadora. Apenas um quinto dos planos poupança analisados pelo ECO conseguiu bater o seu índice de referência este ano, segundo dados recolhidos junto da plataforma Refinitiv/Lipper. Ou seja, em 2024, apenas um em quatro PPR conseguiu bater o seu benchmark. E alargando o horizonte de análise, o cenário não melhora. Pelo contrário.
Nos últimos cinco anos, apenas 15% dos PPR foram capazes de bater o seu índice de referência, com 74% dos produtos a alcançar uma rendibilidade anualizada nominal abaixo dos 2%. Trata-se de um desempenho inferior ao alcançado pelos Certificados de Aforro no mesmo período. Mas não só. Segundo cálculos do ECO, 89% dos PPR apresentou um desempenho abaixo da taxa de inflação entre 2019 e 2024, que neste período se fixou nos 3,1% por ano. Significa que a maioria dos investidores que aplicou as suas poupanças em PPR ao longo dos últimos cinco anos perdeu poder de compra.
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Este fraco desempenho não tem passado ao lado dos investidores, que desde 2019 têm reduzido a aposta nestes planos de poupança para a reforma. Só nos últimos dois anos, o montante de subscrições anuais caiu 53%, alcançando 1.725 milhões de euros no final do ano passado, menos de metade da média registada nos cinco anos anteriores.
O mais recente relatório do setor segurador e dos fundos de pensões da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF) revela também que 2023 foi o segundo ano consecutivo de correção do património dos PPR, atingindo o valor mais baixo desde 2017. Segundo dados da ASF, no final do ano passado a indústria de PPR agregava pouco mais de 17 mil milhões de euros de ativos sob gestão. Há cinco anos, em 2019, os PPR concentravam mais de 21,5 mil milhões de euros.
O mau desempenho da generalidade dos PPR não é algo novo. Entre 1990 e 2009, as duas primeiras décadas de vida dos PPR, a rendibilidade média real dos 613 PPR ativos no mercado nessa altura foi de 1,54% por ano, segundo contas de Joaquim Madrinha e David Almas no livro “Como Salvar a Minha Reforma“. Nesse mesmo período, a rendibilidade real dos Certificados de Aforro, um produto financeiro de poupança de risco virtualmente nulo por ser garantido pelo Estado, foi de 1,82%.
O mesmo quadro nebuloso é também revelado recentemente num estudo da sociedade gestora Casa de Investimentos, que, com base em 2.683 transferências de PPR recebidas de outras instituições financeiras entre janeiro de 2021 e setembro de 2024, aponta para que cerca de um em cada três PPR tenha perdido dinheiro num horizonte até 20 anos.
Ser conservador sai caro na carteira dos investidores
É reconhecida a aversão ao risco por parte dos portugueses. Isso é visível pela excessiva alocação da riqueza das famílias em depósitos bancários, que no final de 2023 concentravam mais de 73% do património financeiro, segundo os dados mais recentes do Banco de Portugal. Mas é também visível no universo de PPR.
Atualmente, mais de um terço dos PPR em comercialização são classificados como produtos de classe de risco baixo ou muito baixo, apresentando assim uma carteira com pouca ou mesmo nenhuma exposição a ações, em contraste com uma forte alocação a obrigações soberanas de curto prazo e depósitos bancários. São por isso produtos nada orientados para o longo prazo, chocando assim com a natureza dos PPR, que “devem” ser produtos desenhados para construir um complemento de reforma quando os “Anos Dourados” baterem à porta. E, por isso, são também os PPR com os piores desempenhos.
Nos últimos cinco anos, por exemplo, os PPR “menos arriscados” alcançaram uma rendibilidade anualizada abaixo de 1%, alcançando assim um desempenho inferior à taxa de inflação (3,1%) e longe dos 2,91% oferecidos pelos Certificados de Aforro. Já os PPR com uma classe de risco “média” ou “alta” alcançaram uma rendibilidade anualizada 5,1% neste período. A mesma conclusão é retirada num horizonte de dez ou mais anos.
O benefício fiscal médio alcançado pelos subscritores de PPR ao longo dos últimos 10 anos foi de apenas 2,2% do valor investido, em vez dos 20% permitidos por lei.
