IPO da Uber? “Não nos deixamos levar em fantasias”, diz especialista em IA da Allianz GI

Johannes Jacobi prefere esperar para conhecer o negócio da Uber, que chega esta sexta-feira a Wall Street. Apesar de não ser o típico investidor nas FAANG, tem duas na lista de 10 maiores posições.

A inteligência artificial não atrai apenas as gigantes tecnológicas. Com cada vez maior facilidade em encontrar oportunidades de investimento, a flexibilidade em apostar em vários setores levou o fundo global da Allianz Global Investors (GI) a um retorno de quase 36% desde a criação, há dois anos, como explicou o vice-presidente da gestora de ativos Johannes Jacobi, em entrevista ao ECO.

O que importa a Jacobi é ver como cada empresa implementa a inteligência artificial. É por isso que o responsável do fundo, atualmente com 1,5 mil milhões de dólares sob gestão, prefere esperar antes de tomar qualquer decisão sobre investir na Uber. Após a oferta pública de aquisição em que levantou 8,1 mil milhões de dólares (a 45 dólares por ação), a empresa de transporte de passageiros prepara-se para entrar na bolsa de Nova Iorque esta sexta-feira avaliada em 75,5 mil milhões de dólares.

Quanto às gigantes tecnológicas, tem também uma posição cautelosa. O especialista do Allianz Global Artificial Intelligence — que diz não ser o típico investidor das FAANG (Facebook, Amazon, Netflix e Google) e é investidor âncora na Tesla — apostou recentemente tanto no reconhecimento facial de Mark Zuckerberg como na retalhista de Jezz Bezos. Otimista sobre o mercado, que vê como “saudável”, antecipa a continuação da volatilidade até ao fim da guerra comercial entre EUA e China.

Há uma série de IPO de tecnológicas marcados para este ano. Entraram na Lyft ou consideram entrar na Uber?

Não posso fazer comentários específicos a nenhuma das empresas porque não somos investidores em nenhuma, o que poderá, ou não, mudar no futuro. O que fazemos é acompanhar de perto o que se passa no mercado e claro que temos uma perceção do que se passa com ambas as empresas e as ações.

Porque é que não investiram?

Ainda podemos ver algo no futuro, potencialmente sim, potencialmente não. Vai depender do preço, expetativas futuras e outros fatores.

A Lyft está a ser processada por um grupo de investidores que diz que a empresa sobreavaliou o negócio no IPO. Poderá acontecer o mesmo com a Uber?

Estamos muito contentes com a avaliação da indústria e não consideramos que esteja a disparar neste momento nem vemos sinais de sobreaquecimento do mercado ou bolha. Sei que tem havido grandes discussões sobre até onde pode o mercado continuar e até onde pode ir a performance do mercado. O que nós pensamos é que ainda estamos em território saudável. Vemos apoio global de bancos centrais e, de forma geral, não há nada de preocupante.

Em relação a estas duas ações em particular, ficámos um pouco surpreendidos com a avaliação. Preferimos mantermo-nos à margem porque ainda precisamos de algumas semanas ou meses para nos familiarizarmos com as empresas e conhecermos o que planeiam fazer. Outro ponto é que não nos deixamos levar pelas fantasias que andam por aí. Queremos mantermo-nos fiéis aos fundamentos. Nalgumas alturas, vemos o mercado demasiado positivo e nós queremos ser cautelosos.

O que queremos ver são provas, aproximarmo-nos da gestão, perceber o modelo de negócio, qual o próximo passo em termos de IA, como estão a mudar a indústria e que decisões vão tomar enquanto empresa. Especificamente no início de um processo de IPO, isto pode mudar. É por isso que nos mantemos à margem e preferimos esperar para ver o que acontece.

Além da Uber e da Lyft, esta cautela também se aplica a outras tecnológicas como a Pinterest, a Slack ou a AirBnB?

Acompanhamos de perto muitas dessas empresas, nalguns casos desde o início. Vamos ver onde vai o mercado… Estão aí alguns nomes muito interessantes e que podem fazer todo o sentido para nós. Não é um processo simples ou fácil.

Fundo já valorizou mais de 20% este ano

Fonte: Dados das 10 maiores participações e do retorno do fundo inteligência artificial da Allianz Global Investors

Desde a criação do fundo que têm dito que as gigantes tecnológicas não só o maior foco, mas neste momento o Facebook é a empresa em que estão mais investidos. O que mudou?

O Facebook caiu muito no ano passado, em abril e maio, e nós sempre dissemos que não havia nada de errado com a empresa, que era uma questão de regulação. Portanto o que fizemos foi comprar de forma agressiva de repente durante uma altura de fraqueza. Mais tarde vendemos e voltámos a comprar outra vez, mas por uma razão diferente. Estamos mais focados em large e mid-caps. Claro que temos alguma exposição a mega-caps, mas de forma muito seletiva e é essa a diferença em relação ao que outros fazem. Normalmente, as FAANG [Facebook, Amazon, Apple, Netflix e Google] não são o nosso foco.

Então porque é que voltaram a entrar no Facebook?

Por razões táticas. Devido à tecnologia e aos projetos de reconhecimento facial que o Facebook está a desenvolver, voltámos a apaixonarmo-nos pela ação. Acreditamos que há empresas maiores que não a tomar as decisões certas neste momento e a reposicionarem os negócios. É uma questão de timing certeiro. Foi essa a razão pela qual decidimos acumular posições maiores.

