Considerado um dos advogados mais poderosos, João Vieira de Almeida conta ao ECO como a VdA tem investido na inteligência artificial, quanto faturou em 2017 e como está a preparar a sua sucessão.
Numa entrevista sem receio das críticas que faz, incluindo à própria classe da advocacia, o managing partner da VdA, João Vieira de Almeida, fala da faturação do escritório, que chegou aos 50 milhões no ano passado – assumindo que é o escritório que mais fatura no país – e do governo, elogiando insistentemente António Costa, mas não deixando de deitar abaixo a geringonça. Mostra-se ainda preocupado com o facto de as decisões da banca estarem centralizadas em Madrid. Quanto ao seu legado, diz que a sua sucessão está a ser preparada da forma mais “natural”.
O Legal Analytics Bureau – ou LAB – será um centro de research dedicado a projetos de investigação da VdA. Estamos a falar de que projetos?
João Vieira de Almeida: Nós temos a VdA Academia, que é uma associação que vive muito ligada ao escritório, com existência própria e gerida profissionalmente. Nessa Academia criamos este centro de investigação para desenvolver processos, sistemas e indicadores que não têm a ver com a produção de direito, não tem nada a ver com o conhecimento jurídico e técnico mas tem a ver com elementos suporte à gestão do negócio. Está muito vocacionado para desenvolver modelos de base preditiva, por exemplo. Estamos a trabalhar com dois data scientists que estão a fazer um trabalho muito giro que é – porque nós temos muitos anos de gestão de informação acumulada — pegar em tudo o que temos, desenvolver padrões e depois com esses padrões desenvolver modelos preditivos. E permite-nos antecipar qual vai ser o comportamento da firma, dos advogados, dos clientes, das avaliações. E por outro lado desenvolver modelos de gestão.
Mas quantas pessoas estão nesse LAB? Qual é a formação dessas pessoas?
JVDA: Temos dois engenheiros, miúdos, gente muito nova. São pessoas da área de engenharia e dos sistemas e que falam uma linguagem completamente diferente.
E como é que um advogado recruta um engenheiro?
JVDA: O que é engraçado é que eu achei que nós, advogados, não iríamos conseguir interessá-los. Por ser uma sociedade de advogados em que as pessoas não fazem a mínima ideia do que é, e a maior parte das pessoas têm ideias preconcebidas. E eles gostam de estar aqui, são pessoas diferentes, com interesses diferentes e perceberam que havia aqui um mundo completamente novo por explorar. Da equipa fazem parte estes dois, mais pessoas da equipa da VdA Academia e ainda recursos externos, temos alguns consultores.
O que pretendem os jovens ao entrarem num escritório de advogados?
JVDA: Isso tem que lhes perguntar mais a eles. Mas digo-lhe já que não sou um grande defensor das categorizações e achar que os millennials são todos iguais. Não acho nada que funcione assim. Já houve os yuppies, os baby boomers, já houve muitas categorizações. É difícil categorizar. Há padrões que têm a ver com os tipos de vida, acesso a informação, as trends que existem em cada momento e que caracterizam gerações, mas dizer que a atitude que têm perante a vida e o trabalho é sempre igual e que toda a gente é millennial isso não. Continuo aqui a ter e ver gente que trabalha, quer trabalhar e quer uma carreira.
O que tem a VdA para lhes oferecer? O que a diferencia face aos outros escritórios?
JVDA: Não gosto muito de me afirmar por referência aos outros. Oferecemos coisas que, obviamente, todos os escritórios podem dizer que oferecem. Oferecemos uma carreira que é muito pensada. Temos aqui pessoas que só trabalham para isso, que seguem os estágios. Fazemos muito empowerment das pessoas mas provavelmente os outros escritórios também, não sei. Depois temos uma preocupação genuína com as pessoas, a carreira das pessoas e com a vida de cada um. Acho que temos um clima e cultura organizacional que eu vejo como uma vantagem.
Ainda relativamente à estratégia da VdA: a aposta em inteligência artificial tem sido grande?
