Trocar o crédito. O que pode ganhar com isso?
Transferir o crédito habitação de banco pode conduzir a poupanças substanciais, mas nem sempre. Saiba como tirar partido da estratégia de sedução dos bancos que dão regalias a quem mude o crédito.
Lembra-se quando há cerca de uma década, os bancos passaram da guerra de spreads no crédito à habitação ao roubo de clientes à concorrência? Pois a história repete-se. Depois de um ciclo que levou as taxas de juro dos empréstimos da casa até mínimos históricos, os bancos voltam-se para a estratégia de roubar clientes uns aos outros. Saiba como beneficiar com isso.
Numa altura que a oferta de spreads a partir de valores inferiores a 2% se tornou norma para a generalidade dos bancos que concedem crédito para a compra de casa, a estratégia de sedução de clientes passa agora pela oferta de regalias na transferência de empréstimos. A questão que se impõe é saber se mudar de banco faz sentido para si? A resposta é: depende.
Porquê falar agora em mudar de banco?
O Bankinter é o mais recente exemplo de aposta nesta estratégia de captação de clientes. Na semana passada, o banco que assumiu em abril deste ano os ativos de retalho do Barclays, em Portugal, lançou uma campanha que visa atrair clientes com crédito à habitação em outras instituições. O banco espanhol assume assim o rumo já assumido por outros bancos, onde se incluem o BIC, o Popular e o Deutsche Bank. Também a UCI, instituição financeira especialista na concessão de crédito à habitação através de profissionais do setor imobiliário, tem em campanha uma iniciativa de angariação de clientes pela via da transferência de outras instituições.
Os bancos voltaram à guerra dos spreads pois têm de conceder crédito aos seus clientes e optam pelos créditos com mais garantias. É uma altura boa para renegociar o contrato de crédito habitação quer no seu próprio banco quer pesquisando outras alternativas.
Se do ponto de vista dos bancos, angariar novos clientes por esta via é vantajoso, já que conseguem atingir rendibilidades mais elevadas, o que acontece em relação ao cliente? Terá vantagens em mudar o crédito à habitação para outro banco? João Morais Barbosa, administrador da Re, empresa especializada na intermediação de créditos, diz que, à partida, essa será uma boa opção. “Os spreads têm vindo a cair de forma expressiva. Os bancos voltaram à guerra dos spreads pois objetivamente têm de conceder crédito aos seus clientes e optam pelos créditos com mais garantias (e consequentemente menos risco), explica o especialista em finanças pessoais, acrescentando por isso que esta “é uma altura boa para renegociar o contrato de crédito habitação quer no seu próprio banco quer pesquisando outras alternativas“.
Contudo, nem sempre mudar de banco poderá conduzir a um spread mais baixo. “Depende muito de cada caso”, sublinha Filipe Garcia, CEO da IMF. “A maioria dos créditos à habitação está com spreads abaixo do que a banca pratica para novos contratos e, por isso, não valerá a pena tentar alterar”, diz a esse propósito o economista, salientando que “em princípio, para spreads abaixo de 1,75% não deverá valer a pena iniciar uma negociação”.
Depende muito de cada caso. A maioria dos créditos à habitação está com spread abaixo do que a banca pratica para novos contratos e, por isso, não valerá a pena tentar alterar.
Existem dez bancos a disponibilizar financiamento para a compra de casa com spreads a partir de valores inferiores a 2%, com o Bankinter a destacar-se com a oferta mais agressiva neste âmbito. O banco espanhol publicita uma margem mínima de spreads de 1,25%. Um pouco acima surge o Santander Totta, que cobra um prémio mínimo de 1,5%, logo seguido pelo Montepio Geral que tem um spread mínimo de 1,55%, e pelo Crédito Agrícola e BIC que aplicam spreads a partir de 1,65%. Na faixa dos 1,75% figuram a CGD, BCP, o Popular e o Novo Banco. O banco liderado por António Ramalho, foi aliás o que mais recentemente reviu em baixa a sua margem mínimo de spreads, no início de outubro. Já o BPI publicita uma margem mínima de 1,95%.
Os spreads que a banca está a oferecer
Isto significa que quem tiver contratado spreads inferiores a esses valores não conseguirá rever em baixa os encargos com o crédito à habitação por essa via. Neste universo estarão as famílias que aproveitaram as quase “borlas” dos bancos no período que antecedeu a crise financeira, altura em que conseguir um spread inferior a 0,5% era acessível a muitos. Mas esse tipo de negociação irá fazer sentido para aqueles portugueses que fizeram empréstimos para a compra de casa durante o pico da crise financeira.
Quanto poderá poupar?
O último pico das taxas de juro dos empréstimos para a compra da casa ocorreu na fase final de 2011, altura em que os bancos, perante as dificuldades de financiamento fecharam a torneira do crédito. A subida dos spreads foi um dos efeitos mais imediatos desse fecho de torneira. No pico do verão de 2011, a margem mínima dos spreads cobrados pelos bancos chegou a atingiu, em média, 3,5%. Hoje, a margem mínima exigida pelos bancos para financiar a compra de casa está em torno de um valor médio de 1,65%.