É por isso que entre os 161 PPR analisados se destacam tão poucos produtos. É o caso do Save & Grow PPR (que anteriormente era denominado de Casa Global Value PPR), gerido por Emília Vieira, da Casa de Investimentos, que pode ter uma alocação do portefólio de até 100% em ações, e que não só foi o PPR e o fundo nacional mais rentável de 2023, com um ganho de 33,9%, como este ano acumula uma valorização de 25% até 16 de dezembro (o segundo melhor do mercado) e contabiliza uma rendibilidade anualizada de 8,4% nos últimos três anos (o mais rentável do mercado).
O mesmo sucede com o BPI Reforma Global Equities PPR/OICVM, que investe até 100% em ações. Lançado a 7 de novembro de 2019, este fundo do BPI Gestão de Ativos regista até 16 de dezembro uma valorização de 17,6% e uma rendibilidade anualizada de 8,6% no último quinquénio — cinco vezes mais que o desempenho médio dos PPR.
Igualmente destacado da maioria da oferta de PPR surge também o fundo de pensões aberto BBVA Estrategia Investimento PPR A. Por conta de uma exposição do portefólio acima dos 50% em ações, este PPR contabiliza uma rendibilidade anualizada superior a 5% no último triénio e quinquénio, e 4,2% ao longo da última década.
Apenas o histórico Alves Ribeiro PPR/OICVM (também conhecido por Invest AR PPR) — criado em novembro de 2001 — se aproxima da sustentabilidade dos ganhos do PPR da sociedade BBVA Fundos. Apesar de nos últimos dez anos o fundo gerido por Paulo Monteiro registar uma rendibilidade anualizada de 5,5%, nos anos mais recentes tem ficado aquém dos seus pares, alcançando um desempenho anual abaixo dos 2,5% a três e cinco anos.
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A ilusão do benefício fiscal à entrada
Os subscritores de PPR raramente realizam somente um investimento ou um reforço para lá do investimento inicial. Ano após ano, atraídos pelo chamariz fiscal à entrada — num montante equivalente a 20% do valor investido até um máximo de 400 euros, variando consoante a idade do investidor –, canalizam disciplinarmente uma parcela das suas poupanças em reforços mensais ou de um só vez para atingirem o “máximo” de investimento que lhes permita maximizar o efeito fiscal. Porém, os dados mais recentes das Finanças mostram que este benefício é uma miragem para a maioria dos investidores.
Segundo cálculos do ECO com base nas estatísticas de IRS da Autoridade Tributária e Aduaneira, o benefício fiscal médio alcançado pelos subscritores de PPR ao longo dos últimos dez anos foi de apenas 2,2% do valor investido, em vez dos 20% são permitidos por lei.
Significa que um investidor com menos de 35 anos, em vez de ter alcançado um benefício fiscal de 400 euros como está estabelecido por lei, terá obtido, em média, um benefício fiscal em sede de IRS num montante inferior a 45 euros através do investimento de 2.000 euros por ano entre 2013 e 2022. É muito pouco.
Mesmo só considerando os últimos dados disponíveis, referentes a 2022 — ano em que o Estado concedeu 88 milhões de euros em benefícios fiscais aos cerca de 440 mil agregados familiares com deduções de PPR neste período por conta da aplicação global de 3.174 milhões de euros –, a taxa efetiva do benefício fiscal ficou-se nos 4,2%, que se traduz num benefício fiscal inferior a 180 euros por agregado familiar, e assumindo que a maioria declarou o investimento em PPR.
Isto sucede porque o benefício fiscal conferido pelo investimento em PPR concorre com outros, como a dedução à coleta por dependentes ou a dedução por despesas de saúde. Assim, nem todos os investidores conseguem usufruir do “bónus” máximo que tem vindo a minguar desde que os PPR foram lançados em 1989 – no primeiro ano dos PPR era possível deduzir ao rendimento coletável o montante aplicado até 500 contos (2.494 euros), desde que não se ultrapassasse 20% do rendimento bruto.
O tempo é o maior aliado dos investidores porque permite anular perdas momentâneas a potenciar os ganhos ao longo do ano. E a melhor forma de tirar partido do tempo é procurar um PPR com uma forte alocação a ações por serem o ativo que mais rende no longo prazo.
No entanto, os PPR têm um segundo trunfo fiscal: o resgate dentro das condições legais beneficia de uma taxa de apenas 8% sobre as mais-valias, contrastando com os 28% aplicados à maioria dos produtos financeiros.
