Second Home. Uma casa portuguesa onde cabe o mundo inteiro
Conceito londrino inaugurou espaço lisboeta esta semana. Aposta passa por indústrias criativas, parcerias de dentro para fora e muitas atividades fora do horário de trabalho.
O chão amarelo ainda cheira a pintado de fresco. Terça-feira, 6 de dezembro, é o dia dois do Second Home Lisboa. O espaço, que ocupa parte do primeiro andar do Mercado da Ribeira, no Cais do Sodré, em Lisboa, tem vista para o mercado de frutas e legumes. À entrada, duas estantes de livros dão as boas-vindas a residentes e visitantes. No bar, alguns dos primeiros membros fazem os pedidos.
O Second Home Lisboa acaba de abrir portas aos residentes e Rohan Silva, fundador do conceito londrino, está de regresso à cidade. A escolha de Lisboa foi premeditada: Rohan adora boa comida, bom vinho e sol. E a cidade não dececionou. Esta quarta-feira inaugura o espaço — que já está em funcionamento desde o início da semana. Como convidado de honra, o primeiro-ministro António Costa, em representação do Executivo, cujo envolvimento surpreendeu o inglês, que já foi senior policy adviser do ex-primeiro-ministro britânico David Cameron, para a área do empreendedorismo e novas tecnologias.
Criado em parceria com Alexandre Barbosa, da Faber Ventures, o primeiro Second Home em Portugal nasce com base no conceito criado por Rohan Silva, em Londres. O conceito parte da ideia de que é através da reunião de várias indústrias, disciplinas e negócios que nasce a força. “O principal objetivo é o de ajudar as pessoas e os negócios a terem sucesso na economia moderna, desbloqueando o seu potencial criativo, com o apoio de diversas variantes, de forma a potenciar o ecossistema sustentável para o desenvolvimento da economia criativa”, esclarece a empresa em comunicado.
A vinda para Lisboa, avançada pelo TechCrunch, surgiu na sequência de uma ronda de financiamento de 10,7 milhões de dólares, liderada por Yuri Milner, Martin Lau e Index Ventures, anunciada em janeiro deste ano.
Livraria, bar ou espaço de yoga?
No entanto, em Lisboa, Rohan quer ampliar o conceito londrino: apesar de a capital portuguesa ser uma cidade bem mais pequena do que a britânica, o cofundador do projeto acredita que a cidade tem tanto potencial como a equivalente inglesa.
Acreditamos que as reais oportunidades estão dentro da comunidade. E que é por termos grandes e pequenas empresas que surgem as parcerias mais vantajosas.
“A atmosfera de Lisboa é a mesma que em Londres. Há abertura, nunca sabemos no que é que a pessoa ao lado está a trabalhar. Temos de tudo: uma escola de surf ao lado de um dentista, aplicações e serviços mais tradicionais, venture capital”, explica Rohan Silva, acrescentando que entre os critérios de seleção dos membros está uma simples equação: 20% das pessoas ou equipas têm de trabalhar em coisas das quais as restantes organizações possam precisar. Os outros 80% obedecem a um critério simples: maior diversidade possível, que vai desde os estádios de desenvolvimento dos projetos aos setores de atividade em que trabalham.
Entre os membros já confirmados na comunidade lisboeta estão projetos como a venture capital portuguesa Faber Ventures, a agência de marketing digital Monday, o marketplace imobiliário Home Lovers e até o dentista e empreendedor Miguel Stanley, fundador da clínica White Clinics.
Mais do que um cowork
“Acreditamos que as reais oportunidades estão dentro da comunidade. E que é por termos grandes e pequenas empresas que surgem as parcerias mais vantajosas”, defende Rohan. “Sucesso não é só encher o espaço mas ver a criatividade a acontecer. E isso demora, não acontece de um dia para o outro”, explica Rohan Silva.
Além do open space — que conta com as mesas numeradas dos residentes do espaço e com mesas amovíveis no espaço para membros com passe “roaming”, que vão aproveitando o espaço mas mudando de lugares –, o Second Home tem quatro salas de reuniões — disponíveis gratuitamente, uma vez por mês, para os residentes — e até chuveiros.
