Licenciamento mais rápido, mais imóveis e novos recordes. Isto é o que as imobiliárias querem para 2020

A lista de desejos para 2020 do setor imobiliário é curta, mas objetiva. O setor pede uma "via verde" para o licenciamento, mais oferta a preço de mercado e um 2020 melhor do que 2019.

Depois de terem sido apanhados de surpresa por um Orçamento do Estado (OE) que, dizem, mostra desconhecimento do setor, os líderes das cinco maiores imobiliárias do país continuam à espera de medidas que ajudem verdadeiramente o mercado. Para 2020, têm uma lista de desejos — que pode ser realizada pelo Governo e não pelo Pai Natal. E há, claro, um objetivo comum: superar tudo o que foi feito este ano.

Dizem estar a ser “sugados” e haver uma “ordem clara para castigar o imobiliário”, principalmente depois de um OE que em nada é benéfico para o setor. Sentados à mesa, discutem o futuro e queixam-se da constante mudança de regras, da falta de políticas a longo prazo e da pouca ação do Estado. E o que esperar para 2020? Ao ECO, estes cinco especialistas revelaram os desejos e desafios para o próximo ano.

Mesa redonda de debate sobre a atualidade do Imobiliário em Portugal - 19DEZ19
Da esquerda para a direita: Francisco Horta e Costa (CBRE), Eric Van Leuven (Cushman&Wakefield), Pedro Lancastre (JLL), Paulo Silva (Savills) e Miguel Poisson (Sotheby’s International Realty).Hugo Amaral/ECO

Menos mudança de regras “a meio do jogo”

Um desejo que foi reforçado agora com a proposta do OE para 2020. “No mercado residencial, o aspeto mais negativo que existe hoje em dia no imobiliário é a constante mudança de regras que se está a fazer“, começa por dizer Miguel Poisson, diretor-geral da Sotheby’s International Realty, num debate a cinco organizado pelo ECO. Por “mudanças de regras” refere-se, por exemplo, à penalização do alojamento local nas zonas de contenção e ao aumento da taxa de IMT para transações acima do milhão de euros. Estas alterações, disse, fazem os investidores optar por investir noutros países ao invés de Portugal.

Outra mudança que aconteceu em 2019 e que deixou o setor descontente foram as alterações à lei do arrendamento, sobretudo a questão do direito de preferência. “As alterações à lei do arrendamento foram um atentado ao mercado de arrendamento. Acabaram com o mercado de arrendamento por parte dos privados e dos institucionais, sobretudo dos institucionais”, diz Eric Van Leuven, diretor-geral da Cushman & Wakefield (C&W).

Esta instabilidade afeta-nos, porque apesar de tudo temos um Governo estável, (…) mas depois essa estabilidade de Governo não se traduz na estabilidade das leis.

Pedro Lancastre

Diretor-geral da JLL Portugal

Pedro Lancastre, diretor-geral da JLL, acrescenta que, embora o país tenha um Governo estável, algo que é “vendido” aos investidores, “essa estabilidade governamental não se traduz na estabilidade das leis”.

Uma “via verde” para o licenciamento

“É inadmissível os projetos estarem dois anos para ser licenciados”, refere Francisco Horta e Costa, da CBRE. Apontando o dedo ao Executivo e às autarquias, o especialista explica que “se licenciarem mais depressa, os produtos [projetos imobiliários] chegam cá fora mais depressa, logo os preços também baixam”. “Neste momento, o facto de os projetos estarem a demorar tanto tempo a licenciar, é uma das causas da inflação dos preços da habitação em Portugal”, afirma.

Eric Van Leuven, corrobora e explica que esta demora constante nos licenciamentos se deve “à falta de capacidade”. Uma ideia sustentada também por Miguel Poisson, da Sotheby’s, que acrescenta ainda a “falta de recursos, a falta de eficácia dos recursos que existem e a falta de organização interna e de uma visão estratégica”.

Ainda sobre a lentidão dos licenciamentos, o responsável da C&W refere que, na última década, o país atraiu muitas empresas, especialmente de serviços partilhados, uma indústria que “está em franca expansão”, mas que “precisa de espaço”. “Se estas empresas não se conseguem expandir à medida que necessitam, isso vai claramente impedir algum crescimento”, diz Eric Van Leuven.

