Os 590 milhões da “fraude democrática” do PSD voltam a aparecer no OE de 2021

No relatório do Orçamento do Estado para 2021, o Governo volta a assumir que haverá 590 milhões de euros de despesa que não irá ser executada. No OE 2020, o PSD acusou Governo de "fraude democrática".

O défice orçamental de 4,3% do PIB que o Governo prevê na proposta do Orçamento do Estado para 2021 (OE 2021) volta a assumir, tal como o OE 2020, que haverá 590 milhões de euros de despesa que não será executada. Este montante causou polémica ao ter sido criticado pelo presidente do PSD, Rui Rio, que apelidou esta prática orçamental de “fraude democrática”.

“O saldo da Administração Central em contabilidade nacional parte dos limites máximos da despesa fixados em contabilidade pública para se obter uma estimativa que inclui um diferencial de 590 milhões de euros, diferindo assim do apresentado no «Anexo A1. Conta das Administrações Públicas na Ótica da Contabilidade Nacional e da Contabilidade Pública por Subsetor»”, lê-se no relatório entregue pelo Ministério das Finanças esta segunda-feira.

Caso este montante fosse contabilizado, o défice de 2021 seria maior. O ECO questionou o Ministério das Finanças sobre se este número se trata de uma gralha do relatório uma vez que é igual ao do OE 2020 (ou se é apenas uma coincidência) e recebeu uma resposta após a publicação deste artigo: “Não se trata de qualquer gralha. Os 590 milhões de euros de ajustamento aos limites da despesa em contabilidade pública são coincidentes com o OE 2020 e OE 2019“, esclareceu fonte oficial. No OE 2019, o diferencial assumido pelas Finanças também era de 590 milhões de euros.

Esta é uma questão técnica que foi alvo de polémica política pelo menos nos dois últimos Orçamentos uma vez que tanto à direita como à esquerda os partidos queixam-se de que o Governo não executa a despesa para a qual pede autorização ao Parlamento. Isto porque os deputados apenas autorizam os tetos de despesa em contabilidade pública e não as metas do défice (em contabilidade nacional) que o Governo fixa, para as quais conta com gastos inferiores ao máximo autorizado.

No OE 2020, foi Rui Rio quem insistiu no assunto, acusando Mário Centeno, então ministro das Finanças, de “falta de transparência”. “Ou aquilo que vai ser aprovado pela Assembleia da República vai ser executado e as contas não vão ter superávite, mas um pequeno défice, ou então há parte da despesa que, desde já e à partida, não vai ser executada para lá de outras cativações que o ministro das Finanças entenda fazer”, disse Rio no ano passado. A UTAO também se juntou ao coro de críticas, tendo argumentado que “o indício de sobre-orçamentação contraria o princípio da transparência”.

Em causa está a diferença no saldo de contabilidade pública em dois quadros diferentes do mesmo OE. No quadro da página 92 do relatório em que se passa da contabilidade pública à contabilidade nacional (ótica que interessa a nível internacional para o cálculo do saldo orçamental), o Governo prevê que o défice em contabilidade pública seja de 10.560 milhões de euros em 2019. Contudo, no quadro da página 354, também relativo à contabilidade pública, o Executivo prevê que o défice seja de 11.150 milhões de euros.

Ou seja, na prática, o Governo para calcular o défice em contabilidade nacional parte de um défice em contabilidade pública que fica aquém das autorizações de despesa que pede ao Parlamento. Assim, chega-se à diferença de 590 milhões de euros que o próprio Ministério das Finanças assume no rodapé do primeiro quadro. No passado, as Finanças já explicaram que esta diferença é essencial para a gestão do Orçamento e que já se verificava em orçamentos anteriores. Caso contrário, a probabilidade de serem necessários Orçamentos Retificativos era maior por diversas razões, desde logo porque o Estado não controla a receita que arrecada, só a despesa que faz.

No meio da discussão dos últimos anos, o Conselho das Finanças Públicas tomou uma posição intermédia. De acordo com o Jornal de Negócios, a entidade liderada por Nazaré Costa Cabral realçou o papel importante das cativações como instrumento de controlo orçamental e admitiu a “necessidade de inscrever dotação que depois não é realizada porque os contratos não são celebrados, ou a dotação que está prevista não é gasta na integralidade”. Contudo, pediu moderação no seu uso, notando que “há uma crescente diferença final entre estes valores”.

(Notícia atualizada às 13h58 de 14 de outubro com a resposta do Ministério das Finanças)

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