Taxa sobre combustível dos aviões em estudo. Companhias aéreas europeias enfrentam fatura de 6,3 mil milhões

Se começar a tributar a aviação nacional, até 2030 Portugal poderá gerar receitas acima de três mil milhões de euros. A redução de emissões poderia chegar a 4,6 milhões de toneladas de CO2.

As contas já estão feitas: se os 27 Estados-membro da União Europeia aprovassem em unanimidade a criação de um novo imposto sobre o combustível que as companhias aéreas gastam nos seus aviões, isso podia gerar receitas anuais de 6,3 mil milhões de euros, revela o mais recente estudo divulgado esta quarta-feira pela Transport&Environment (T&E), que coordena a Coligação Internacional para a Aviação Sustentável (ICSA).

Mas tendo em conta que um “sim” a uma só voz, pelos 27, seria mais complicado de obter, o mesmo documento revela, no entanto, que não há obstáculos legais à possibilidade de vários países europeus se unirem para tributar o combustível da aviação através de acordos multilaterais.

E dá mesmo um exemplo concreto: um acordo entre os países e regiões que mais gases poluentes emitem na Europa — Alemanha, França, Itália, Península Ibérica (Espanha e Portugal), Benelux (Bélgica, Países Baixos e Luxemburgo) e países nórdicos (Suécia, Dinamarca e Finlândia) — podia resultar em receitas anuais de 4,1 mil milhões de euros por ano e abranger 66% da poluição proveniente de voos na Europa, se passar a ser tributado o combustível da aviação.

Estes cálculos foram feitos com base na nova ferramenta online da T&E — Aviation Tax Tool — que permite calcular o impacto da introdução deste imposto em vários cenários possíveis. Neste cenário específico, o simulador apresenta as receitas geradas em 2030 com base numa taxa de 0,33 euros por litro de combustível queimado em voos entre Alemanha, França, Itália, Portugal, Espanha, Holanda, Bélgica, Luxemburgo, Suécia, Dinamarca e Finlândia, regiões ultraperiféricas excluídas.

Taxar aviação pode render mais de 3.000 milhões a Portugal até 2030

Fazendo também uso da calculadora da T&E, a associação ambientalista Zero estimou que entre 2021 e 2030, Portugal poderá gerar receitas acima de três mil milhões de euros se tributar a aviação nacional, seis vezes mais face ao valor do Fundo de Transição Justa da UE destinado a Portugal. O país é o sexto da UE com maiores emissões intraeuropeias da aviação. Em 2018, foi responsável pela emissão de 1,58 milhões de toneladas de dióxido de carbono, correspondendo a 5% do total das emissões intraeuropeias na UE 27, excluindo voos domésticos e para regiões periféricas, como por exemplo a Madeira e Açores. Dependendo dos cenários de tributação avaliados, a redução de emissões seria entre 2 e 4,6 milhões de toneladas de dióxido de carbono.

Perante este cenário, a Zero pede ao Governo uma estratégia para para tributar a aviação, que não poderá passar apenas por uma compensação pelos danos associados ao clima. Além disso, o novo mecanismo fiscal deve reduzir o aumento da procura pós-crise e também permitir ao Governo português assegurar o financiamento necessário para intervenções ambientais. Quanto à TAP, a associação ambientalista diz que “é inadmissível o enorme apoio, sem se começar a tributar a aviação”, sendo que “o Governo ainda não anunciou qualquer contrapartida ambiental no âmbito do empréstimo” à empresa.

A TAP pediu 1.500 milhões de euros de ajuda ao Governo, mas o que ficou acordado foi um pacote máximo de 1.200 milhões (950 milhões já este ano). O ministro do Ambiente e Ação Climática já garantiu que o plano de apoio à companhia aérea “terá critérios ambientais”. Miguel Cruz, secretário de Estado do Tesouro, também já confirmou a existência de requisitos ambientais, “nomeadamente, um conjunto de metas a cumprir do ponto de vista das emissões”.

No Parlamento, e em resposta ao PAN, Miguel Frasquilho, presidente do conselho de administração da TAP, sublinhou a renovação e modernização da frota: cerca de 70% ao longo dos últimos anos. “A TAP apresenta indicadores ambientais muito interessantes em termos da eficiência ao nível do combustível, emissões de CO2 e emissões de CO2 por passageiros. Nos últimos anos, as poupanças destas vertentes situam-se na casa dos dois dígitos. A substituição de aeronaves mais antigas por mais recentes e eficientes faz com que estes indicadores comparem muito bem em termos internacionais”, disse o gestor.

Emissões da aviação europeia cresceram quase 30% desde 2013

Antes de verem as suas frotas de aviões presas no solo, por causa da pandemia global de Covid-19, as companhias aéreas europeias aumentaram as suas emissões em 1,5% e bateram recordes na quantidade de gases poluentes lançados para a atmosfera em 2019. Das 20 mais poluentes na Europa, 15 aumentaram os níveis de poluição no ano passado: juntas, emitiram um milhão de toneladas extra de CO2. A low cost britânica Jet2 foi a pior, com uma subida de 10% nas emissões, seguida pela Finnair, DHL Deutsche Post, Air France. A Ryanair e a Easyjet poluíram mais 5,9% e 4,1%, respetivamente, em 2019.

Desde 2013, as emissões das empresas europeias de aviação aumentaram 27,6%, superando qualquer outro tipo de transporte. Globalmente, a aviação é responsável por 5% do aquecimento global. “As emissões das companhias aéreas continuaram sua trajetória ascendente, enquanto outros setores continuaram a descarbonizar. Essa tendência será retomada após a crise, a menos que os governos ajam agora para controlar sua poluição”, defendeu Andrew Murphy, especialista em aviação da Transport&Environment (T&E).

Ainda assim, e ao contrário do que acontece quando atestamos o depósito do carro na bomba (onde mais de 50% do preço final são impostos), as companhias aéreas não pagam taxas quando compram combustíveis para os seus aviões. Agora, com as empresas do setor a dependerem de ajudas estatais para retomarem a sua atividade pós-confinamento, são cada vez as vozes que se levantam para defender a criação de um novo imposto para a aviação, que incida sobre o jet fuel consumido.

Neste momento, as companhias aéreas estão à espera de pacotes de resgaste no valor de mais de 33 mil milhões de euros por parte dos governos de vários países europeus, na maioria dos casos sem condições ambientais vinculativas, refere o estudo. “As empresas pedem milhões, mas pagam poucos impostos. É insustentável. Num momento em que os governos europeus estão a injetar quantias de dinheiro sem precedentes em planos de recuperação, o fim da isenção dos impostos sobre a aviação abrirá um fluxo de receita há muito necessário”, disse em comunicado Jo Dardenne, especialista em aviação da Transport&Environment (T&E).

E acrescentou: “O absurdo das companhias aéreas que não pagam impostos sobre seu combustível tem de parar, por causa do clima e dos cofres públicos. Os países europeus não têm de esperar pela aprovação unânime da UE e podem chegar já hoje a acordo para tributar a poluição das companhias aéreas e impedir que as emissões recuperem”. Este responsável sublinhou ainda que “embora as emissões das companhias aéreas caiam este ano devido à Covid, espera-se que elas recuperem assim que a crise de saúde mundial tiver passado”.

Dados da indústria e exemplos do passado mostram que o número de passageiros bateu sempre recordes após vários os choques globais, como a crise financeira de 2008, os ataques de 11 de setembro de 2001, a Guerra do Golfo e o anterior surto de SARS.

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