Salários iguais para trabalho igual? Novas regras entram em vigor em fevereiro

A nova lei da igualdade salarial entre géneros entra em vigor no final de fevereiro, mudando algumas das regras das empresas. Como se devem elas preparar? O secretário de Estado recomenda "reflexão".

O princípio da igualdade remuneratória entre géneros não é novidade, mas está longe de ser plenamente concretizado. É esse fosso entre homens e mulheres que a nova lei da igualdade salarial — que entra em vigor no final de fevereiro — quer ajudar a solucionar. Mudam algumas regras para as empresas, para os trabalhadores e até para a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) e para a Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE), que passam a emitir pareceres vinculativos nos casos de discriminação remuneratória.

As mudanças trazidas pela Lei nº60/2018 organizam-se em quatros pilares temáticos centrais (mais informação, mais transparência, presunção de discriminação remuneratória nos casos em que o trabalhador alegue ser discriminado e reforço dos poderes da ACT e da CITE) e muitas datas, que é importante manter debaixo de olho.

Um dos primeiros efeitos desta nova lei será a publicação pelo Gabinete de Estratégia e Planeamento (GEP-MTSSS) de um “barómetro geral e setorial das diferenças remuneratórias entre mulheres e homens”, ainda no primeiro semestre deste ano.

Também na primeira metade de 2019, as empresas vão passar a ter de apresentar no seu relatório único — cujo prazo para a entrega termina a 15 de abril — informação nominativa dividida por géneros.

“Esta alteração tem, desde logo, uma dimensão pedagógica, na medida em que induz as empresas a refletirem sobre as suas práticas salariais, possibilitando uma análise interna sobre eventuais diferenças remuneratórias a partir de critérios objetivos“, explica o secretário de Estado do Emprego, em declarações aos ECO. Miguel Cabrita frisa também que esta mudança é “fundamental” para criar condições operacionais ao trabalho da GEP-MTSSS, nomeadamente na elaboração do barómetro já referido.

Ainda sobre o relatório único, a informação contida nesse documento passa a ser partilhada com os trabalhadores e com os sindicatos para “promover um ambiente de transparência salarial no mercado”, salienta o mesmo governante. Criam-se assim “melhores condições para que os trabalhadores possam avaliar a sua situação salarial relativamente aos seus pares”, reforça Cabrita.

no segundo semestre do ano (a partir de agosto), vai passar a ser exigido às empresas que adotem uma política remuneratória transparente.

Como se traduzirá na prática tal obrigação? “As empresas vão passar a ter de demonstrar, seja junto da inspeção de trabalho, seja junto da CITE, seja junto dos seus trabalhadores, seja ainda junto dos tribunais, que os salários que praticam são fixados de acordo com critérios objetivos como sejam os que decorrem do mérito, produtividade, assiduidade ou antiguidade”, esclarece o secretário de Estado.

A propósito, a partir desse mês, se um trabalhador se disser vítima de discriminação remuneratória, passa a caber à entidade empregadora “demonstrar que possuiu uma política salarial transparente”, isto é, o princípio consagrado passa a ser o da presunção do tipo de discriminação em causa. Nesses casos, a CITE passa ainda a poder emitir pareceres vinculativos.

Empresas discriminatórias têm 120 dias para apresentar plano de ação

Mudanças começam a ser sentidas já no primeiro semestre deste ano.

Além dos efeitos mais imediatos, há também alterações trazidas por esta nova lei que só se farão sentir em 2020. No primeiro semestre desse ano, o GEP-MTSSS irá publicar um balanço das diferenças remuneratórias entre homens e mulheres por empresa, profissão e níveis de qualificação, a partir do qual a ACT irá identificar as empresas cujos dados evidenciem diferenciais salariais entre géneros injustificadas.

A autoridade notificará, na sequência, as empresas em causa, que no prazo de 120 dias terão de apresentar um plano de avaliação das diferenças remuneratórias. Tal estratégia deverá ser aplicada durante 12 meses. Se as discrepâncias remuneratórias identificadas se mantiverem findo esse prazo, a situação passa a constituir uma contraordenação grave, podendo-se mesmo somar uma sanção acessória de privação do direito de participar em arrematações ou concursos públicos por um período de dois anos.

“Esta sanção acessória acresce à contraordenação nos casos em que se verifique reincidência e em que haja dolo ou negligência grosseira, tendo em conta efeitos gravosos para o trabalhador ou o benefício económico retirado pelo empregador com o incumprimento“, nota Miguel Cabrita, que frisa que o objetivo da lei não é sancionar, mas corrigir as diferenças remuneratórias entre géneros.

Esta lei não pretende onerar as empresas, não pretende impor exigências legais adicionais nem cria mais encargos burocráticos ou administrativos, mas tão só garantir que a igualdade entre homens e mulheres se torna mais efetiva nos casos em que porventura ainda não seja“, realça, nesse sentido, o secretário de Estado, que aconselha as empresas a refletirem sobre as suas práticas salariais internas em jeito de preparação para a entrada em vigor destas novas regras.

Mulheres ainda ganham menos 15% que homens

Mulheres ainda ganham menos 15% do que os homens, em Portugal.

Os números são dos Quadros de Pessoal 2017 (relatório publicado pelo GEP-MTSSS): As mulheres recebem, em média, cerca de 15% menos do que os homens.

“Apesar de haver exemplos muito positivos de boas práticas empresariais e até setoriais a este nível, continuamos a ter assimetrias significativas entre mulheres e homens”, sublinha o secretário de Estado do Emprego, que acrescenta: “As desigualdades de género estão profundamente enraizadas e, por isso, não basta legislar para corrigir”. É importante, contudo, referir que, em 2021, esta lei alarga-se às empresas com 50 trabalhadores ou mais.

Ainda sobre a evolução do fosso salarial entre géneros, o relatório Women in Work Index 2018 da PwC indica que Portugal foi segundo país da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) que registou um maior agravamento dessa diferença remuneratória entre géneros, de 2000 a 2016. Isto porque, explica a consultora, as oportunidades para as profissionais escassearam, nesse período, por terra lusitanas.

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