Empresa da família Mota tem nova aposta. É o vinho verde
Inês Mota, neta do fundador da Mota-Engil, lidera a Agrimota, braço da família para o setor dos vinhos. A par com o gestor André Estácio Pinto querem fazer da empresa um player de referência.
Costuma dizer-se que a terceira geração da família serve para delapidar património. No caso da família Mota, os acionistas maioritários da Mota-Engil, a terceira geração está por detrás de uma nova empresa que se ergue no mundo dos vinhos, a Agrimota.
“Foi a terceira geração que percebeu o potencial que estava aqui, entre as vinhas, as quintas e a Casa da Calçada”, conta Inês Mota, filha de António Mota, o chairman da Mota-Engil.
A verdade é que tudo começou lá atrás, quando Manuel António da Mota, o avô de Inês, sonhava com comprar a Casa da Calçada, construída durante o século XVI para ser um dos principais palácios do Conde de Redondo. O edifício de estilo barroco, onde durante as invasões francesas se instalaram os comandos aliados (ingleses e portugueses) viria no século XX a tornar-se ponto de encontro para políticos e intelectuais liderados pelo proprietário de então, António do Lago Cerqueira, um dos mais importantes líderes políticos da Primeira República.
Mas voltando aos Motas. Do sonho à compra foi um pequeno passo e, Manuel da Mota adquire a Casa da Calçada e o projeto de vinhos a ela associado. Estávamos na década de 60. O avô de Inês, que era um empreendedor, e que se lançara fortemente em Angola no setor da construção, com a Mota & Companhia, tinha também um carinho muito especial pela agricultura e pelo vinho. Um carinho que viria a dar lugar a 60 hectares de vinha. O vinho dizia, Manuel António da Mota, trazia-lhe amigos.
A Casa da Calçada, para onde a família Mota se viria a mudar, transforma-se anos mais tarde em hotel. Manuel António da Mota tinha já falecido (1995) mas a família cumpre o seu sonho e converte a casa num hotel, “abrindo os seus tesouros a quem souber apreciá-los”.
Inês, que hoje é presidente não executiva da Agrimota, diz que “este património é um mix de propriedades da avó e das compras que o avô fazia ao fim de semana, altura em que não estava no negócio da construção”.
De resto, André Estácio Pinto, o gestor executivo que toma as rédeas da Agrimota, diz que a empresa constituída recentemente foi beber de toda a história e know how do grupo. Só isso explica “este espírito visionário que resulta um pouco de toda a internacionalização do grupo, e onde fomos capazes de antecipar um pouco as tendências mundiais e trazer para Amarante algo que talvez não fizesse muito sentido: um hotel da cadeia Relais & Châteaux, numa clara antecipação do que se vive no setor e que é uma conjugação do vinho com hotelaria e restauração”.
Mas de que vinhos estamos a falar? De verdes, claro.
Amarante, a cidade onde nasce a Casa da Calçada e onde a Agrimota tem a sua sede, foi sempre um grande polo de produção agrícola e vitivinícola. Aliás, a região de vinhos verdes é uma oficialmente demarcada desde 1908.
A Agrimota, que detém a vinha mais antiga da região, produz vinhos verdes e, “mais recentemente, começámos também a fazer Douro”. A explicação é simples: a família detém uma quinta no Douro. “Historicamente, sempre vendemos as uvas mas desde que começámos nesta fase de redimensionamento da área de negócio, fez sentido incluirmos no portefólio um tinto da região do Douro”, adianta André Estácio Pinto.
O gestor salienta que, “embora o Douro seja uma região cara é também uma região que tem mais notoriedade e, portanto, faz sentido agregar um tinto no Douro, até porque o nosso posicionamento nos verdes é um posicionamento premium“.
Sobretudo vocacionados para o mercado de exportação, o vinho do Douro entra no mercado com a marca Lago Cerqueira. Estados Unidos, centro da Europa, Rússia, Reino Unido são alguns dos países em que já marca presença.
Hoje em dia, a Agrimota já produz mais de 100 mil litros no Douro, o que leva André Pinto a dizer que “não somos grandes mas também já não somos pequenos e faz sentido, em todos estes mercados em que estamos criar a diversificação do portefólio”. “Diria que o Douro vai chegar a todos o lado e, a seu tempo, também a Portugal”, refere o gestor.
"Diria que o Douro vai chegar a todos o lado e, a seu tempo, também a Portugal.”
Mas, se na categoria Douro produzem 100 mil litros, no Verde, a Agrimota produz entre 700 a 800 mil garrafas. As marcas dividem-se entre Lago Cerqueira e Calçada, com esta última a dividir-se em Portal da Calçada e Quinta da Calçada.
André Estácio Pinto lembra: “Temos vindo a crescer muito e a reposicionar a marca, porque é preciso lembrar que a Calçada tem grandes pontos de diferenciação e já foi uma marca grande internacionalmente, e mesmo a nível nacional”. Depois, prossegue o gestor, “com a morte de uma pessoa que liderava esta área de negócio perdemos a distribuição nacional e mantivemos o foco regional. Estamos agora num processo de reconstrução que às vezes é mais moroso, toda a gente conhece a Calçada, mas não os vinhos”.