Uma das apostas da equipa de Lisboa são as atividades pré e pós trabalho. “Incentivamos as pessoas a terem reuniões informais com as respetivas equipas na zona do lounge, de maneira a também poderem cruzar-se com diferentes pessoas”, esclarece. Entre o bar e a zona de trabalho propriamente dita, duas estantes com livros alinhados — resultado da parceria do Second Home com a editora Penguin Books — estão à disposição de todos. “Em Londres temos a nossa própria livraria mas, em Lisboa, todos os livros estão disponíveis para uso e leitura dos nossos membros, uma maneira de mostrarmos a nossa paixão pela cultura e literatura”. E, várias vezes por semana, há aulas de yoga e pilates, e eventos pontuais como manhãs criativas ou provas de vinhos portugueses.
“Um dos princípios distintivos do Second Home tem a ver com o design. No espaço temos mais de mil plantas, que dão alguma privacidade entre os membros e, ao mesmo tempo, criam um ambiente diferente. Trabalhamos de perto com a equipa de arquitetos para podermos criar e otimizar os espaços de trabalho. Queremos estar rodeados pela natureza”, detalha Lucy Crook, responsável pela gestão do espaço em Lisboa. A professora de yoga vai também assegurar as aulas no espaço, uma aposta no wellness dos membros e de quem queira visitar o espaço.
No Second Home Lisboa há espaço para cerca de 200 residentes, que variam entre projetos unipessoais e equipas de até 18 pessoas. A ideia é, quanta maior diversidade, melhor. Mas à entrada, todos são iguais: a apresentação do cartão com o chip é obrigatória para conseguirem entrar no espaço: dependendo do tipo de membro, terão acesso a uma maior ou menor área dentro do espaço e, também, a desfrutar do espaço Second Home em Londres. Existem três modalidades de acesso: Residente (220 euros + IVA por pessoa), Roaming (150 euros + IVA) ou Light Roaming (acesso aos eventos de wellness e à rede de contactos).
Da comunidade internacional do Second Home — fundada a 3 de novembro de 2014 por Sam Aldenton e Rohan Silva — fazem parte empresas globais de rápido crescimento, como a TaskRabbit e Artsy Threads, ou individualidades, como Hans-Ulrich Obrist (Serpentine Gallery), David Rowan (editor da Wired Magazine Europe) e Marina Willer (Pentagram).
Seis números do Second Home Lisboa
- 250 postos de trabalho disponíveis
- Mais de 1000 plantas e árvores
- 500 candeeiros e cadeiras de escritório diferentes, incluindo várias Bauhaus originais
- 2000 livros em português e em inglês na biblioteca
- 4 salas de reuniões privadas
- 1 surf bus que leva regularmente os membros do Second Home à praia para sessões de surf antes e depois do trabalho.
Cinco fundadores da segunda casa de Lisboa
Nem só dos criadores da ideia é a ação de a tornar real. Os primeiros residentes do Second Home Lisboa já estão instalados nas respetivas secretárias. Muitos deles, tão entusiasmados quanto os fundadores para contar a história na primeira pessoa.
Graça Dimas e Maria João Magalhães, Verso da Kapa
Fundaram a editora Verso da Kapa há 12 anos mas, como subcontratam tanto autores como designers, a ideia de estarem num sítio partilhado foi ponto assente para as duas sócias desde o primeiro dia. “Estamos desde ontem, já temos um histórico imenso…”, brinca Maria João. A empresa, que passou por vários espaços partilhados e por muitas salas fechadas, decidiu abrir-se à comunidade. A localização foi um fator preponderante. “Não precisamos de um espaço muito grande. Temos estado sempre nesta zona, entre o Chiado e o Cais do Sodré”, explica Maria João. A grande vantagem do Second Home, no entanto, é outra: “Somos uma empresa de produto e a partilha com outras empresas e outras abordagens é uma enorme mais-valia deste espaço. Isso pode de facto alavancar novas ideias”, garantem.
