Banco de Portugal prevê recessão que pode chegar a 5,7% do PIB
O banco central divulgou esta quinta-feira o boletim económico de março onde atualiza as previsões já incorporando o impacto económico provocado pelo coronavírus. E confirma: vem aí uma recessão.
Não há volta a dar: a economia portuguesa vai entrar em recessão, antecipa o Banco de Portugal. O PIB poderá encolher até 5,7% este ano por causa do impacto do coronavírus, prevê o banco central no boletim económico de março divulgado esta quinta-feira.
Neste boletim, o banco central apresenta dois cenários. O primeiro, o cenário base, assume que o impacto económico da pandemia é “relativamente limitado” e antecipa uma contração de 3,7%. Já o segundo, o cenário adverso, assume que o impacto é “mais significativo devido à paralisação mais prolongada da atividade económica em vários países” e antevê uma queda do PIB de 5,7%.
“As perspetivas para a economia portuguesa deterioraram-se abrupta e significativamente em resultado do impacto da pandemia Covid-19”, explica o banco central em comunicado, assinalando que “a pandemia corresponde a um choque económico adverso com efeitos muito significativos e potencialmente prolongados no tempo em termos do bem-estar dos cidadãos e da atividade das empresas”. A concretizar-se o cenário adverso, o PIB português irá cair mais do que no pior ano da crise financeira: em 2012, o PIB caiu 4%.
Esta “incerteza exacerbada e a complexidade” da situação levaram o Banco de Portugal a elaborar dois cenários dado que não é “possível apresentar um cenário mais provável”. “As projeções procuram ter em consideração o potencial impacto das políticas adotadas pelas autoridades nacionais e europeias em face do choque”, explica o banco central. No entanto, é certo que “ambos os cenários contemplam uma recessão da economia portuguesa em 2020” e que o pico do choque aconteça no segundo trimestre, iniciando-se uma recuperação no segundo semestre.
Em dezembro de 2019, a última vez que atualizou as suas previsões, o Banco de Portugal antecipava um crescimento do PIB de 1,7%, após ter crescido 2,2% em 2019, 2,6% em 2018 e 3,5% em 2017. Mas tudo mudou desde então com a propagação do coronavírus, o que obrigou à (quase) paralisação da economia. Para combater este “choque”, o governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, já defendeu a emissão de eurobonds, títulos de dívida comunitários.
Esta quarta-feira, o ministro das Finanças admitiu que o país tem de se preparar para enfrentar uma recessão. São já muitas as previsões — que têm pressupostos diferentes — que apontam para uma recessão: no cenário otimista, o NECEP prevê uma contração de 4%; o Fórum para a Competitividade aponta para uma queda entre 1 a 2%; e um estudo da IESE Business School aponta para os 2,9%.
Taxa de desemprego sobe para os 10,1% no cenário base
Caso a economia encolha 3,7%, como prevê o cenário base, a taxa de desemprego, que está atualmente na casa dos 6%, irá subir para os 10,1%, antecipa o banco central, projetando uma queda do emprego de 3,5%. “A evolução projetada para o desemprego depende crucialmente da configuração e magnitude das medidas de política que possam ser implementadas de imediato”, nota.
E o que vai levar à queda do PIB? O Banco de Portugal espera que o consumo privado se reduza em 2,8% este ano, refletindo um aumento de poupança das famílias face ao “ambiente de grande incerteza” e a “ligeira queda do rendimento disponível real”. Esta queda é mitigada pelas medidas que o Governo já anunciou, “antecipando-se um aumento significativo das transferências públicas para as famílias em 2020“, o que levará a um crescimento do consumo público na ordem dos 2,1%.
A maior “pancada”, como lhe chamou António Costa, pelo menos em termos percentuais, será no investimento. A formação bruta de capital fixo deverá cair 10,8%, “devido à forte redução do investimento empresarial e, em menor magnitude, do investimento residencial”, explica o BdP. Será também a incerteza a condicionar o investimento das empresas.
