Banco de Portugal cria sistema de alerta para a banca. Preço das casas é um risco

O banco central criou um indicador para medir o risco sistémico da conjuntura económica para a banca. Pela primeira vez, são os preços da habitação que mais contribuem para acumular desequilíbrios.

O Banco de Portugal criou um novo indicador para medir o risco sistémico cíclico na banca portuguesa. E já há resultados. Embora os bancos nacionais estejam mais seguros, pela primeira vez desde 1991, o maior contributo para a acumulação de desequilíbrios surge do aumento dos preços da habitação, que a partir do segundo trimestre de 2015 cresceram acima do rendimento disponível.

Seguindo recomendações europeias, o Banco de Portugal decidiu criar um indicador compósito — na prática um índice composto por vários indicadores com um diferente peso — para medir o risco para o sistema financeiro português da acumulação desequilíbrios, seja ascendentes ou descendentes.

Ou seja, em tempos de crescimento, indicadores como o crescimento do crédito bancário em percentagem do PIB ou do desequilíbrio externo que podem levar a um excessivo endividamento da economia portuguesa – e, claro, dos bancos –, como aqueles que se observaram no seguimento da entrada do euro ou nos anos que antecederam a crise económica e financeira. Em tempo de recessão, demasiada contração do crédito que impede a economia de crescer.

Para isto, o Banco de Portugal decidiu juntar cinco indicadores:

  1. A variação num período de dois anos do rácio entre o crédito bancário e o PIB (vale 45% do total do indicador)
  2. A taxa de variação num período de dois anos do crédito total real, deflacionado pelo índice harmonizado de preços no consumidor (5%)
  3. A variação num período de três anos do rácio entre os preços da habitação e o rendimento (23%)
  4. O rácio entre o défice da balança corrente e o PIB (22%)
  5. A variação num período de dois anos do rácio entre o serviço da dívida e o rendimento

A junção destes indicadores permitiu criar este índice que ajudará (não pode ainda ser lido isoladamente) a perceber se o sistema financeiro português está assumir demasiado risco quando a economia está a crescer ou a ser excessivamente avessa ao risco durante uma recessão, prejudicando ainda mais a economia.

Os técnicos do Banco de Portugal criaram uma série até 1991 e o resultado é uma imagem de excessiva concessão de crédito bancário e acumulação de desequilíbrios externos no período que antecedeu a entrada no euro, no seguimento do processo de liberalização financeira que permitiu um maior acesso ao crédito após a entrada de Portugal na União Europeia e a perspetiva de taxas de juro mais baixas até à entrada no euro. Estas expectativas geraram maior consumo financiado por crédito, levado a uma acumulação de desequilíbrios no sistema.

O abrandamento da economia europeia e o aumento dos preços do petróleo que surgiram no início da década de 2000, também consequência dos ataques de 11 de setembro, levaram a uma redução dos níveis de crédito, mas estes voltaram a crescer de forma menos pronunciada entre 2003 e 2009, altura em que eclodiu a crise financeira mundial.

É a partir desta altura que o risco sistémico cíclico medido por este indicador começou a diminuir de forma pronunciada, mas a correção também foi excessiva, de tal forma que o crédito bancário caiu em percentagem do PIB durante os anos da crise, mesmo com o PIB a cair de forma pronunciada durante os anos do resgate.

À medida que os bancos começam a terminar a reestruturação dos seus balanços e a economia começou a crescer, este risco também começou a diminuir, uma tendência que se mantém até aos tempos atuais — e que o Banco de Portugal espera que continue ao longo deste ano –, mas consigo trouxe também uma novidade: os preços da habitação começaram a crescer de tal forma que passam a contribuir para o aumento do risco.

“A par deste contexto de recuperação no mercado de crédito, o subindicador associado aos preços da habitação, que até 2015 tinha contribuído de forma negativa para a definição do ambiente de risco sistémico cíclico, inverte a sua contribuição, em linha com a recuperação dos preços no mercado imobiliário residencial em Portugal, observada desde o quarto trimestre de 2013, e a evidência de alguma sobrevalorização dos preços em termos agregados, desde o primeiro trimestre de 2018″, diz o Banco de Portugal no relatório de Estabilidade Financeira publicado esta quarta-feira.

Nos gráficos disponibilizados pelo Banco de Portugal, só em 2001 este subindicador contribuiu para aumentar os desequilíbrios, com os preços do mercado imobiliário residencial a crescerem acima do rendimento, mas ainda assim o impacto foi marginal.

A partir de 2015 isso mudou. Este indicador contribui para aumentar os desequilíbrios em sentido contrário aos restantes subindicadores — como o crédito bancário — que compõe este novo indicador, de forma mais pronunciada, e que ainda se deve prolongar ao longo de 2019.

Ainda assim, o Banco de Portugal tenta fazer uma projeção deste indicador para o resto de 2019 e antecipa que este contributo será menor, apesar de continuar a acontecer, devido a alguma moderação que antecipa o mercado imobiliário residencial em Portugal.

“Num contexto de aumento de rendimento disponível e continuação de baixas taxas de juro é de esperar que o índice de preços da habitação continue a crescer acima do índice de preços no consumidor, ainda que se verifique alguma perda de dinamismo no mercado imobiliário residencial. No contexto da recuperação, atual e projetada, do rendimento disponível, a perda de dinamismo dos preços da habitação reflete-se na manutenção do reduzido contributo do rácio entre os preços da habitação e o rendimento para o aumento do risco sistémico cíclico no horizonte de projeção de um ano”, diz o Banco de Portugal.

Para já, mesmo com este contributo do preço das casas, e ligeiramente de um regresso ao desequilíbrio externo, este novo indicador aponta para que o risco continue a reduzir-se, e assim numa confirmação da tendência para o equilíbrio, algo que aconteceu poucas vezes desde 1991, e muito menos numa conjuntura de crescimento económico.

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