O top 10 de posições representa no máximo 40% e as primeiras três representam normalmente 5%. Como se pode ver, não temos apostas muito grandes no portefólio. Gerimos um fundo conservador. Somos traders ativos, procuramos oportunidades e temos um método de investimento muito restrito. Se uma ação atinge o preço-alvo, cortamos a posição. É um processo rígido e não nos deixamos levar por esperanças ou fascínios por uma ação. Às vezes funciona a nosso favor e outras vezes não. Discutimos internamente e às vezes até temos clientes que nos dizem que vendemos demasiado cedo, mas não nos importa.

Se uma empresa não muda fundamentalmente, não há razão para não seguir o preço-alvo. Neste momento, temos 70 ações, o que até é pouco comum, mas está relacionado com o grande número de oportunidades nas indústrias que são impulsionadas pela inteligência artificial, o que é positivo.

Além do Facebook, há outra FAANG nas 10 maiores posições. Porquê a aposta na Amazon?

Costumamos dizer que, tipicamente, não somos investidores nas FAANG, mas isso mudou recentemente porque estão a fazer coisas realmente interessantes neste momento. Não mudamos as nossas convicções, mas é uma questão de oportunidade. Tanto com o Facebook, como com a Amazon não há razão para não investirmos quando há uma ótima oportunidade temporária.

Johannes Jacobi, vice presidente da Allianz Global Investors, em entrevista ao ECO - 07MAI19
Hugo Amaral / ECOHugo Amaral/ECO

São investidores de longo prazo da Tesla? Qual é a vossa posição sobre toda a polémica em que a cotada tem estado envolvida, nomeadamente com o regulador?

No caso da Tesla, somos investidores de âncora desde o início. Temos uma relação muito próxima, sabemos muitos detalhes e construímos muito conhecimento sobre a empresa. É isso que nos distingue de outros especialistas. Claro que, por razões de compliance, não sabemos nenhum segredo, mas temos grande experiência com a empresa e conhecemos os gestores. Fundamentalmente, nada mudou. Vemos a Tesla como um grande condutor de inovação na indústria. Não só pelo processo industrial — que é em grande parte e acima da média alavancado em IA –, mas também em termos de produto. A Tesla está a fazer algo bem porque tem acertado há vários anos. Por exemplo, é a primeira empresa a produzir diretamente na China. Ninguém o faz e o mais comum é que haja uma joint-venture com um parceiro local. Não é o caso da Tesla.

Então, o que é que a Tesla está a fazer de errado?

Claramente, a comunicação podia ser melhor. É um pesadelo. Tenho sido questionado recentemente — e houve muitas discussões na equipa sobre isso — se a Tesla seria melhor sem Elon Musk. Chegámos à conclusão que não. Elon Musk é o condutor da inovação. É carismático — apesar de nós não investirmos por ele ser carismático –, mas acreditamos que é o condutor da força da empresa. Não nos deixamos levar por questões pessoais. Mas impressiona-nos a forma como lidera a empresa.

Consideramos que as mudanças legais no board de diretores e na forma de fazer negócios foram boas decisões do regulador. Irá aligeirar o processo e melhorá-lo. É quase certo que veremos novamente questões semelhantes até porque o regulador está a pressionar. E ele [Elon Musk] é uma espécie de míssil desgovernado… Mas, do ponto de vista de investidor, Elon Musk tem sido uma fonte de inovação, impulsiona as pessoas a irem mais longe e a trabalharem melhor. É um processo contínuo. Ainda não acabaram uma tarefa e já estão a trabalhar em duas novas. O que vemos é um fenómeno e apaixonámo-nos pela ação há muitos anos. Criticamente, questionamo-nos e, se olharmos para o histórico do fundo, reduzimos a posição no final do ano passado e voltámos a comprar mais tarde. Vamos ver o que o futuro traz.

Conseguiram antecipar a desvalorização das big tech no ano passado e reduzir as posições antecipadamente?

Sim, conseguimos. Essa foi a principal razão para o nosso sucesso e para a performance no ano passado. Tínhamos uma exposição de 28% ou 29% à indústria de semicondutores. Quando Donald Trump começou a comportar-se como um míssil desgovernado, houve muita volatilidade, especialmente neste setor. Foi assim na maior parte do final do ano passado. Basicamente, mudámos a estratégia e reinvestimos novamente em empresas menos amadas. Esta foi a razão para termos conseguido superar a performance do mercado em 2018, quando houve uma queda, e de o fazermos agora, em que estão a subir. É impressionante e único. Penso que os investidores aperceberam-se e temos tido um grande apetite por este fundo.

E para os próximos meses? Qual é o outlook?

Não é uma questão simples, nem mesmo para nós internamente. Estamos fundamentalmente positivos em relação à situação atual do mercado e não vemos nem bolhas nem nenhum risco maior na nossa direção. Ainda estamos num ambiente relativamente saudável. No entanto, temos um míssil desgovernado que se chama Donald Trump a avançar e recuar nas negociações com o governo chinês, o que é um pesadelo para todos os investidores.

É possível de antecipar? Não, mas penso que Trump já aprendeu a lição e terá de encontrar eventualmente alguma solução. Quando acontecer, será, novamente, positivo para os investimentos no setor tecnológico e particularmente para o nosso fundo. Em comparação com 2018, para já não há grandes diferenças em 2019. É um período de maior volatilidade. Houve um período de seca no final do ano passado, que foi significativo para o nosso fundo. Mas conseguimos recuperar rapidamente — em fevereiro já tínhamos recuperado — e desde então temos subido. Esperamos maior volatilidade, mas de forma geral vemos sinais positivos para os próximos meses e oportunidades para os nossos investidores.

Investimentos do fundo vão além da tecnologia. EUA é a principal geografia

Fonte: Dados da distribuição setorial e geográfica das participações do fundo inteligência artificial da Allianz Global Investors

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