Ricardo Salgado: “Banco de Portugal provocou o colapso e os lesados do BES”
Antigo presidente do BES diz que Carlos Costa recusou duas operações de recapitalização do banco antes de proceder à sua liquidação. E diz que a imposição de provisões de dois mil milhões foi ilegal.
Ricardo Salgado, antigo presidente do Banco Espírito Santo (BES), acusa Carlos Costa e o Banco de Portugal de terem causado a derrocada do banco que liderava e, por conseguinte, prejudicado alguns dos clientes da instituição que perderam investimentos realizados no grupo. Revela que por duas vezes propôs operações de recapitalização do BES que foram rejeitadas e assegura que a constituição de provisões de dois mil milhões de euros, que “serviram para matar o BES”, foi ilegalmente imposta pelo supervisor.
“O Banco de Portugal provocou o colapso e os lesados do BES”, declarou Salgado em entrevista ao Dinheiro Vivo (acesso livre). “A resolução era perfeitamente evitável. Sei que hoje, passados três anos, já não sou o único a pensar assim”, assegura o antigo banqueiro. No próximo dia 3 de agosto completam-se três anos da medida de resolução aplicada ao BES pelo Banco de Portugal e que dividiu a instituição no banco bom (o Novo Banco) e o banco mau, que passou a reunir os ativos tóxicos do ex-BES.
Para o antigo banqueiro, por duas vezes levou uma solução de recapitalização ao Banco de Portugal, a 11 de julho e a 16 de julho, antes da liquidação do BES. Por que é que Carlos Costa rejeitou? “É inexplicável, só o Banco de Portugal poderá explicar”, disse, contando que uma das operações contava com um investidor conhecido e que “está a tomar posições significativas numa das maiores empresas europeias, a Nestlé“, Daniel Loeb.
“O argumento principal para ter sido desencadeada a resolução, de não haver capital disponível em 48 horas antes do final de julho, é falso. Este argumento foi dado pelo Banco de Portugal. Pôs uma espada em cima da cabeça do Vítor Bento, ou seja, que tinha de encontrar uma solução de recapitalização. Mas o governo não diz nada a respeito de ter recusado duas recapitalizações anteriores. O Banco de Portugal rejeitou pelo menos duas hipóteses, uma a 11 de julho e outra a 16 de julho. Eu saí do banco a 13”, argumentou.
"Pôs uma espada em cima da cabeça do Vítor Bento, ou seja, que tinha de encontrar uma solução de recapitalização. Mas o governo não diz nada a respeito de ter recusado duas recapitalizações anteriores. O Banco de Portugal rejeitou pelo menos duas hipóteses, uma a 11 de julho e outra a 16 de julho. Eu saí do banco a 13.”
Lembrou que o governador nem sequer recebeu esses investidores e “eles pegaram nas malas e voltaram imediatamente para Londres“. “Um deles, o Third Point LLC, liderado por Daniel Loeb, foi ao Banco de Portugal dizer que estava interessado em recapitalizar o banco e não lhe responderam. Foi recebido, julgo eu, pela supervisão. Aliás, vi uma desconsideração em relação a este fundo feita por um dos membros da supervisão e até pelo governador. Só queria recordar que este Daniel Loeb é hoje o homem que está a tomar posições significativas numa das maiores empresas europeias, a Nestlé”, conta.
“Provisões de dois mil milhões ilegais”
Para lá de ter rejeitado duas operações de recapitalização, Ricardo Salgado considera que a atuação do Banco de Portugal no caso BES “foi a ainda pior” quanto a 23 de julho “forçou a constituição de dois mil milhões de provisões ilegais que não observavam o regime do IAS 37 e que quebraram os rácios de solvências para um nível abaixo do requerimento pelo Banco Central Europeu (BCE)”.
Após a liquidação do BES, “já no Novo Banco, o mesmo regulador determinou a reversão de cerca de mil milhões de euros dessas provisões, as mesmas que rapidamente se compreendeu que eram absolutamente desproporcionadas e que serviram para matar o BES, sem garantir o reembolso dos clientes para que, alegadamente, tinham sido constituídas”.
“Foi isso que destruiu o nível de capitalização do BES abaixo dos níveis de solvência e que deu o argumento ao Banco de Portugal para haver um corte nos apoios de liquidez do BCE ao BES. O que defendo é que quem prejudicou os lesados do BES não foi a administração do banco. A administração do BES ficou sujeita a uma resolução, por causa das provisões ilegais que referi, e a seguir essas provisões não foram usadas para reembolsar os lesados do BES”, declarou.
"O que defendo é que quem prejudicou os lesados do BES não foi a administração do banco. A administração do BES ficou sujeita a uma resolução, por causa das provisões ilegais que referi, e a seguir essas provisões não foram usadas para reembolsar os lesados do BES.”
O antigo banqueiro, que se encontra a escrever as suas memórias das quais resultará um livro que pretende que seja publicado até final do ano disse que “oportunamente sairá a demonstração de que estas provisões eram ilegais”.
Críticas a Passos
Salgado deixou ainda críticas ao Governo de Passos Coelho, considerando que outro executivo teria evitado a resolução de um banco com a dimensão do BES. “Qualquer outro governo com o mínimo de responsabilidade e sem intuitos populistas teria evitado a resolução de um banco com a dimensão do BES. Não houve até hoje na Europa nenhuma resolução de um banco que tivesse 20% de quota de mercado, que representasse 27% das operações com as PME, tinha 30% no financiamento do comércio internacional… e dois milhões de clientes”, frisou.
Mas um governo do PS teria evitado esse colapso? “Qualquer outro governo. Eu não sou político, embora me quisessem colar a uma certa política do último governo do PS…”, disse
(Notícia atualizada às 11h09)
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