JVDA: Sim. Fez parte da reestruturação que nós fizemos criar uma área de prática, que se chama área de serviços corporativos, onde entre outras coisas vamos desenvolver o motor dos serviços apoiados quer em AI quer em Document Automation.
Mas é uma aposta que veio para ficar?
JVDA: Sim, veio completamente para ficar e dessas análises que nós fazemos uma das que desenvolvemos estuda o impacto que isso vai ter no negócio. É muito interessante perceber, olhando para o trabalho que fazemos agora, qual é o percentual de trabalho que pode ser deslocalizado ou em parte, pelo menos.
A tendência para movimentos de fusão de escritórios de advogados acalmou?
JVDA: Eu acho que as pessoas fazem uma gestão muitas vezes de curto prazo, sobretudo aqui em Portugal e os advogados acho que não são diferentes. O bom momento que o setor atravessa não incentiva extraordinariamente os movimentos de concentração. É claro que esta é a fase em que devíamos estar a planear e a olhar para a frente porque esta é a altura em que as coisas estão bem, porque os resultados são bons e há imenso trabalho.
Houve um boost de negócio no último ano, certo?
JVDA: Nos últimos, pelo menos, três. Esta é a altura certa para planear. Mas no nosso caso não faz sentido pensar em concentrações. Estamos muito mais focados no crescimento orgânico do que em crescer lateralmente. Fizemos muito isso nos últimos sete anos: primeiro com movimentos pequenos e depois aquele movimento também grande de entrada de bastante gente ao mesmo tempo.
E devíamos (os advogados) ser capazes de falar e dialogar e ter agendas conjuntas em vez de nos andarmos a bater uns aos outros.
Rui Amendoeira passou recentemente de sócio a counsel. Quais as razões?
JVDA: Deixou de ser de sócio e saiu do Conselho de Administração.
Mas continua a trabalhar na Vieira de Almeida?
JVDA: Sim, sim. Passou a consultor. E foi uma situação que teve que ver com escolhas pessoais. Nós estatutariamente somos bastante exigentes e rígidos e quem está tem de estar a 100% aqui e há uma série de opções pessoais das quais se tem de abdicar. Não dá para estar aqui e poder fazer outras coisas. O Rui, e aliás muito bem, conhecendo isso, percebeu que havia outras coisas para as quais precisava de estar livre e de que gostava de fazer.
Mas a nível da política de internacionalização do escritório essa mudança não afeta a VdA?
JVDA: Eu espero que não. Para já, essa internacionalização já arrancou e não depende de ninguém em concreto. Hoje em dia é um processo que já ganhou uma força e uma inércia próprias. Já estamos em 13 jurisdições. Já não volta para trás. Mas é claro que o Rui é uma peça importante. Com o resto da equipa que veio da Miranda está tudo como previsto.
Houve na altura uma tentativa de fusão da VdA com a Miranda?
JVDA: Sim. Mas isso foi algo que aconteceu antes deste movimento. Uns três anos antes houve, de facto, umas conversas.
E o que é que correu mal para não acontecer?
JVDA: Nós chegámos bastante longe, chegámos a trabalhar muitas horas nisso. Acabámos por chegar à conclusão de que não dava.
Mas porquê?
JVDA: Ouça… É como estas coisas acontecem sempre. Há coisas em que pensamos que vão ser mais complicadas de chegar a um acordo e outras mais fáceis. Isto foi um misto. Houve uma ou duas coisas que não se conseguiram ultrapassar.
Mas pelo menos algumas das mais-valias que achava que a Miranda tinha, depois, mais tarde, conseguiu trazê-las para cá?
JVDA: Mas eu na altura não sabia. Nós tínhamos no nosso plano estratégico a internacionalização como vital. Eu dizia sempre aqui dentro “nós não vamos conseguir fazer aquilo que queremos sem ser no dia em que a Miranda se cindir”. E lembro-me de
pensar: “tenho de saber como aquilo está” e de pensar “vou ligar ao Rui Amendoeira para almoçar”. Nós almoçávamos muitas vezes e pensei em ligar-lhe, e ligo. Nesse dia, sem eu fazer a mínima ideia, ele tinha anunciado que se ia embora. Ele atendeu o telefone, achando que eu já sabia. Mas é mesmo incrível, é a maior coincidência.