Mesa redonda de debate sobre a atualidade do Imobiliário em Portugal - 19DEZ19
Eric Van Leuven (Cushman&Wakefield), Pedro Lancastre (JLL) e, de costas, Paulo Silva (Savills).Hugo Amaral/ECO

Mais diálogo e parcerias com o Governo

É uma queixa comum entre os cinco especialistas, que falam na falta de iniciativa por parte do Governo em reunir-se com as empresas e investidores do setor para perceber a dinâmica e encontrar soluções. “Nós [consultoras imobiliárias] só reagimos, nunca intervimos”, diz Pedro Lancastre, da JLL, apoiado por Paulo Silva, diretor-geral da Savills, que refere que o Governo e as autarquias “desprezam todo o conhecimento” que estas empresas conseguem trazer.

“Não me lembro de ninguém ter sido convidado para determinado fórum organizado pelo secretário de Estado da Habitação para poder discutir, na prática, coisas concretas”, sublinha Miguel Poisson. Francisco Horta e Costa, da CBRE, afirma que “o Estado e as câmaras podiam, em primeiro lugar, sentar-se com os investidores e ouvir o que eles têm para dizer”. “E depois haver um entendimento quanto a um pacote de incentivos para esses projetos, como por exemplo uma “via verde” para o licenciamento, alguma isenção de IMI durante um período alargado, uma revisão do IVA, etc. Ao Estado compete-lhe ajudar estes investidores”.

Houve uma ou outra tentativa de aproximação junto de empresas como a nossa para tentar perceber o que se passa no mercado. Mas foi uma aproximação muito tímida. Muitas vezes legisla-se desconhecendo estas dinâmicas.

Francisco Horta e Costa

Diretor-geral da CBRE Portugal

O responsável da CBRE diz que se deveria “dar as mãos com quem tem dinheiro para fazer estes projetos”, conjugando os interesses dos investidores com os da população. Os cinco lamentam o facto de o Governo e as autarquias não tomarem verdadeiramente essa iniciativa. “Houve uma ou outra tentativa de aproximação junto de empresas como a nossa para tentar perceber o que se passa no mercado. Mas foi uma aproximação muito tímida. Muitas vezes legisla-se desconhecendo estas dinâmicas”.

Contudo, admitem que, dentro do Governo, haverá quem tenha interesse neste tipo de encontros. “Isso também tem a ver com a forma como o Estado está organizado. Penso que até dentro do Estado há gente bem pensante e que gostaria de trabalhar connosco”.

“Mais produto a preço de mercado”

É um problema reconhecido pelo setor e, para 2020, o desejo é vê-lo resolvido. A falta de oferta para tanta procura provoca um aumento dos preços que, embora se estime que cresçam a um ritmo mais lento no próximo ano, continuam altos. Do lado dos escritórios, Eric Van Leuven, da C&W, diz ser “mais difícil transacionar se não há produto”, um problema que já tinha adiantado numa entrevista ao ECO.

Miguel Poisson, da Sotheby’s, espera “mais produto a preço de mercado”, enquanto Pedro Lancastre, da JLL, diz estar curioso por ver “a resposta que as pessoas vão dar à nova construção que está a ser feita de raiz, sobretudo os portugueses”. As expectativas, essas são boas. Mas resta esperar para ver.

Em termos de preços, para 2020 espera-se uma “suavização do aumento dos preços”, tanto a nível nacional como na cidade de Lisboa. Simplificando, os preços “continuar a subir, muito ligeiramente”, diz Eric Van Leuven.

Superar o que foi feito em 2019

O objetivo comum para os cinco profissionais é superar tudo o que o mercado alcançou este ano. Pedro Lancastre, da JLL, explica que o setor imobiliário tem muito peso na economia nacional mas, por vezes, “parece que não é tratado como tal”. Mas a parte positiva é que se está a viver uma “tempestade quase perfeita”, com “ventos muito favoráveis nos últimos três a cinco anos” e uma “invasão de investidores”.

Este ano vai encerrar com números semelhantes aos do ano passado em termos de imobiliário comercial, “acima dos três mil milhões de euros” de investimento. “Se chegarmos a 2020 a fazer tanto como fizemos este ano, seria fantástico. O desafio seria fazer mais”, diz Francisco Horta e Costa. Já do lado da Cushman & Wakefield, Eric Van Leuven espera “fazer o que foi feito num contexto de pouca oferta de escritórios e de investimento”.

Mesa redonda de debate sobre a atualidade do Imobiliário em Portugal - 19DEZ19
Da esquerda para a direita: Miguel Poisson (Sotheby’s International Realty), Paulo Silva (Savills), Eric Van Leuven (Cushman&Wakefield), Francisco Horta e Costa (CBRE) e Pedro Lancastre (JLL).Hugo Amaral/ECO

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