Jorge Rebelo de Almeida, presidente do grupo Vila Galé, critica a atitude de "empata" dos portugueses. "Devia acreditar-se nos cidadãos, como nos EUA, em que se lhes dá corda", diz, em entrevista.
O presidente da Vila Galé, o segundo maior grupo hoteleiro português, acredita que as empresas com saúde financeira têm a responsabilidade de dar de volta ao país, nomeadamente com investimentos em zonas do país com menor rentabilidade, como o interior. Mas há um entrave à celeridade destes investimentos: os “empatas”. Em entrevista ao ECO, o Jorge Rebelo de Almeida pede que não se trate mal os investidores.
O grupo Vila Galé reforçou, nos últimos tempos, o investimento no interior do país. Porquê esta aposta?Pode parecer uma resposta um bocado demagógica, mas alguém tem de fazer alguma coisa pelo interior do país, e as empresas, quando estão bem, têm algumas obrigações sociais, têm de fazer algumas coisas que sejam de rentabilidade, por vezes, mais duvidosa, mas que fazem falta ao país.
Elvas faz claramente falta ao país. Fomos os únicos candidatos a este projeto e este é um daqueles em que eu teria ficado satisfeito se aparecesse mais alguém. Quase nem me importava de ter feito o papel de lebre para despertar o interesse pelo projeto em Elvas, porque é importante para a cidade e para o interior. Por outro lado, alguém tem de empurrar o negócio para o interior do país, porque o litoral também fica saturado, e temos de fixar as pessoas no interior.
Quais são os maiores entraves a que estes investimentos sejam feitos?São os empatas. Este país continua a viver cheio de gente que tem um prazer tremendo em não só não fazer, como não deixar os outros fazerem coisas. Isto num período em que se fala imenso no Simplex, na facilitação, na desburocratização. É tudo fantasia.
Dou um exemplo: temos um hotel em Cascais que tem 28 anos. Vamos lá fazer um spa. Para aprovar este spa, temos de consultar oito entidades. Já perdi as esperanças de poder fazê-lo nesta época baixa. Vamos ter de adiar o projeto, porque dificilmente toda esta gente se vai pronunciar em tempo oportuno para fazermos obras.
O país precisa de obras e investimentos. É aquele ciclo vicioso: o país precisa de crescimento, para haver crescimento tem de haver investimento, para haver investimento tem de haver investidores, para haver investidores, pelo menos, não os tratem mal. Podemos gostar ou não dos empresários, achar que são malandros, que são bandidos, mas a verdade é que precisamos de alguém que faça coisas, porque, se não, o país não cresce e isto não vai a lado nenhum.
O Simplex não está, de todo, a contribuir para a desburocratização e agilização dos processos?Devia acreditar-se nos cidadãos, como acontece nos Estados Unidos. Quem mijar fora do penico, leva com força e violentamente.
Vou ser o mais sincero possível. As pessoas que fizeram os vários Simplex, desde o meu amigo Sócrates, há muitos anos, fizeram coisas positivas. Mas aparece logo gente a inventar outras complicações, gente a marcar território e a não deixar que as coisas sejam rápidas.
Há um projeto que começámos no Cais da Pedra, no Porto, uma obra difícil, que vai apanhar lodo. Podíamos ter feito as obras com tempo seco. Mas embrulharam-nos de tal forma o processo que só agora é vamos ter licença para avançar. E porquê? Porque, durante, o mês de agosto, não havia ninguém para assinar um papel.
Devia acreditar-se nos cidadãos, como acontece nos Estados Unidos, em que se lhes dá corda. Quem mijar fora do penico, leva com força e violentamente. Aqui em Portugal, está-se sempre a desconfiar de tudo e mais alguma coisa e ninguém pode avançar com nada.
Quanto é que vão investir no interior?Em Elvas, vamos fazer um investimento na ordem dos cinco milhões de euros. Será um hotel com 64 quartos e vai ser uma homenagem às fortificações militares portuguesas. Vamos contribuir para revitalizar uma cidade como Elvas e, de caminho, até estou convencido que vamos ganhar algum dinheiro. O risco é mais elevado. Se tivermos uma empresa com a corda na garganta, não podíamos dar-nos ao luxo de fazer isso, mas podemos dar-nos ao luxo de fazer algumas coisas que acho que vão revitalizar uma cidade.
Em Braga, vamos investir à volta de seis milhões e vamos homenagear a arquitetura religiosa da cidade, fazendo também referência à evolução histórica de Portugal.
Onde investimos mais este ano, cerca de sete milhões de euros, foi em renovações. No Brasil vamos investir 15 milhões de reais [4,2 milhões de euros] em renovações.
Essa aposta no Brasil acontece numa altura em que o país está numa crise económica profunda. Esta crise não tem impacto, vão continuar a investir?O Brasil atingiu um ponto em que a sua leveza roça a irresponsabilidade.
Nós temos uma vantagem: temos o vício de fazer investimento. Houve um número impressionante de empresas internacionais que não se deram bem no Brasil, mas nós temos um balanço positivo, ainda que sofrido. Uma das coisas que aprendi é que o Brasil é um país leve, é um país feliz. Nós, portugueses, devíamos ir de férias para lá para aprendermos a ser felizes e menos complicados. Mas, a certa altura, atingiu um ponto em que a sua leveza roça a irresponsabilidade. E isso está a notar-se agora, mas o nosso foco no Brasil foi uma aposta certa. Foram os resorts, talvez a área onde temos mais experiência.
E o Brexit, teve impacto nas contas da Vila Galé?Os ingleses são os nossos melhores clientes. Continuam e vão continuar a ser, com ou sem Brexit.
Nem dá para notar. Os britânicos são um povo pelo qual tenho uma certa simpatia, aqui em Portugal os ingleses são os nossos melhores clientes. Continuam a ser e vão continuar a ser, com ou sem Brexit. Ao longo destes anos, o Reino Unido já passou por muitos problemas, agora vão ter mais complicações. Mas o mercado britânico é gente que tem uma fidelização muito grande a Portugal, porque nós também somos muito anglófonos.
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“Portugal está cheio de gente com um prazer tremendo em não fazer e não deixar fazer”
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