Juros implícitos na habitação nos últimos cinco anos
Assumindo o exemplo de um empréstimo de 100 mil euros indexado à Euribor a três meses, com um prazo de 30, que tenha sido contratado ao nível dos spreads mínimos em vigor em 2011, implicará um prestação mensal de 432 euros, atualmente. Quem conseguir renegociar um crédito com estas características para os níveis mínimos de spreads atuais, o encargo mensal encolhe para cerca de 338 euros. Ou seja, menos cerca de 100 euros por mês. Ao fim de 30 anos, a renegociação permite assim uma poupança potencial de quase 40 mil euros, partindo do pressuposto que a Euribor se mantém fixa. Trata-se de um grau de poupança aliciante.
Não olhar só para o spread
No entanto, as atenções não devem estar centradas apenas no spread. Filipe Garcia, aconselha a olhar também para o indexante que pode ter implicações na margem de poupança possível de alcançar. “Deve notar-se que nos novos contratos há muitas vezes a alteração de indexante (já nenhum banco admite Euribor abaixo dos 12 meses) e muitas vezes fazem-se exigências que podem ter impacto financeiro“, realça o economista. “Claro que cada caso é um caso, mas a análise deve sempre ser feita ‘all-in’ comparando os indexantes, comissões, seguros, etc”, complementa o CEO da IMF.
Cada caso é um caso, mas a análise deve sempre ser feita ‘all-in’ comparando os indexantes, comissões, seguros, etc.
Uma opinião partilhada por João Morais Barbosa. “Para que uma transferência faça sentido temos de conseguir poupar dinheiro depois de suportados todos os custos e prestações (crédito, seguros, etc). Por vezes, uma poupança de 50 euros por mês pode parecer pouco para tanta burocracia, mas estes 50 euros por mês durante 30 anos são 18 mil euros”, lembra o especialista em finanças pessoais.
De recordar que a transferência de um crédito à habitação exige, por exemplo, o pagamento de uma taxa de 0,5% do valor do crédito que é reembolsado, no caso dos empréstimos de taxa de juro variável. Se se tratarem de empréstimos de taxa de juro fixa, o custo é mais elevado: 2% do valor reembolsado. É por isso importante perceber se o “desconto” que é alcançado na renegociação do spread compensa assumir este encargo.
As vantagens que estão a ser oferecidas
Descontos ou mesmo a isenção dos custos de transferência do crédito ou prazos de carência de capital são os principais aliciantes que os bancos estão a oferecer para seduzir os clientes das outras instituições.
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Bankinter
O banco espanhol suporta os custos de transferência de crédito à habitação até 1,25% do capital transferido e não cobra comissão de prestação mensal.
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Banco Popular
Isenta os clientes da comissão de estudo, da comissão de gestão e dossier, comissão de avaliação e dos custos com a escritura e registos.
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Banco BIC
O banco promove uma redução de 50% na comissão de processo para clientes com idade entre os 18 e os 34 anos, ou para aqueles que disponham de Conta BIC Mais.
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Deutsche Bank
No banco germânico é possível beneficiar de carência de capital até 36 meses a quem transfira o crédito de outra instituição. Também é possível optar pela modalidade de valor residual até 35%, que é transferido para o final do prazo.
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UCI
A estratégia da UCI passa pela redução da comissão de abertura e pela devolução de 100% da comissão de avaliação.
Como saltar de banco?
Antes de avançar com uma transferência do crédito da casa, o cliente deve antes de mais contactar o seu banco para perceber se é possível rever em baixa o spread em vigor. Se o conseguir, esta é uma forma de evitar os custos financeiros inerentes à transferência do crédito para outra instituição. Caso tal não seja possível, a solução é avançar para outros bancos em busca de soluções menos dispendiosas, avaliando e comparando os custos totais inerentes. “A pesquisa e a negociação permitem reduzir todos os encargos mensais”, lembra João Morais Barbosa.
A pesquisa e a negociação permitem reduzir todos os encargos mensais.
Se dessa análise perceber que a transferência do empréstimo é a melhor solução, o que pode fazer com a ajuda de consultores especializados na prestação deste serviço, deve então contactar o banco onde tem o crédito para informá-lo de que pretende fazer essa mudança de banco. A instituição onde tem o empréstimo dispõe de dez dias para mandar a documentação do crédito ao banco escolhido. Depois de ter revisto toda a documentação, o banco manda uma oferta de crédito ao potencial novo cliente.
A importância que a renegociação pode ter
Segundo o inquérito à literacia financeira da população portuguesa divulgado no final da semana passada pelo Conselho Nacional de Supervisores Financeiros, os portugueses ainda continuam a olhar para o valor da prestação e não para o valor da taxa. Uma opção que poderá trazer muitos dissabores. Quem fez um crédito à habitação durante o pico máximo dos spreads (margem mínima média de 3,5%), em 2011, até poderá sentir-se confortável com o valor da prestação da casa que paga atualmente. No entanto, os indexantes usados neste tipo de empréstimos estão em mínimos históricos, mesmo negativos, o que constitui um alívio dos encargos mensais com a prestação. Contudo, basta que as Euribor caminhem para valores em torno de 1,5%, para que a taxa de juro final do empréstimo fique na ordem dos 5%, um valor próximo do máximo histórico atingido pelos indexantes no final de 2008, e que conduziu muitas famílias a dificuldades em cumprir com os seus compromissos com empréstimos.
Tentar aproveitar o atual rumo descendente dos spreads e as campanhas dos bancos, poderá ser uma boa oportunidade para prevenir futuras dificuldades e cumprir os compromissos com o crédito à habitação.
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