Vítor Gaspar defende investimento público mas avisa países endividados
Diretor de Assuntos Orçamentais do FMI defende que a retoma pós-Covid-19 deve incluir investimento público, mas, no caso de países endividados, com cuidado.
O diretor de Assuntos Orçamentais do Fundo Monetário Internacional (FMI), Vítor Gaspar, defendeu, juntamente com dois economistas do seu departamento, que a retoma pós-Covid-19 deve incluir investimento público, mas, no caso de países endividados, com cuidado.
“Quando o ‘Grande Confinamento’ finalmente terminar, uma recuperação económica forte que beneficie todos vai depender de redes de apoio social melhoradas e apoio orçamental de base alargada. Isto inclui investimento público em cuidados de saúde, infraestruturas e alterações climáticas”, pode ler-se num artigo coassinado pelo antigo ministro das Finanças (2011-2013) do governo de Pedro Passos Coelho (PSD/CDS-PP).
O artigo publicado no blogue do FMI, que conta com a colaboração dos economistas W. Raphael Lam e Mehdi Raissi, adverte, no entanto, que “países com altos níveis de dívida vão ter de equilibrar cuidadosamente apoios orçamentais de curto prazo, para a fase de recuperação, com a sustentabilidade da dívida a longo prazo”.
Entre as medidas de investimento público, o documento coassinado pelo antigo ministro das Finanças assinala que “uma boa rede de proteção social” deve “providenciar cobertura alargada e benefícios adequados para grupos vulneráveis de uma forma progressiva – isto é, benefícios mais generosos para os mais pobres”.
Essa rede deve também “preservar incentivos ao trabalho e ajudar os beneficiários a encontrar trabalho, obter cuidados de saúde e acesso à educação e formação”, bem como evitar “uma rede complexa de programas de proteção social que acabem por ser mais caras de gerir e não beneficiem as pessoas de uma forma justa e consistente”.
Nas economias avançadas, como é o caso de Portugal, de acordo com a categorização do FMI, “os governos podem melhorar as redes de apoio social cobrindo mais pessoas nos programas já existentes e melhorando o impacto que os benefícios têm na vida das pessoas”.
Relativamente ao investimento público, os economistas assinalam que nos próximos 20 anos as necessidades de financiamento, para além de infraestruturas, cuidados de saúde e alterações climáticas, serão necessários 20 biliões de dólares (cerca de 18,3 biliões de euros) de investimentos.
Em economias avançadas pouco endividadas, como a Alemanha, a Holanda ou a Coreia do Sul, o investimento é frutífero “porque o valor dos ativos resultantes provavelmente excederá os passivos dado o quão baixas estão as taxas de juro”, algo que “aumenta o valor líquido do setor público”.
“Países com menos espaço de manobra no que concerne a gastos, como a Itália ou Espanha, podem redirecionar as receitas e despesas para aumentar o investimento”, assinalam os três economistas.
Segundo o artigo, a gestão do investimento com a sustentabilidade da dívida “é um ato de equilíbrio delicado”, num contexto em que a pandemia de Covid-19 viu “um grande aumento nos défices orçamentais e nos rácios de dívida” dos Estados.
“À medida que a pandemia se abate e a economia recupera, os rácios da dívida dos governos devem estabilizar, ainda que em novos níveis altos. Se a recuperação demorar mais do que o esperado, as dinâmicas da dívida podem ser mais desfavoráveis”, pode também ler-se no documento.
O “Grande Confinamento” levou o Fundo Monetário Internacional (FMI) a fazer previsões sem precedentes nos seus quase 75 anos: a economia mundial poderá cair 3% em 2020, arrastada por uma contração de 5,9% nos Estados Unidos, de 7,5% na zona euro e de 5,2% no Japão.
Para Portugal, o FMI prevê uma recessão de 8% e uma taxa de desemprego de 13,9% em 2020.
Investimento público de 0,6% do PIB na UE aumentaria produto em 0,7% ao ano
O Fundo Monetário Internacional (FMI) projeta que caso a União Europeia (UE) investisse 0,6% do seu Produto Interno Bruto (PIB) em infraestruturas e descarbonização, observaria um aumento médio anual de 0,7% do PIB durante 20 anos.
“Um aumento sustentado do investimento público de 0,6% do PIB da UE em infraestrutura e descarbonização aumentaria o produto da UE por 0,7% por ano, em média, num horizonte de 20 anos”, pode ler-se no capítulo dois do Monitor Orçamental do FMI, divulgado esta quarta-feira.
De acordo com os técnicos do fundo, “um aumento do investimento público também aumentaria a inflação inicialmente, subiria as taxas de juro de longo prazo de forma modesta, e resultaria num aumento modesto do rácio da dívida sobre o PIB” da União Europeia.
“No entanto, se estiverem ligados [ao investimento] obstáculos no lado da oferta e à capacidade de absorção de constrangimentos (em qualificações, instituições e gestão), a eficiência do investimento será menor”, alerta o FMI.
Nesse caso, as consequências do investimento público seriam menores no crescimento económico e na inflação, “com pouco apoio à política monetária para atingir os objetivos da inflação”, algo que levaria também “a um grande aumento nos rácios da dívida face ao PIB”.
“O pacote de investimento público na UE aumenta a inflação por 0,4 pontos percentuais no primeiro ano, e os efeitos diminuem com o tempo”, pode também ler-se num anexo estatístico à publicação do FMI.
No mesmo anexo, os técnicos da instituição sediada em Washington consideram que, “na assunção de um investimento público eficiente, o rácio da dívida pública face ao PIB aumenta ligeiramente menos que 2% do PIB”.
Já no cenário de um investimento público ineficiente, a dívida “aumenta quase 6% do PIB”, de acordo com os cálculos das equipas do FMI.
O fundo lembra que os cálculos por si efetuados incluem o programa de investimento público já anunciado pela Comissão Europeia, “que propôs mobilizar e depois gastar um bilião de euros para investimento sustentável no período 2021-2027 – assumindo um grande cofinanciamento nacional, empréstimos subsidiados do Banco Europeu de Investimento e investimento do setor privado”.
“A alocação do orçamento da UE é cerca de 0,25% do PIB por ano, que é usado nas simulações. Adicionalmente, o pacote inclui um aumento inicial de 0,35% do PIB da UE em infraestruturas, refletindo o plano da Comissão Europeia para aumentar o investimento público em geral na próxima década”, detalham os técnicos do FMI.
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