Os maiores fantasmas para quem compra dívida nacional, segundo o BPI
Orçamento, DBRS, BCE e banca: são estas as razões pelas quais muitos investidores que compram dívida portuguesa estão assustados.
Pesadelos, pesadelos e mais pesadelos. Não deve haver muitos investidores da dívida nacional a passar bem as noites por esta altura. O Orçamento do Estado para 2017 começa a ser agora discutido. E na sexta-feira a DBRS revela a sua sentença em relação ao grau de investimento das obrigações portuguesas, condição determinante para saber se Portugal continua ou não no radar do Banco Central Europeu (BCE). O banco central é, de resto, outro fantasma para os mercados. Assim como a banca portuguesa, em particular a Caixa Geral de Depósitos e o malparado.
Conheça as razões que estão a assustar os investidores e a tornar o custo de financiamento de Portugal mais elevado do que seria de esperar, segundo uma nota de análise do Departamento de Estudos Económicos e Financeiros do BPI.
1. DBRS e Orçamento
São fatores de curto-prazo que a analista do BPI Teresa Gil Pinheiro acredita que serão dissipados até final do ano. A decisão de rating da DBRS em relação a Portugal e a aprovação do Orçamento do Estado para 2017 são fatores que estão a condicionar os juros que os investidores exigem para comprar dívida portuguesa no mercado secundário.
No caso da agência canadiana, o BPI lembra que é a DBRS quem mantém as obrigações nacionais no radar das compras do Banco Central Europeu (BCE). No final desta semana, irá atualizar o rating ‘BBB (low)’, um grau que considera a dívida nacional na categoria de investimento, essencial para ser elegível para o programa de compras de ativos públicos do banco central (PSPP, na sigla inglesa). “Há alguma incerteza, com uma pequena probabilidade de o outlook ser revisto em baixa para negativo”, diz o BPI. “De facto, quando se analisa as contas públicas portuguesas, não há sinal aparente de qualquer deterioração do risco, tornando um downgrade do rating improvável”, reforça.
Sobre o Orçamento do Estado, o analista do banco assume uma expectativa de que o impacto na perceção de risco de Portugal é baixo, “em face do continuado compromisso das autoridades com as regras orçamentais europeias, apesar de algum alívio nos esforços de consolidação”.
2. Redução de estímulos do BCE
Também a incerteza em relação ao prolongamento (ou não) dos estímulos da parte da autoridade monetária da Zona Euro dá pouco conforto aos investidores internacionais.
Embora Portugal tenha as suas necessidades de financiamento praticamente satisfeitas para 2016, o montante para 2017 ascende a 15 mil milhões de euros (excluindo o ‘rollover de bilhetes do Tesouro). “O custo destas obrigações irá depender do programa de compra de ativos no setor público do BCE“, refere o BPI, que lembra que o ritmo de aquisição de obrigações nacionais por parte do banco central tem vindo a reduzir-se nos meses mais recentes. No total, são cerca de quatro mil milhões de euros em dívida que continuam elegíveis para o programa, estima o BPI, o que corresponde a apenas um terço do total de dívida que terá de emitir em 2017. “Isto vai adicionar alguma pressão sobre os custos ao longo de 2017″.
“Considerando que i) o programa do BCE termina no final de março de 2017, ii) o IGCP pretende emitir cerca de dois mil milhões em obrigações de médio e longo prazo até final do ano e iii) assumindo as necessidades de financiamento estarão distribuídas de forma equilibrada ao longo do ano, é razoável considerar que o apoio do BCE vai continuar a desempenhar um papel relevante no alcance das necessidades de financiamento”, salienta Teresa Gil Pinheiro, projetando um cenário de antecipação de algumas emissões para os três primeiros meses de 2017: “As necessidades de financiamento rondarão os 5,8 mil milhões no primeiro trimestre, ligeiramente acima do montante ainda elegível para o PSPP. Assim, o Tesouro poderá antecipar parte das suas necessidades para o primeiro trimestre“.
"As necessidades de financiamento rondarão os 5,8 mil milhões no primeiro trimestre de 2017, ligeiramente acima do montante ainda elegível para o PSPP. Assim, o Tesouro poderá antecipar parte das suas necessidades para o primeiro trimestre.”
Recordando uma estimativa do Banco de Portugal de dezembro de 2015, em que sugeria que, sem o plano do BCE, as yields portuguesas estariam 2,7 pontos percentuais mais altas do que na altura, a analista não tem dúvidas de que a forma como o BCE irá mudar o curso do seu programa será “importante para o comportamento futuro dos juros portugueses”.
Evolução da taxa de juro das obrigações a 10 anos nos últimos seis meses
3. Crescimento da dívida pública
A sustentabilidade da dívida nacional é outros dos pontos negativos quando se analisa a evolução do caso português. A este fator de pressão juntam-se outros dois: “as fragilidades que persistem no sistema bancário e o fraco crescimento económico preocupam as tendências [da dívida]”, diz o banco.
“O recente percurso seguido pela dívida pública portuguesa é relativamente negativo, com o rácio da dívida/PIB a subir para até 131,9% do PIB no segundo trimestre de 2016, 2,9 pontos percentuais do que nos dois trimestres antecedentes”, recorda Gil Pinheiro, antecipando riscos com CGD. O que pode correr mal com a operação de capitalização do banco público?
“O plano de recapitalização anunciado terá um montante de até 5,2 mil milhões de euros, implicando uma injeção de capital de 2,7 mil milhões pelo Estado, pesando na dívida pública. O plano inclui a emissão de dívida no montante de mil milhões de euros para investidores privados, o que é um risco adicional se a procura da parte dos investidores ficar aquém do planeado“, sublinha o BPI.
Ainda assim, o banco acredita que a tendência geral da dívida pública deverá continuar “sustentável, com algumas quedas de 2017 em diante” perante a “melhoria significativa das condições de estabilidade desde 2011”.
4. Fraqueza do setor financeiro
Por fim, o sistema bancário, cujas fragilidades persistentes deverão estar a pesar sobre o prémio de risco da dívida portuguesa, “tendo em conta os episódios recentes relacionados com a resolução de bancos domésticos e a necessidade de recapitalização da CGD”, diz a analista, alertando para os efeitos negativos que poderão advir da criação de um bad bank: “A criação de um bad bank poderá piorar as responsabilidades contingentes do Estado, um problema potencial que também deverá pesar na análise da dívida pública”.
O crédito malparado dos bancos portugueses também surge como fator problemático, que está a impedir o financiamento a setores da atividade económica mais rentáveis. “Esta situação limita a capacidade de crescimento da economia e expõe ainda mais a banca a choques adversos”, refere Teresa Gil Pinheiro.
Para fazer face ao aumento destes créditos com maior risco, está a ser estudada a criação de um banco mau, para onde seriam transferidos estes ativos tóxicos. À luz do enquadramento legal europeu, esta solução iria aumentar as responsabilidades contingentes do setor público, sem, contudo, ter impacto direto na dívida, explica a análise do BPI, contextualizando os potenciais custos desta solução citando Artigo IV do FMI: “O FMI estima que, no melhor cenário, o custo de provisionamento de 80% do malparado dos principais bancos rondariam os 3,5 mil milhões de euros (2% do PIB) em necessidades adicionais de capital”.
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