Tânia Roquette, Full Fabric
Tal como a história do Second Home, a desta startup portuguesa também começa em Londres. Tânia e o sócio, Luís Corrêa d’Almeida, escolheram a capital britânica para arrancarem com o negócio, um software para universidades que gere a relação entre as instituições de ensino e os alunos.
“A empresa começou em Londres mas começámos a recrutar a equipa de programação cá em Portugal. A nível de tecnologia as pessoas são muito boas, tecnicamente, são mais baratas do que em Londres e havia a facilidade da língua portanto, para nós fazia sentido ter cá uma presença”. A ideia deu frutos rapidamente: o primeiro cliente da Full Fabric foi uma universidade portuguesa, facto que reforçou a opção estratégica. “A equipa cá foi crescendo — inicialmente as pessoas trabalhavam remotamente, a partir de casa –e, portanto, tínhamos a necessidade de ter um espaço. Já conhecíamos o Second Home em Londres e, quando vimos que o projeto vinha para Lisboa pedimos logo para ser membros com a equipa cá em Portugal”, conta Tânia, em entrevista ao ECO.
De três em três meses, as equipas de Londres e Lisboa juntam-se: na semana o encontro está marcado para a nova casa da empresa, na capital portuguesa. “O espaço era exatamente o que queríamos: as melhores condições possíveis para os nossos colaboradores serem o mais produtivos possível, gostarem de vir cá e poderem, se quiserem, ler um livro, jogar ping pong ou irem beber um café”, detalha.
Mas as vantagens, considera Tânia, vão além do bem-estar da equipa. “Ontem já começámos a falar com os nossos vizinhos, uma empresa de desenvolvimento web. Por acaso precisávamos de alguém para redesenhar o nosso site, por isso começou logo aí. Tudo se torna-se mais fácil quando trabalhamos no mesmo espaço”, diz.
Gonçalo Costa e Nuno Patrício, Alfazema
“Fotógrafos de dias felizes”, Gonçalo e Nuno dizem que, ao segundo dia, a decisão de se instalarem no Cais do Sodré pode começar a fazer algum sentido. “Estamos num registo startup que acaba por ser auspicioso”, garantem os dois sócios da Alfazema, uma empresa de fotografia especializada em casamentos.
O designer e o fotógrafo decidiram trocar o estúdio de Sobral de Monte Agraço para se instalarem no espaço partilhado do Mercado da Ribeira, em Lisboa. “Acreditamos que por aqui pode acontecer mais qualquer coisa e que as pessoas podem, de alguma forma, partilhar connosco as suas experiências, e nós as nossas com elas”, defende Gonçalo.
A ideia de, como residentes, poderem aproveitar o escritório do Second Home em Londres, foi outra das razões de atratividade. “Gostávamos muito de conhecer a comunidade e, quem sabe, fazer alguns trabalhos em Londres“, garante o fundador da Alfazema, cujo negócio está sobretudo ligado a casais portugueses e estrangeiros que vêm casar a Portugal. “Queremos mostrar-nos dentro da comunidade e beneficiar da localização: que as pessoas nos encontrem, que se reúnam connosco. E, de alguma forma, marcar uma posição dentro do mercado de fotógrafos de casamentos”, explica Nuno Patrício.
João Centeno, Levoo
Se a comunidade é negócio, para a Levoo, essa foi uma das razões de aproximação ao Second Home. A aplicação, criada para simplificar a vida dos clientes da restauração e diminuir o tempo que cada pessoa espera pela sua refeição, é um dos primeiros residentes do espaço de cowork de Lisboa. “Angariamos parceiros de negócio: o restaurante adere, a ementa está na app, o cliente escolhe o menu, seleciona, paga e depois vai recolher a refeição com base numa estimativa de tempo de espera”, explica João.
Coordenador da área operacional, João e a equipa da Levoo decidiram trocar o espaço de cowork que partilhavam, perto do Cais do Sodré, para investirem numa nova localização. “O conceito do Second Home é engraçado. As pessoas que trabalham neste tipo de ambientes são muito app friendly, o que ajuda ao nosso negócio”, explica. “As pessoas vão ouvindo, conversando, e vão-se criando sinergias”.
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