Nós estatutariamente somos bastante exigentes e rígidos e quem está tem de estar a 100% aqui e há uma série de opções pessoais das quais se tem de abdicar.
Voltando só à internacionalização: há planos para mais alguma expansão agora?
JVDA: Não, nós agora… (pausa). Para já está bem. Poderá haver mais alguma coisa na África francófona, que é um mercado que eu não conhecia de todo e que é bastante interessante.
Na edição do mês de junho da Legal Business falou da faturação dos 50 milhões da VdA. É mesmo assim?
JVDA: É verdade, sim.
Este valor é com ou sem IVA?
JVDA: Sem IVA, nós não contamos com IVA, de todo.
Qual é de divulgar a faturação?
JVDA: A inveja é um tema e a transparência não é propriamente um valor. Acho que é isso que se passa em Portugal.
Mas estarão as gerações mais novas prontas para essa transparência?
JVDA: Sabe que infelizmente não encontro também nas pessoas mais novas esse apelo pela transparência. Também é verdade que não ajuda o nosso enquadramento institucional e regulamentar porque a Ordem dos Advogados não é propriamente uma grande alavanca para empurrar a transparência e para reconhecer certas realidades. Aqui diz-se que se fatura muito e é-se visto como um potencial bandido…
E é mentira: qualquer advogado que diga que só se preocupa com o cliente e não com o pagamento. Não vale a pena sermos ingénuos.
Há quem diga que divulgar a faturação é renegar os princípios da advocacia…
JVDA: A principal preocupação é claro que é o cliente, mas também a outra preocupação é saber se o cliente paga. E é mentira: qualquer advogado que diga que só se preocupa com o cliente e não com o pagamento. Não vale a pena sermos ingénuos. A faturação vale o que vale… Nem sequer é um indicador particularmente importante.
Mas atenção, não tenho dúvidas quanto ao caminho que estamos a fazer no que toca à transparência mas temos de ter atenção aos critérios que definimos e do que é que se está a falar. Há quem dê os valores com IVA, há quem dê sem IVA, uns com provisões de clientes ou com pagamentos por conta de clientes. Acho que haveria toda a vantagem em haver transparência porque, no limite, trabalhamos para a comunidade e para os clientes. Esta ideia corporativa de nos fecharmos, de não sermos transparentes, em vez de nos mostrarmos para fora vai ter de mudar. Mas exige alguma mudança de mentalidades mesmo dos advogados.
No estudo da Global RepScore a VdA foi a mais reputada. Essa transparência ajuda a que as pessoas comecem a percecionar as sociedades de advogados de uma melhor maneira?
JVDA: Eu espero que sim. Mas nós em Portugal ainda estamos muito longe do que seria o patamar mínimo de reconhecimento dos advogados. Do ponto de vista do prestígio, é uma classe que ainda está muito longe do que deveria ter, face à qualidade que tem. Nós temos imensa competência e imenso talento. E isso não passa cá para fora. E os primeiros culpados são os advogados. O facto de não nos conseguirmos entender, o facto de termos uma atitude corporativa. Há diferentes tipos de prestação de serviços de advocacia e todos merecem reconhecimento e proteção e apoio. E devíamos era ser capaz de falar e dialogar e ter agendas conjuntas em vez de nos andarmos a bater uns aos outros.
Penso que os juízes são mais corporativistas e os advogados mais competitivos. Vocês, convenhamos, estão sempre a dizer mal uns dos outros… (risos)
JVDA: O mercado é competitivo, e ainda bem. Para isso contribuiu imenso o facto de se ter aberto e de virem as sociedades estrangeiras. É, sem dúvida nenhuma, bastante competitivo e é bastante eficiente, além de altamente profissional. Não deve nada ao mercado de Espanha. Zero. Agora, do ponto de vista da organização da profissão, que está representada na Ordem e através da Ordem, o ambiente é bastante corporativo. Repare que muitas vezes aquilo que acontece é que é corporativo, excluindo as grandes sociedades – que são vistas quase como estando de fora da realidade corporativa dos advogados. Mas estou de acordo consigo, há corporações… Isto vem do meio de meados do século passado, era o corporativismo e isso não saiu da cabeça das pessoas. Dos taxistas aos juízes…
Bem, vamos passar ao tema de sucessão na VdA. Como está a ser esse processo? Já está a ser pensado?