Com a recessão quase certa a nível mundial, também as exportações de bens e serviços vão cair a pique (-12,1%), assim como as importações (-11,9%). O destaque (pela negativa) vai para as exportações de turismo e transportes serão “fortemente afetadas pelas limitações à movimentação de pessoas e deverão registar uma queda acentuada”. Como a evolução das exportações e das importações é semelhante, as contas externas deverão continuar positivas também num ano em que beneficiarão da diminuição do preço do petróleo.
Para a evolução dos preços, o banco central assume que “prevalece algum efeito descendente sobre os preços” dada a natureza desde choque, levando a taxa de inflação a permanecer “em níveis baixos ao longo de todo o horizonte de projeção: 0,2% em 2020, 0,7% em 2021 e 1,1% no último ano do horizonte”.
Exportações encolhem 19,1% em 2020 no cenário adverso
Caso o PIB encolha 5,7%, como prevê o cenário adverso, as exportações de bens e serviços deverão cair 19,1% dado que a recessão global e o “colapso” do comércio mundial vão tirar muita da procura externa dirigida à economia portuguesa. Da mesma forma, as importações deverão cair 18,7%. A queda simultânea das exportações e das importações permitirá também manter as contas externas positivas.
A taxa de desemprego, que está atualmente na casa dos 6%, irá subir para os 11,7%, antecipa o banco central, esclarecendo que este cenário incorpora uma “maior destruição de capital e perda de emprego” assim como “uma maior incerteza e níveis de turbulência mais significativos nos mercados financeiros”.
E o que vai levar à queda do PIB? O Banco de Portugal espera que o consumo privado se reduza em 4,8% este ano. “As famílias reduzem mais significativamente as despesas de consumo num cenário de maior incerteza, caracterizado também por uma maior queda do emprego, níveis mais elevados da taxa de desemprego e condições financeiras mais desfavoráveis”, antecipa. Além disso, o investimento levará um tombo de 14,9%.
Neste cenário, haverá deflação em 2020. “A taxa de inflação permanece em níveis ainda mais baixos ao longo de todo o período, prevendo-se que se situe em -0,1% este ano, 0,5% em 2021 e 0,7% em 2022”, esclarece ainda o comunicado.
BdP alerta que não podem ser excluídos cenários ainda mais adversos
Apesar de apresentar dois cenários para a situação atual, o Banco de Portugal explica, tal como têm feito as instituições ou economistas que já avançaram com previsões, que a elevada incerteza permite ter muito poucas certezas. “Atendendo às condições de partida e à incerteza que envolve a crise em curso, não podem ser excluídos cenários ainda mais adversos“, alerta.
O banco central adverte também que Portugal tem, neste contexto, “vulnerabilidades específicas”, desde logo por causa da importância do setor do turismo, o que “implica uma elevada exposição à redução esperada da procura global deste tipo de serviços, que será muito significativa”.
“Um choque económico desta dimensão coloca também dificuldades acrescidas ao tecido empresarial, dominado por empresas de pequena dimensão e com situação financeira relativamente frágil”, afirma o BdP. E as famílias não estão melhor dado que existe uma “elevada” percentagem destas que está perto ou abaixo limiar de pobreza, o que faz com que tenham uma “reduzida margem de absorção do choque” no seu rendimento.
“A crise desencadeada pelo novo coronavírus constitui um inédito e sério desafio às diversas políticas económicas, que deverão dar prioridade à resposta de curto prazo ao impacto provocado pela pandemia, mas as considerações de médio prazo deverão também ser tidas em conta”, aconselha o Banco de Portugal, pedindo novamente uma coordenação a nível europeu com a “necessária solidariedade e a adoção de políticas partilhadas a nível europeu”.
A mensagem final é de esperança: “Em Portugal, tal como em crises passadas, os agentes económicos e a sociedade em geral saberão solidariamente ultrapassar a atual situação de emergência, devendo retirar-se os ensinamentos que permitam um melhor desempenho no futuro, num quadro de cooperação europeia e internacional”.
(Notícia atualizada às 13h40 com mais informação)
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