Reforço da oferta nos transportes? “Isso é outro debate, hoje falamos de passes sociais”, diz PS
Corte nos preços dos transportes aplaudida por todos os partidos. Mas PS recusa misturar temas. Uma coisa é o debate sobre o reforço da procura, outra é o debate sobre o reforço da oferta.
Apesar de na última década a política para o preço dos transportes públicos ter variado entre o oito e o oitenta, ou seja, de aumentos médios de 15% num ano aos cortes profundos que agora entram em vigor, aparentemente este ano todos os partidos concordam com a política de redução significativa no custo de andar de transportes públicos.
Esta sexta-feira, os passes sociais estiveram em debate no Parlamento a pedido do Partido Socialista, ocasião em que tanto PSD como o CDS saudaram a medida do governo para simplificar e reduzir os tarifários, criticando, no entanto, o facto de a medida não abranger 100% da população e de a mesma não estar a ser acompanhada por um investimento na oferta e na capacidade de resposta dos operadores de transportes. Mas apesar de a discussão ser sobre uma política que visa aumentar significativamente a procura de transportes, o PS recusou debater o problema da oferta.
“Isso é um outro debate para o qual estamos disponíveis, mas hoje queremos falar sobre este programa de redução de tarifas”, defendeu Carlos Pereira, que deu a cara pelo Partido Socialista. Para o deputado, falar em reforço da oferta e investimentos na melhoria da qualidade dos transportes é não mais do que fugir do debate sobre a redução de tarifas. “Hoje queremos falar sobre este programa e este é um debate de que querem fugir”, criticou. Mas o que o Parlamento queria ouvir esta sexta-feira era precisamente o que planeia fazer o governo para o esperado aumento na procura ter idêntica resposta do lado da oferta.
Todos elogiam, todos criticam
O debate sobre os passes sociais arrancou com uma intervenção inicial de Carlos Pereira, que rotulou o Programa de Redução Tarifária como uma “das medidas mais esperadas desta legislatura”, já que reforça o combate às alterações climáticas, estimula a utilização do transporte público e apoia os mais desfavorecidos, sendo por isso “um passo de gigante para calar anos de falatório político”. De seguida, virou baterias para o maior partido da oposição:
“Porque querem travar isto? O que têm contra os passes sociais mais baratos em todo o continente? O PSD está em frenesim eleitoralista, mas não vale tudo… depois de quatro anos em que os passes ficaram sempre mais caros e com zero medidas estruturais para o setor, não esperávamos esta desfaçatez do PSD”, atirou.
Mas o PSD já não tem nada contra os passes sociais mais baratos. Antes pelo contrário. “O PSD concorda com a medida, é positiva, necessária e ajuda muito à mobilidade e sobretudo para o cumprimento de metas ambientais”, disse Leonídio Guerreiro. Do ponto de vista dos sociais-democratas, as críticas agora devem ser focadas na abrangência da medida, já que acusam a mesma de beneficiar sobretudo as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. “Cria barreiras de mobilidade dentro do país, porque a mobilidade das pessoas não deve depender da Comunidade Intermunicipal onde vivem”, detalhou o deputado. “Concordando com a medida, lamentamos que a mesma não tenha como objetivo servir a todos da mesma forma.”
Ao apoio do PSD à medida de redução dos preços dos transportes, seguiu-se o apoio do CDS. “Contribuo para o consenso e dou os parabéns a todos. Os princípios [da medida] são bons, já os perseguimos há mais tempo e temos proposto medidas nesse sentido. Mas sem colocar em causa as linhas genéricas, há matérias que ainda importa discutir”, apontou Hélder Amaral.
“Na zona onde mais incide a medida, a Transtejo suprimiu mil embarcações, precisa de reforçar pessoal, a oferta é pouca e de baixa qualidade. Na Soflusa encontramos o mesmo, o total de embarcações são diminutas… estão a tratar da melhoria da oferta para que a medida seja eficaz?”, questionou. “A CP suprimiu mais de 12 mil comboios, tem falta de pessoal, tal como a EMEF… esta medida pode falhar por aqui. O que está a ser feito?”
Mais de 20 anos de luta e agora todos querem o crédito
Face à aparente unanimidade da ideia de cortes nos preços dos transportes públicos do lado direito da Assembleia da República, o PCP optou por aproveitar o debate desta sexta-feira para recordar as mais de duas décadas de luta por si encetadas em prol deste avanço social. “Queria começar por dizer que isto há 22 anos parecia impossível. A persistência de quem propõe medidas que são justas e defende políticas a favor das pessoas compensa quando se vê aprovadas medidas justas e boas para as pessoas e país”, disse Bruno Dias. Mas para que a medida atinja todo o seu potencial, é preciso reforçar a oferta, lembrou.
“Há responsabilidades a colocar: para reforçar os quadros de pessoal das empresas, os meios materiais, há também o problema concreto que se coloca na ligação entre regiões… são tudo elementos concretos que exigem explicação, porque o PS votou contra medidas propostas do PCP neste sentido”, apontou o deputado comunista.
Posição similar defendeu o Bloco de Esquerda que, todavia, recuou apenas dois anos, para lembrar que o Secretário de Estado Adjunto e da Mobilidade, José Mendes, defendeu então um aumento de 1,5% nos transportes em nome do “equilíbrio entre manter o transporte público acessível e a sustentabilidade das empresas”. Contudo, e dois anos depois, “já não está preocupado com a sustentabilidade das empresas?”, questionou Heitor de Sousa. E avançou para as críticas ao programa de redução tarifária.
“Há muitos buracos negros neste Programa e um dos principais tem a ver com o facto de haver deslocações pendulares, incluindo com outros operadores privados e CP, em que redução do preço dos passes não se aproxima dos valores que vão ser praticados na Área Metropolitana de Lisboa”, salientou. E deu um exemplo concreto: “De Mafra a Setúbal são 85 quilómetros. De Lisboa ao Entroncamento são 90 quilómetros. Mas os passes até Vila Franca de Xira vão custar 166 euros e o passe de qualquer habitante em Setúbal é de 40 euros. Esta desigualdade não pode deixar de ser explicada.”
PS recusa debater problema da oferta nos transportes
Apesar da unanimidade dos partidos visar tanto os elogios aos princípios da redução tarifária, como as críticas à falta de medidas para o reforço da qualidade e da oferta dos transportes públicos, e apesar do debate sobre os passes sociais ter sido agendado a pedido do partido de governo, o PS não quis debater o reforço da oferta.
“Aumento da oferta? Isso é um outro debate para o qual estamos disponíveis, mas hoje queremos falar sobre este programa de redução de tarifas. Este é um debate de que querem fugir”, começou por responder Carlos Pereira. Dada a insistência dos restantes partidos no tema, reforçou: “Este debate é sobre oferta, não espere que esta medida seja travada só porque em algumas zonas do país não estamos em situação ótima em termos de oferta.”
Paulo Trigo Pereira, deputado não inscrito, veio em auxílio do socialista: “Obviamente que a medida vai aumentar procura, mas há coisas a fazer do ponto de vista da oferta da cobertura e da qualidade, mas a procura vai estimular essa melhoria da oferta“, defendeu.
Que não perdoou esta falta de políticas para o reforço da qualidade e da oferta dos transportes públicos foi Paulo Neves, deputado do PSD. “Esta é a forma de governar do PS. Governa por decreto mas não prepara o país para as suas medidas”, atirou.
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