JVDA: Estou completamente convencido de que a minha sucessão será um processo natural e fluido. O processo já arrancou no mês passado com um novo modelo de governance. Reorganizámos completamente o nosso modelo de funcionamento e um dos principais objetivos é preparar um modelo que seja fluido, previsível e, se tudo correr bem, muito tranquilo na sucessão. E já nem é só da minha, é da geração mais velha do escritório. Aquilo que quisemos fazer foi desenhar um modelo de liderança no escritório que vai permitir aos líderes mais novos ir substituindo os mais velhos.
Mas os sócios dos departamentos, por exemplo, serão substituídos – os mais velhos? É isso também? Ou os responsáveis pelos departamentos?
JVDA: Não, nós criámos foi um modelo que torna isso previsível. Portanto, o que temos agora é um modelo quase em funil em que um sócio no fundo vai ganhando competências, funções de liderança, mas porque criámos patamares intermédios de liderança e o que estamos a fazer é a criar uma fornada de líderes que se vão capacitando e isso vai permitir uma sucessão natural dos postos de liderança do escritório a longo prazo.
Esse longo prazo é o quê, dez anos?
JVDA: Não, isto no fundo é um modelo que nos permite fazer com que os líderes… primeiro os líderes de área, depois os de grupo, depois os sócios executivos do grupo… vão-se substituindo.
Ou seja, de X em X anos, ou de faturação?
JVDA: Não, não. Temos mandatos, criámos uma avenida de desenvolvimento de competências, de liderança que faz com que as pessoas vão acrescentando competências e vão subindo nos postos de liderança que aqui têm e vão sendo substituídas por outras mais novas.
E no seu caso? Como vai ser feita a escolha do seu sucessor?
JVDA: No meu caso… Vai ser feita pelos sócios, mas eu tenho a certeza de que vai ser um processo muito tranquilo. A reestruturação organizacional – de que falámos a propósito da sucessão – é muito mais do que um facilitador da substituição das lideranças. É também um catalisador de processos colaborativos dentro da firma, impondo modelos de cooperação vitais à sustentação da nossa raiz cultural de One Firm Firm. A agregação de áreas de prática em grandes grupos, com gestão centralizada, vai permitir capturar melhor sinergias que iremos pôr ao serviço dos clientes.
Mas ainda não está decidido quem é que será? Vai a votos?
JVDA: Ainda não. Sim, vai a votos mas espero que seja uma coisa absolutamente unânime.
Isto parece daqueles bailes da aldeia em que está o Primeiro-ministro a dançar com o ministro das Finanças, que no fundo faz um papel que é fundamental, com o PR a fazer de “pau de cabeleira”, a assistir e a garantir que eles não dançam para fora do recinto e que mais ninguém se junta. Acho que isto resulta deste equilíbrio do Presidente com o PM e o papel que o ministro das Finanças tem… De facto tem sido notável.
Tenho de insistir, mas vai ser através de uma shortlist? Ou vai apresentar um nome e os restantes sócios votam?
JVDA: O processo é um processo de escolha dos sócios. Como eu acho que uma coisa destas tem de se passar, numa sociedade como a VdA e sobretudo com as nossas circunstâncias, e pelo facto de eu estar aqui há tanto tempo, é que não pode haver surpresas. Tem de haver aqui um processo gradual de afirmação do meu sucessor e estão criadas as condições para isso começar a acontecer agora.
Mas sabe quem é que vai ser?
JVDA: Tenho algumas ideias…
Mas vai ser um homem ou uma mulher?