Mesmo fora destas condições, os PPR mantêm vantagem fiscal. A tributação decresce com o tempo de investimento, variando de 21,5% para aplicações até cinco anos, a um mínimo de 8,6% após oito anos. Contudo, é crucial notar que resgates prematuros podem resultar na devolução do benefício fiscal inicial, acrescido de uma penalização de 10% por ano decorrido.
Mas será que a vantagem fiscal à saída conferida pelos PPR justifica o investimento nestes produtos? Tomando por base a última década, verifica-se que os PPR apresentaram uma rendibilidade anualizada média bruta de 1,6%. No mesmo período, um investimento feito em Certificados de Aforro produziu uma rendibilidade anualizada líquida de 4,2%.
Como encontrar uma agulha num palheiro
Os PPR continuam a ser dos produtos financeiros preferidos dos portugueses, apesar do parco desempenho da generalidade dos produtos e do benefício fiscal gerado com o seu investimento ficar aquém das expectativas dos investidores.
Isto significa que entre as centenas de PPR há disposição no mercado — que se estende para lá dos 161 analisados pelo ECO, porque há muitos mais que já não permitem subscrições — é muito provável que a vasta maioria dos atuais subscritores de PPR sejam titulares de um produto medíocre. As boas notícias é que não há razões para desesperar, porque há sempre a possibilidade de transferir o investimento realizado ao longo dos anos para um PPR mais promissor — que é uma operação surpreendentemente simples, sem custos e sem perda da benesse fiscal amealhada ao longo dos anos.
Entre a vasta oferta de PPR no mercado, a tarefa de escolher o melhor plano de poupança reforma pode parecer uma tarefa herculana, mas não é. O ponto essencial dessa busca passa, desde logo, por olhar para lá dos incentivos fiscais (simplesmente porque essa é uma benesse oferecida por todos de igual forma) e depois focar a atenção em fatores mais determinantes para o sucesso do investimento a longo prazo, como o desempenho histórico, as comissões, a filosofia de investimento e, não menos importante, a transparência do produto.
- Apostar em maratonistas e não em sprinters. Um PPR que renda 10% num ano pode parecer muito bom, mas se nos últimos três ou cinco anos rendeu menos de 1% por ano (algo que não é difícil de vislumbrar na oferta atual de PPR), a opinião muda drasticamente. A consistência é a palavra-chave na procura de um produto capaz de gerar um complemento de reforma sólido.
- Quanto mais barato melhor: Evitar PPR com comissão de subscrição e resgate é só um ponto de partida — algo que não é fácil de encontrar no universo dos PPR sob a forma de seguros. Vários estudos académicos apontam para que, numa estratégia de longo prazo, as comissões sejam um elemento diferenciador entre dois produtos semelhantes, notando que, quanto mais barato um produto for, melhor será o seu desempenho no longo prazo.
- Ser conservador não compensa: O tempo é o maior aliado dos investidores porque permite anular perdas momentâneas a potenciar os ganhos ao longo do ano. E a melhor forma de tirar partido do tempo é procurar um PPR com uma forte alocação a ações por serem o ativo que mais rende no longo prazo, como mostram vários estudos, como o promovido há vários anos pelos economistas Elroy Dimson, Paul Marsh e Mike Staunton (agora para o UBS), e mesmo os dados históricos dos PPR, em que os planos “mais arriscados” são justamente os que têm oferecido retornos maiores.
- Transparência total: é um indicador crucial da qualidade e confiabilidade de qualquer produto, inclusive de um PPR. Um gestor que não tem nada a esconder, não esconde nada. Isso traduz-se numa comunicação constante com os subscritores através de relatórios mensais, trimestrais e anuais. E isso passa também por a sociedade gestora do PPR ter sempre informação atualizada do produto no seu site e estar disponível para esclarecer as dúvidas dos investidores.
Nota: Nenhuns dos produtos assinalados no texto traduzem-se em recomendações de investimento. Este texto não dispensa a consulta da informação oficial dos produtos financeiros identificados e nunca é demais lembrar que rendibilidades passadas não são garantia de rendibilidades futuras.
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Os PPR continuam a ser incapazes de bater os Certificados de Aforro. Mas há (poucas) exceções
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