Ricardo Robles não é um caso isolado. As polémicas dos políticos à volta do imobiliário
Não é a primeira vez que um político se vê envolvido numa polémica ligada ao setor imobiliário. Antes de Robles, também Fernando Medina, Rui Moreira ou António Costa foram alvo de controvérsias.
Ricardo Robles comprou um prédio por 347 mil euros. A aquisição foi feita em hasta pública, tendo apresentado a proposta mais elevada para um imóvel que pertencia à Segurança Social. Uma transação transparente, mas que, agora, gerou polémica quando apareceu à venda por vários milhões de euros. É só mais uma polémica entre tantas outras que ao longo dos últimos anos têm envolvido os políticos e os seus investimentos em terrenos, apartamentos ou prédios.
Antes de Robles, já Fernando Medina, Rui Moreira ou mesmo António Costa foram “apanhados” em negócios controversos, tendo o primeiro-ministro, mas também o seu ministro Adjunto, Pedro Siza Vieira, sido os últimos visados por negócios com imóveis, ou associados ao imobiliário — numa altura em que os preços não param de aumentar. E recuando ainda mais no tempo, encontram-se nomes como os de Manuel Pinho e José Sócrates, mas também Cavaco Silva.
São vários os casos. Mas não são exclusivos de Portugal. Aqui mesmo ao lado, em Espanha, o líder do Podemos, Pablo Iglesias, e a sua companheira Irene Montero, que é a porta-voz do partido, ficaram debaixo de fogo devido à aquisição de uma casa no norte de Madrid por 600 mil euros. Esta polémica ganhou relevo porque o líder do partido criticou duramente o ex-ministro da Economia, Luis de Guindos, por este ter comprado um apartamento de luxo, exatamente pelo mesmo valor.
Fernando Medina e o duplex nas Avenidas Novas
Foi no ano passado que o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Fernando Medina, se viu no centro de uma polémica. Neste caso estamos a falar de um duplex no centro da cidade que comprou, em conjunto com a mulher, em 2016. De acordo com a escritura que o Observador consultou na altura, Medina adquiriu um T4, com dois pisos, na Avenida Luís Bívar, nas Avenidas Novas, por 645 mil euros.
De acordo com a lei, os autarcas têm 60 dias para atualizar a declaração de rendimentos sempre que há qualquer alteração patrimonial superior a 50 salários mínimos (ou seja, 26.500 euros há dois anos). Mas o presidente da autarquia apenas informou o Tribunal Constitucional de que deu um sinal de 220 mil euros — pago pela mãe e sogros — e que era “promitente-comprador” de uma casa, mas não de que já era efetivamente proprietário e tinha pago os restantes 445 mil euros através de um empréstimo bancário.
No entanto, Medina alegou não estar em incumprimento com a lei, uma vez que era “do conhecimento público esta transação, quer decorrente da declaração do Tribunal Constitucional, quer do registo predial feito, pelo que estão totalmente satisfeitos os valores que a norma constante da Lei n.º 4/83 se destina a proteger”.
Rui Moreira e o terreno da Selminho
De Lisboa para o Porto. O presidente da Câmara da Cidade Invicta, Rui Moreira, também não declarou explicitamente as suas ligações à Selminho Imobiliária nas declarações de interesses que entregou no Tribunal Constitucional e que são obrigatórias por lei para quem desempenha cargos públicos, avançou, em junho do ano passado, o Diário de Notícias.
A empresa mantém há vários anos (ainda antes da tomada de posse como presidente da Câmara do Porto) um litígio com a autarquia por causa de um terreno junto à ponte da Arrábida, que foi registado por usucapião. De acordo com declarações do assessor do autarca ao jornal, Rui Moreira “não tinha, em 2013, qualquer participação direta na empresa e nunca fez parte dos seus órgãos sociais”.
Nas declarações apresentadas no tribunal, o presidente da Câmara fez referência à Morimor, sociedade detida pela família do autarca e que, por sua, vez detinha uma participação na Selminho. “A Selminho é uma gaveta da Morimor. O dr. Rui Moreira declarava todas as empresas que eram da Morimor”, referiu então a assessoria, em resposta à polémica.
António Costa e a casa no Sol ao Rato
O primeiro-ministro também esteve envolvido numa polémica. Foi no final de maio que o Observador avançou que António Costa comprou juntamente com a sua mulher, Fernanda Tadeu, uma casa perto do Largo do Rato (na rua do Sol ao Rato), em Lisboa, por 55 mil euros e, apenas dez meses depois, conseguiu vendê-la pelo dobro do valor: 100 mil euros.
O caso tornou-se controverso depois de os vendedores, o casal de idosos Joaquim Rosa e Maria Rosa, ter dito ao jornal online que fechou o negócio com António Costa porque ficaram sensibilizados ao saberem que a casa era para filha do líder do Governo “morar perto do café do irmão”. Porém, em abril de 2017, António Costa vendeu a casa pelo dobro do preço. Maria Rosa disse estar em “choque”, lamentando que tenha havido quem lucrasse “à custa” do “trabalho de uma vida”.
Em reação, António Costa argumentou que o imóvel “foi adquirido pelo preço solicitado pela agência que o comercializava, a Remax, a mesma que no ano seguinte intermediou a sua venda equipada e mobilada, após pequenas obras de reparação”. O primeiro-ministro adiantou ainda que a mais-valia de 45 mil euros realizada com a transação foi “declarada para efeitos de liquidação do IRS relativo a 2017”.