JVDA: Eu acho que seria muito interessante se pudesse ser uma mulher. Acho que seria interessante e um bom… (pausa). Mas a ideia aqui é não haver surpresas. É haver um processo gradual de afirmação dos líderes que vêm a seguir.
E a nível de timing, quando é que isso vai acontecer? Em 2020?
JVDA: Por aí. A minha ideia, o meu dever, é continuar cá e dar todo o meu apoio mas já sem ter as funções de managing partner. Mas quando falamos de sucessão falamos também de numa perspetiva transversal, i.e., a da emergência, na liderança das firmas portuguesas, de uma geração (agora nos 40 e poucos) que chegou à profissão já neste século. É gente com uma memória diferente da da geração “fundacional” da indústria, com uma visão mais pragmática e desamarrada dos “vícios” de quem cresceu num ambiente de “clube” que, entretanto, desapareceu. Isto é uma corrente muito forte, que irá ter um impacto significativo no mercado legal a poucos anos de distância.
Mas já está cansado de gerir?
JVDA: Não, na verdade adoro o que faço e vai-me custar. Eu adoro o que faço.
E agora política. Qual é a avaliação que faz da geringonça?
JVDA: É claramente positiva, do ponto de vista daquilo que são os resultados. Faço este balanço positivo muito dependente do brilho e das competências políticas pessoais do Primeiro-ministro (PM) e do equilíbrio virtuoso que se encontrou na triangulação entre ele, o Presidente da República e o ministro das Finanças. Mas quero ser claro na rejeição dos vínculos à esquerda, sobretudo de algumas políticas concretas que resultam desses compromissos, como seja por exemplo a lei do “direito de preferência”, uma aberração política e jurídica.
Portanto: admira o Governo, mas se calhar não desta maneira?
JVDA: Isso não. Isso é um ponto que me causa demasiada preocupação, eu acho que o PM merecia, e o país merecia, tê-lo como PM desligado dos outros partidos. Ou com a maioria absoluta, ou com outro tipo de entendimento. Acho que sinceramente podíamos vê-lo muito melhor ainda se tivéssemos o António Costa disponível para governar sem ter que fazer estes compromissos à esquerda.
E vejo isso com preocupação, porque não sei se é possível e, neste momento, a esquerda do PS tem um peso enorme dentro do partido, pelo que me preocupa aquilo que pode vir a acontecer a seguir. Mas também é verdade que acho que o PM tem feito um trabalho incrível do ponto de vista de gestão política.
E é preciso ver que ele consegue fazer política nos bastidores sem se perceber muito bem…
JVDA: Isso. E consegue levar o país num caminho que tem sido de sustentabilidade, de visibilidade, de adesão àquilo que são as exigências dos nossos acordos internacionais, da nossa inserção na Europa apesar dos constrangimentos que tem com as alianças que teve de fazer. Isso acho absolutamente notável.
Isto parece daqueles bailes da aldeia em que está o PM a dançar com o ministro das Finanças, que no fundo faz um papel que é fundamental, com o PR a fazer de “pau de cabeleira”, a assistir e a garantir que eles não dançam para fora do recinto e que mais ninguém se junta. Acho que isto resulta deste equilíbrio do Presidente com o PM e o papel que o ministro das Finanças tem… De facto tem sido notável. Se me tivesse perguntado há quatro anos se isto seria possível eu, como 99% das pessoas, diria que não.
Mas Marcelo Rebelo de Sousa também é um Presidente um bocado fora do comum.
JVDA: É um Presidente da República absolutamente extraordinário e tem um papel decisivo neste equilíbrio. Portanto, a avaliação que faço é de facto positiva. Mas vejo com preocupação o que virá depois.
E a preocupação que tem com a deslocalização da banca para Espanha…?
