2016: Angola, o ano em que a crise continuou e o FMI não chegou
Angola viu-se obrigada a ajustar, em 2016, mais uns furos nas já apertadas contas, devido à quebra nas receitas com a exportação de petróleo, no ano em que o Presidente confirmou a saída do poder.
Foi um ano em que sindicatos e patronato angolanos convergiram nas preocupações sobre dados do elevado desemprego provocado pela crise económica, financeira e cambial, com o presidente da Associação Industrial de Angola a avançar com um número: pelo menos 60.000 empregos destruídos no último ano.
Só na primeira metade de 2016, segundo dados do Ministério das Finanças, a exportação de petróleo por Angola rendeu menos 5,3 mil milhões de euros, face ao mesmo período de 2015, caindo, na globalidade, para 11,5 mil milhões de dólares (10,7 mil milhões de euros).
Com as receitas fiscais provenientes destas vendas em quebra, para menos de metade, o Orçamento Geral do Estado teve de ser revisto em setembro, descendo a previsão de exportação, em média, de 45 para 41 dólares por cada barril.
O resultado foi uma economia que praticamente parou nos primeiros seis meses, com o Estado a travar obras e pagamentos, uma inflação galopante, que a 12 meses já ultrapassou aos 40%, e o país praticamente sem divisas, também para garantir importações.
Entretanto, Angola fecha 2016 a pagar taxas de juro da dívida pública de cerca de 25% a um ano, endividamento necessário para cobrir o buraco com as receitas do petróleo.
A economia deveria crescer 3,3% em 2016, mas deverá aumentar, com a revisão do Orçamento – que agrava o endividamento público para manter a atividade económica e fomentar o investimento do Estado – apenas 1,1%, enquanto o Fundo Monetário Internacional (FMI) diz que Angola simplesmente não cresce este ano.
O pico da preocupação angolana atingiu-se em abril e a emergência das contas públicas foi tal que o Governo formalizou um pedido ao FMI para um programa de assistência técnica, com um envelope financeiro que podia chegar aos 4,5 mil milhões de dólares (4,2 mil milhões de euros).
A diversificação da economia, para cortar nas importações e aumentar e diversificar as exportações, além do petróleo, foi de resto um tema colocado na agenda nacional pelo Governo, que a inscreveu na estratégia para a “saída da crise”, de potenciar o investimento privado sobretudo com avultados projetos na área da agricultura já conhecidos.
O pedido ao FMI foi feito em abril, mas em junho, já com o barril de petróleo a bater os 45 dólares, máximos do ano, Angola voltaria atrás e prescindia desse apoio e tudo voltou a estar como dantes.
Como resultado da redução das receitas em moeda externa, derivada da exportação de petróleo e do fecho de portas dos bancos internacionais à banca angolana por dúvidas sobre branqueamento de capitais e boas práticas no setor, o kwanza, moeda nacional, voltou a desvalorizar-se em 2016, mais de 18%, face ao dólar norte-americano.
Esta desvalorização soma-se à de 23,4% em 2015, mas o reflexo nos bolsos dos angolanos foi muito superior. Os alimentos, já por si caros, mais do que duplicaram de preço e chegaram mesmo a rarear ou a serem racionados nas grandes superfícies, como o arroz ou o pão. Perante este cenário, o Governo foi levado a definir uma política de vigilância de preços dos produtos da cesta básica, para travar a especulação, com brigadas de fiscalização no terreno.
A taxa de câmbio oficial chegou aos 166 kwanzas (93 cêntimos de euro) por cada dólar, quando antes do início da crise das receitas do petróleo, ainda em 2014, era de 100 kwanzas.
Face à falta de divisas, o mercado de rua tornou-se a única alternativa, até para trabalhadores expatriados que chegam a ter transferências de vários meses de salário para os países de origem em atraso. Na rua, o dólar norte-americano atingiu em junho o pico de 630 kwanzas (3,5 euros).
Embora não haja dados oficiais, só na construção estima-se que milhares de portugueses deixaram Angola em 2016, devido ao contexto económico, agravando a tendência já iniciada no ano anterior.
Só em julho, nos cálculos preliminares do Governo português, estavam contabilizados 160 milhões de euros de salários de trabalhadores cujas transferências estavam em atraso, algumas das quais desde novembro de 2015.
Num segundo ano de forte crise económica e financeira no país, pelo meio, José Eduardo dos Santos ainda teve o desfecho do processo dos 17 ativistas condenados em tribunal a penas entre os dois meses e três meses e os oito anos e meio de cadeia, por atos preparatórios para uma rebelião e associação de malfeitores.
Os elementos deste grupo, incluindo o ‘rapper’ luso-angolano Luaty Beirão, foram libertados no final de junho, por decisão de Tribunal Supremo e posteriormente abrangidos por uma amnistia geral.
Entretanto, um novo caso polémico chegou em dezembro ao mesmo tribunal de Luanda. Envolve 37 pessoas, alegados antigos militares da UNITA, começaram a ser julgados por uma alegada uma tentativa de golpe de Estado, a 31 de janeiro, caso que só agora foi conhecido em detalhe.
A polémica dos tribunais não ficou por aqui, com o Supremo ainda sem tomar uma decisão sobre a providência cautelar interposta em junho por 12 advogados angolanos contra a posse de Isabel dos Santos na presidência da petrolífera estatal Sonangol, por ter sido nomeada pelo Chefe de Estado, que é também pai da empresária, numa alegada violação da Lei da Probidade.
A grande novidade do ano, foi mesmo o anúncio do sucessor de José Eduardo dos Santos. O Chefe de Estado indicou José Lourenço, ministro da Defesa de Angola, para ser o candidato do partido a Presidente da República nas eleições de 2017. Para o número dois da lista do MPLA às eleições gerais de 2017, e candidato a vice-presidente, foi indicado e aprovado na reunião do Comité Central do partido, que se realizou a 2 de Dezembro em Luanda, o nome do atual ministro da Administração do Território, Bornito de Sousa.
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