Apesar do glamour do setor dos vinhos, as empresas têm de olhar para os números, e a Agrimota não foge à regra. Em 2018, a empresa, que emprega 15 pessoas, deverá fechar o ano com uma faturação de dois milhões de euros, que compara com os 1,2 milhões registados em 2017.
“Um bom crescimento”, diz o gestor da empresa para acrescentar: “Claro que, quando comparado com a Mota-Engil, somos muito pequeninos”.
No que se refere a investimentos, o braço da família Mota para o negócio dos vinhos afetou 3 milhões de euros a esta área nos últimos cinco anos, e está agora a dar início a um novo ciclo de expansão.
Inês Mota garante que esta “é uma área que tem mais glamour do que volume, mas tem um interesse económico potencial à medida que ganha escala”.
Dentro do portefólio da Agrimota, os Verdes assumem-se como reis, sendo o Douro um complemento para agradar a um certo tipo de cliente. “O nosso foco são os Verdes, sempre foi e espero que assim continue”.
Um player de referência na região
“Vamos iniciar um processo de nova expansão na linha de enchimento e rotulagem. Neste momento já estamos a recorrer a outsourcing em termos de capacidade de stock e mesmo em termos de enchimento”, refere a neta do fundador do grupo Mota-Engil.
Para Inês Mota, “todo o investimento foi muito bem pensado e feito consoante o retorno, até porque no setor dos vinhos é muito fácil perder o norte“.
Agora e até 2019, o grupo vai investir mais dois milhões de euros. Este montante será repartido entre a linha de enchimento, maior infraestrutura (depósito e transformação) e também em novas vinhas.
Todo o investimento foi muito bem pensado e feito consoante o retorno, até porque no setor dos vinhos é muito fácil perder o norte.
“Temos vindo sempre a investir em novas vinhas porque do que identificamos existe um grande défice na região dos vinho verdes”, adianta Inês Mota. A Agrimota, de resto, assume-se, a par com uma boa dezena de produtores, como um “player diferenciador dentro da região”.
Ainda assim, Inês faz questão de recordar que “não temos dimensão para ser concorrentes uns dos outros. Quando olho para a nossa suposta concorrência, como a Aveleda ou a Quinta da Lixa, por exemplo, vejo-os como potenciais parceiros”. E acrescenta: “Portugal inteiro precisava de se ver como potencial parceiro: somos tão pequeninos, num mundo de vinhos onde imperam França, Itália, Nova Zelândia, Chile, ficamos sempre a perder pelo que se nos unirmos podemos conseguir mais”.
André Estácio Pinto não podia estar mais de acordo. “A região de vinhos Verdes é parca em termos de projetos diferenciadores: há um Monverde, uma Aveleda, e todos juntos podemos ajudar a mudar a perceção da rota turística na região”.
Os verdes têm todo o potencial para se assumirem como diferentes. Aliás, a Comissão de Vinhos Verdes vende-se como única no mundo e acho que não está longe da verdade. Mas faltava este elemento que é a capacidade de atrair e de mostrar qualidade e mostrar que é possível ombrear-nos com as melhores regiões.
Aliás, os novos investimentos que têm sido feitos vão no sentido de “criar valor de uma rota turística na região e mostrar não só os vinhos fáceis e indiferenciados mas uma região que se diferencia pela qualidade dos vinhos, pela qualidade da oferta turística, pelo casamento gastronómico. Estamos à porta do Douro, éramos a porta natural do Douro, mas acho que faz mais sentido ser uma paragem nos Verdes a caminho do Douro”.
Para Estácio Pinto, “os Verdes têm todo o potencial para se assumirem como diferentes. Aliás, a Comissão de Vinhos Verdes vende-se como única no mundo e, eu acho que não está longe da verdade. Mas faltava este elemento que é a capacidade de atrair e de mostrar qualidade, e que é possível ombrear-nos com as melhores regiões do mundo”. E remata: “Diria que estamos aqui num pelotão de empresas que têm ajudado a mostrar a nova faceta dos vinhos Verdes”.
O futuro…e as dificuldades de crescimento
“Em cinco anos temos de nos assumir como multiregião porque faz sentido complementar o portefólio de brancos com o de tintos”, diz André Pinto.
André Pinto diz mesmo que a Agrimota tem a grande vantagem de ter “uma família que tem prazer em preservar a tradição, a memória do fundador do grupo e, com as ligações que tem à terra, o prazer em oferecer vinho como um ato de prazer e de reconhecimento mais do que beber o vinho. Valorizam e bebem o vinho mas não têm o ego de dizer que ‘este é o meu vinho'”.
Mas quando fala em multiregiões podemos esperar diversificação para além do Douro e do Verde? André Pinto Estácio, responde: “Para já é por aqui, já temos um pezinho no Douro, portanto é consolidar. Já temos alguma dificuldade de crescimento, não minto se disser que gostaria primeiro de consolidar o crescimento antes de embarcar numa nova aventura”. Já Inês adianta: “Temos ambições de crescimento e se surgirem oportunidades noutras regiões não diremos que não porque são complementares”.
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