Pagámos ao FMI, e agora? Portugal entre recompras e emissões de muito longo prazo
O Governo já se livrou das taxas de mais de 4% do empréstimo do FMI. A taxa é, agora, residual. Daqui para a frente, o foco estará nas taxas altas no mercado. E na gestão do calendário de reembolsos.
Embora a tranche mais cara do empréstimo do Fundo Monetário Internacional (FMI) já tenha sido devolvida, num esforço do Governo para se livrar os elevados juros da dívida oficial o mais rapidamente possível, Portugal não deverá abrandar o ritmo na gestão do seu elevado endividamento público. Acelerar operações de recompra de dívida no mercado? É uma estratégia que faz sentido adotar a partir de agora, dizem os analistas ouvidos pelos ECO. Emitir títulos com prazos mais ambiciosos? Também.
Não foi propriamente uma surpresa quando o secretário de Estado Adjunto e das Finanças revelou esta segunda-feira a possibilidade de o Tesouro português avançar com uma emissão de obrigações com o prazo entre 20 a 30 anos. Ricardo Mourinho Félix dixit: “Transmitimos ao IGCP que estamos disponíveis para olhar para outras oportunidades em termos de emissão de obrigações de longo prazo (…). Podemos olhar para propostas concretas que os investidores possam ter, mas [20 a 30 anos] são o tipo de maturidades que outros países que estão muito longos [já emitiram e] isso é o tipo de coisas sobre as quais podemos”.
Para o analista chefe do Danske Bank, Jens Peter Sørensen, será uma boa jogada após Lisboa se ter livrado do spread extra de 400 pontos com a devolução de mais 800 milhões de euros ao FMI na semana passada.
“Na verdade, este segmento [dívida de muito longo prazo] está a observar bom apetite nos mercados periféricos como Espanha e Itália. É aqui que podemos encontrar financiamento realmente barato“, argumenta o especialista ao ECO.
Na verdade, este segmento [dívida de muito longo prazo] está a observar bom apetite nos mercados periféricos como Espanha e Itália. É aqui que podemos encontrar financiamento realmente barato.
Na mente de Sørensen estão as muito bem-sucedidas emissões de Itália e Espanha nas últimas semanas e que mostram como os investidores estão particularmente gulosos por dívida da periferia da Zona Euro. Por exemplo, no caso italiano, a oferta de nove mil milhões de euros em obrigações a 20 anos foi escassa para satisfazer pedidos que rondaram os 30 mil milhões de euros. Em Espanha, a emissão de uma nova linha de obrigações a dez anos, a pagar um cupão de 1,4%, atraiu ordens na casa dos 43 mil milhões de euros…
Contactados pelo ECO, tanto o Ministério das Finanças como o IGCP não comentaram em tempo útil sobre quais os próximos passos a seguir num caminho que não se fará apenas de oportunidades. Também há desafios.
Juro da dívida a dez anos continua abaixo dos 2%
Fonte: Reuters
Desde logo, há um relógio a contar em Frankfurt e Portugal (e os outros países) corre contra o tempo. Em setembro acaba o programa de compra de obrigações dos Governos da Zona Euro que tem ajudado a conter o risco dos países. E, assim terminado o quantitative easing, o Banco Central Europeu (BCE) vai começar paulatinamente a subir as taxas de juro.
Depois, há um calendário de reembolsos ao mercado exigente nos próximos cinco anos. Portugal enfrenta uma “parede” de dívida para devolver já em 2021, ano em que obrigações de cerca de 17 mil milhões de euros atingem a maturidade. No ano a seguir, expiram quase 14 mil milhões de euros em obrigações. São dois anos que vão exigir uma disponibilidade financeira significativa da parte do Governo.
Steen Jakobson, economista chefe do Saxobank, salienta que é uma “absoluta” necessidade de o IGCP proceder a um alisamento das necessidades de financiamento — isto é, olhando para o gráfico em baixo, aliviar os picos de reembolsos que Portugal terá de fazer entre 2021 e 2024.
“Com aquilo que o BCE tem em mente, apontando para 2019 ou 2020 um novo ciclo de subida das taxas de juro, Portugal tem todas as razões para começar a fazer uma gestão deste calendário de reembolsos“, diz o especialista.
Neste ponto, Jens Peter Sørensen sugere que se acelerem recompras de dívida, operações que vão ajudar Portugal a “empurrar” alguma desta dívida mais lá para a frente do horizonte temporal — no ano passado, o IGCP adiou em alguns anos o reembolso de um total de 1.500 milhões de euros em dívida que ia vencer entre 2017 e 2019.
“Talvez fazer substituições com uma nova linha de obrigações com maturidade em 2023 [a cinco anos], onde as taxas exigidas pelos investidores são mais baixas”, diz o analista chefe do Danske Banke.
Com aquilo que o BCE tem em mente, apontando para 2019 ou 2020 um novo ciclo de subida das taxas de juro, Portugal tem todas as razões para começar a fazer uma gestão deste calendário de reembolsos.
“Acho que um ponto de equilíbrio para Portugal seria este: por um lado, saber quanto é que o país consegue pedir emprestado a um preço justo e, considerando o exemplo de outros países e os ratings que foram recentemente atribuídos a Portugal, não me parece haver qualquer problema… por agora”, diz Steen Jakobson.
“Por outro, saber quanto é que o país vai precisar de dinheiro extra — e aqui a gestão da dívida torna-se uma questão política. Por exemplo, uma empresa com plano de investimento deverá levantar dinheiro para satisfazer esse plano de investimento e ter linhas em standby negociadas para o caso de ser preciso mais dinheiro”, acrescenta.
Em 2017, a gestão da dívida pública deu frutos: o custo médio da dívida baixou de 3,2% para 3%, o valor mais baixo da década. O objetivo para 2018 é o mesmo: continuar a embaratecer o endividamento público.
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