Pedro Siza Vieira e a imobiliária
Enquanto alguns compram apartamentos, há quem abra imobiliárias. Como o ECO avançou em maio, o ministro Adjunto, Pedro Siza Vieira, e ex-sócio da sociedade de advogados Linklaters, abriu uma imobiliária com a mulher, na qual ambos eram os únicos sócios gerentes. Uma empresa que foi criada um dia antes de Siza Vieira tomar posse no Governo de António Costa.
A informação sobre o registo desta sociedade consta da declaração de rendimentos que o governante entregou no Tribunal Constitucional e que o ECO consultou. Pedro Siza Vieira acabou por renunciar ao cargo de gerente “quando foi chamado à atenção para isso”, disse, mas manteve a quota, dizendo “não ter noção” da incompatibilidade de cargos.
Entretanto, o Ministério Público abriu uma investigação, pedindo ao Tribunal Constitucional para analisar as declarações de incompatibilidades e de rendimentos de Siza. Contudo, não deu um prazo para tomar uma decisão.
Manuel Pinho e a casa de Almeida Garret
Manuel Pinho viveu vários anos no número 68 da Rua Saraiva de Carvalho, em Campo de Ourique, num duplex com cinco quartos, pátio inglês, jardim e piscina, além de cinco lugares de estacionamento. Este empreendimento com quatro apartamentos luxuosos: dois T4, um T2 e o duplex de Pinho, foi construído no local onde antes era a antiga casa do escritor Almeida Garrett, edifício que acabou por ser demolido.
O ex-ministro da Economia comprou o prédio todo, em 2004, ao Banco Espírito Santo, por um valor inferior a 800 mil euros, de acordo com a revista Visão. Um valor considerado baixo, mas sobre o qual só se levantaram suspeitas anos mais tarde.
Este caso ganhou dimensão quando documentos do “Caso EDP” revelaram que o ex-ministro da Economia deteria três empresas offshore — Tartaruga, Blackwade e Mandalay — através das quais terá recebido mais de um milhão de euros do Grupo Espírito Santo, incluindo meio milhão em transferências mensais de cerca de 15 mil euros enquanto era ministro da Economia de Sócrates.
José Sócrates e a rua Braamcamp
O ex-primeiro-ministro tinha um apartamento na rua Braamcamp, muito perto do Marquês de Pombal. Mas não foi José Sócrates que o comprou. Foi a sua mãe, Maria Adelaide de Carvalho Monteiro, que adquiriu o apartamento a uma sociedade offshore, a Stolberg Investiments Limited, com sede nas Ilhas Virgens Britânicas.
Isto aconteceu em novembro de 1998, nove meses depois de Sócrates se ter mudado para o terceiro andar do prédio Heron Castilho. O apartamento tinha um valor tributável de 44.923.000 escudos – cerca de 224 mil euros – e a mãe do ex-primeiro-ministro comprou-o sem recorrer a qualquer empréstimo bancário e auferindo um rendimento anual declarado nas Finanças inferior a 250 euros (50 contos).
Se esta transação levantou suspeitas, houve outras tantas anos depois que acabaram por ser investigadas no âmbito da Operação Marquês. Ao todo, foram cinco casas e um terreno pertencentes à mãe de José Sócrates, bem como uma casa que era de Sofia Fava (ex-mulher de Sócrates), que acabaram por ser vendidos a Carlos Santos Silva, em alguns casos por valores acima dos praticados pelo mercado, e cujos valores acabaram, na maioria dos casos, por ir parar aos bolsos do ex-primeiro-ministro, segundo a Sábado.
Além disso, citando peças processuais da Operação Marquês, a revista, diz que foi o amigo de Sócrates que financiou a compra do monte alentejano da ex-mulher do antigo primeiro-ministro. E foi também ele que comprou a casa de Paris onde este viveu após sair do Governo.
Cavaco Silva e a casa na aldeia BPN
Um dos casos mais antigos envolve o ex-Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva. Foi em 1999 que deu entrada na Conservatória do Registo Predial de Albufeira a aquisição do lote 18 da Urbanização da Aldeia da Coelha, no que foi uma permuta entre o casal Aníbal e Maria Cavaco Silva e a empresa Constralmada – Sociedade de Construções.
Contudo, como a revista Visão avançou, em 2011, não existia no registo a escritura pública que contratualizava a permuta. Ou seja, não se pôde apurar de imediato, e Cavaco Silva não esclareceu na altura, o que deu em troca por este lote. Mais tarde soube-se que o antigo Presidente permutou a sua vivenda “Mariani”, em Montechoro, com a da Aldeia da Coelha, também em Albufeira.
Mas o caso ganhou outros contornos pelo facto de um terço do capital da Constralmada, sociedade dissolvida em 2004 e com quem Cavaco Silva fez a permuta, ter sido detido pela OPI 92 – Operações Imobiliárias, empresa de Fernando Fantasia, um dos acionistas da SLN. Ou seja, a antiga proprietária do BPN, banco liderado por Oliveira e Costa. O gestor, em conjunto com outros nomes ligados à instituição financeira que acabou por ser nacionalizada por Teixeira dos Santos, em 2008, também tinha uma casa no mesmo local, o que acabou por dar o nome de aldeia BPN a este empreendimento.
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