Patrões podem ler emails dos funcionários? Sim, se avisarem
A decisão partiu do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, que ratificou a medida que permite que os patrões tenham acesso ao correio electrónico dos seus empregados.
O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos de Estrasburgo autoriza que durante o horário laboral, patrões possam ler emails, bem como mensagens trocadas via Whatsapp, Facebook Messenger e Telegram dos seus funcionários, desde que a monitorização seja anunciada antecipadamente e plausivelmente justificada. O anúncio surge esta terça-feira, após o mesmo tribunal ter decidido proteger o romeno Bogdan Mihai Bărbulescu, cujas comunicações foram vigiadas sem aviso prévio.
O caso remonta a julho de 2007, altura em que Bogdan Bărbulescu foi despedido da empresa para a qual trabalhava sob o argumento de utilizar as ferramentas de trabalho para uso pessoal. A decisão da empresa surgiu após a leitura das suas comunicações via Yahoo Messenger terem sido vigiadas pelo seu patrão. A empresa reuniu um conjunto de transcrições onde constam as comunicações de Bărbulescu entre 5 e 12 de julho. No documento de 45 páginas constam mensagens trocadas entre o empregado e o seu irmão e a sua noiva.
Bărbulescu levou a situação às instâncias nacionais, tentando provar que a decisão tomada pela empresa para qual trabalhava era nula e que esta violava o seu direito à correspondência. Em dezembro de 2007, o Tribunal de Bucareste rejeitou a queixa, sob o argumento de que a empresa cumpriu com os processos de despedimento previstos no Código de Trabalho, o mesmo que prevê que os empregadores possam estipular a forma como a Internet deve ser utilizada no local de trabalho. As mesmas instâncias defendem que Bărbulescu havia tomado conhecimento dessas condições.
O arguente recorreu da decisão junto do Tribunal da Relação, cuja decisão final, tomada em junho de 2008, confirmou as conclusões de Bucareste. O tribunal afirmou que a conduta do empregador fora razoável, uma vez que Bărbulescu e os seus colegas teriam sido informados de que os recursos da companhia não deveriam ser utilizados em benefício pessoal, e que a monitorização das mensagens privadas pela empresa seria a única forma de provar a má conduta do empregado.
"As regras de um empregador não podem reduzir a nada a vida social privada no local de trabalho. O direito a respeitar a vida privada e a privacidade da correspondência continua a existir, mesmo que tenham de ser restringidos tanto quanto necessário.”
As instâncias romenas, no entanto, ignoraram se Bărbulescu teria sido avisado previamente sobre a possibilidade das suas comunicações poderem ser monitorizadas e sobre quais as razões para tal controlo. Segundo a Organização Internacional do Trabalho e o Comité do Conselho de Ministros da Europa em matérias de proteção dos trabalhadores, para que o aviso dos empregadores seja considerado “válido”, este terá de ser feito antes do início de qualquer processo de monitorização, em especial no que toca ao conteúdo das comunicações privadas dos funcionários.
O caso chegou ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos em dezembro do mesmo ano. Bogdan Bărbulescu recorreu ao Artigo 8º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que prevê o direito ao respeito pela vida privada e familiar. Bărbulescu argumentou que o seu despedimento teria tido por base uma violação da sua privacidade e que as instâncias nacionais teriam falhado em proteger o seu direito à vida privada. Em janeiro de 2016, a câmara do tribunal votou com seis votos contra um de que tal artigo não teria sido violado, e que os tribunais romenos teriam tido em igual conta o direito ao respeito pela vida privada de Bărbulescu e os interesses do empregador, que levara a cabo uma monitorização razoável, dentro dos procedimentos disciplinares.
“As regras de um empregador não podem reduzir a nada a vida social privada no local de trabalho. O direito a respeitar a vida privada e a privacidade da correspondência continua a existir, mesmo que tenham de ser restringidos tanto quanto necessário”, pode ler-se em comunicado.
Perante a decisão, Bărbulescu avançou para a grande câmara do mesmo tribunal, composta do 17 juízes. O tribunal provou então a aplicabilidade do Artigo 8º no caso. Embora seja questionável a conceção de “vida privada” dentro dos limites impostos e comunicados pelo empregador, a vida social dos funcionários não deve ser totalmente reduzida.
Além disso, a mesma instância afirma que os tribunais romenos não consideraram o alcance da monitorização das comunicações e o nível de intrusão na vida privada de Bărbulescu, assim como a existência de razões legítimas que justifiquem a conduta do empregador em causa. Os mesmos tribunais foram ainda acusados de não terem analisado se, para o mesmo propósito, a empresa poderia ter recorrido a meios menos intrusivos.
(Notícia atualizada às 10h55 com mais informação)
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