JVDA: Eu vejo com grande preocupação a ideia de nós passarmos a ter as decisões na banca muito centralizadas em Madrid, porque eu sou fundamentalmente um liberal, mas não sou radical. Acho fundamental que a Caixa se mantenha pública, fazendo não um trabalho de concorrência com os bancos comerciais, mas aquilo que deve fazer como principal banco do Estado e para conduzir a política económica e financeira do Estado numa base sustentável. E não a de cada governo…
E repito, vejo com preocupação a nossa incapacidade de ter aqui centros de decisão na área bancária e financeira porque acho isso muito importante para alimentar o tecido económico português e para viabilizar o que pode ser o crescimento a partir de investimento feito em Portugal, por portugueses.
JVDA: Quer se queira quer não, é uma ilusão pensar que é a mesma coisa avaliar um crédito de um empresário português ou uma empresa portuguesa aqui, por pessoas que conhecem e são capazes de medir a confiança e que sabem o que é o track record do investidor, que já trabalharam noutras áreas e percebem o enquadramento micro e macro do projeto, do que ser decidido friamente com base nos números num powerpoint em Espanha. Isso preocupa-me do ponto de vista da economia e acho que as sociedades de advogados têm de ter atenção a isso.
Acontece, ainda por cima, o facto de os bancos serem originadores importantes de trabalho. Os bancos muitas vezes recomendam os advogados ou trabalham com os que já conhecem. Acho que as sociedades portuguesas, se os bancos tiverem os seus centros de decisão em Espanha, podem sofrer no plano relacional com os bancos.
Qual é a percentagem máxima que um cliente pesa na faturação da VdA?
JVDA: Cada vez menor. Claro, quanto mais crescemos menos os clientes pesam. É um dígito, mas não sei dizer exatamente quanto é que é, mas não chega aos 10%. Nós fazemos uma análise por segmentos e não um a um. E o agregado, sobretudo o dos 25 maiores clientes, que é o que vemos com maior atenção. O acumulado tem vindo a perder expressão em termos relativos.
Se não fosse da VdA, qual é o escritório que mais admira? Em qual se via a trabalhar?
JVDA: Não consigo genuinamente dar esse passo. Como sabe há dois concorrentes que consideramos diretos, embora respeitemos todos ( MLGTS e a PLMJ). São os dois diretos porque no fundo há três sociedades portuguesas — e ainda bem e espero que se mantenha assim — que se mantêm no topo, apesar de as sociedades espanholas terem vindo para cá e o crescimento que tem sido e vai ser das auditoras. Eu espero que estas firmas se aguentem como se têm aguentado.
Eu sinceramente não me via em mais nenhuma, se não estivesse aqui fazia outra. Mas no que toca à concorrência tenho que referir e enaltecer as firmas mais pequenas que entretanto se consolidaram e atingiram patamares muito elevados de qualidade. Essas firmas contribuem decisivamente para a afirmação do mercado português como sendo altamente competitivo, profissional e capaz de se bater com as auditoras e os estrangeiros.
É considerado muitas vezes um dos homens mais poderosos do país…
JVDA: Não me considero, não me vejo nada assim nas coisas que eu faço ou que me interessam. Zero. Sou tão poderoso que tenho o ar condicionado avariado em casa e não consigo quem mo arranje… (risos). Acho que o meu poder se mede bem por aí.
Além de advogado, tem a escalada e a música. O que é que prefere?
JVDA: Gosto de tudo. Se tivesse de escolher… sim, é a advocacia que me dá prazer e dinheiro, se fosse pela bateria até me pagavam para não tocar… Mas o que eu gosto mais, o que eu adoro é o meu trabalho, adoro estar aqui e vir para aqui todos os dias. Mas a seguir acho que ia para a montanha.
A cultura de empreendedorismo é importante para Portugal?
JVDA: Está-se a desmantelar devagarinho uma conquista vital dos últimos anos, que foi a emergência – ainda tímida mas crescente – de uma cultura de empreendedorismo, independente do Estado e dos subsídios. Essa cultura é pilar essencial para um ambiente de maior responsabilização e para uma crescente aposta do país na internacionalização. A estabilidade das políticas, a simplificação de processos e a libertação de espaço na economia são vitais.
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“Aqui diz-se que se fatura muito e é-se visto como um potencial bandido…”, diz João Vieira de Almeida
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