“Há moda 100% sustentável a ser criada e produzida a partir de Portugal”
Este "segredo" nacional estará em destaque na conferência Sustainable Fashion Business, com exemplos de "criadores e marcas em busca de soluções sustentáveis e cadeias de valor transparentes" no país.
Alan Crocetti é um nome incontornável no design de joias e as suas criações de luxo são usadas por famosos como o rapper Travis Scott ou as cantoras Miley Cyrus e Dua Lipa. O que eles podem não saber, quando posam com uma das joias de Crocetti para a capa da Vogue Internacional, ou de outra revista de moda, é que o criador brasileiro passa quatro meses por ano em Gondomar, a desenvolver as suas coleções, com uma pequena indústria portuguesa de ourivesaria, e as peças a serem criadas em conjunto com o próprio artesão.
O mesmo acontece muito provavelmente com quem usa os pijamas e as toalhas da marca Tommy Hilfiguer, produzidos em Portugal pela Scoop a partir de excedentes de tecidos de coleções anteriores, num processo de upcycling.
Estes são apenas alguns dos exemplos do que de melhor se faz por cá em termo de moda sustentável, na opinião de Catarina Santos Cunha, CEO da Kind Purposes e project leader da conferência internacional Sustainable Fashion Business, que tem lugar esta sexta-feira no âmbito da Lisboa Capital Verde Europeia.
“As grandes marcas de moda conhecem as mais-valias de Portugal na produção sustentável. Estamos na vanguarda e ninguém sabe. O país tem de mostrar que está alinhado com a moda responsável a nível social e ambiental. É um local onde se produz moda de forma sustentável e por isso procurado pelas grandes marcas internacionais, onde há oportunidade de negócio. É isto que vamos mostrar na conferência”, disse Catarina Santos Cunha em entrevista ao ECO/Capital Verde.
A organizadora do evento, que foi desafiada pelo vereador da Câmara Municipal de Lisboa, José Sá Fernandes, a desenvolver um projeto relevante para o futuro da moda e dos têxteis em Portugal, expondo os casos de sucesso internacional e desconhecidos a nível nacional, explica que o principal objetivo da conferência Sustainable Fashion Business é “celebrar Portugal como o melhor local para desenvolvimento e produção das marcas de moda internacionais, que procuram para os seus negócios soluções sustentáveis e cadeias de valor transparentes. Para isso será apresentada uma seleção de casos de marcas e negócios, que demonstram o sucesso por trás do made in Portugal”.
Catarina Santos Cunha garante que Portugal tem um “segredo” que ninguém sabe: “No Norte estamos neste momento a trabalhar grandes marcas internacionais na vertente de sustentabilidade e as pessoas não conhecem minimamente estes projetos. Há moda 100% sustentável a ser criada e produzida a partir de Portugal e é um negócio em que temos de apostar”.
O motor desta “revolução”, garante, é o consumidor. “É quem manda. Há cada vez mais consumidores preocupados em conhecer a origem e o caminho da sua roupa. Questionam tudo e começaram a questionar a moda também, o que força toda a indústria a ajustar-se. Inicialmente a moda sustentável era um nicho de mercado muito reduzido, mas hoje já não. As grandes marcas estão a dar resposta a essa realidade, mas reagem mais lentamente. Por isso há cada vez mais projetos e um crescimento das marcas independentes”, avalia a líder de projeto. Na sua opinião, no futuro já nem sequer se falará em sustentabilidade no mundo da moda porque “vai ser algo normal”.
Quanto aos preços e ao tabu de que o sustentável é caro, Catarina Santos Cunha diz que existe e que “há quem se aproveite disso para subir os preços. Mas depende acima de tudo do comportamento do consumidor. Precisamos mesmo de 10 t-shirts a 1 euro? Podemos ter 2 ou 3 melhores, que sabemos como foram feitas, de onde vêm”.
Consumidores querem estar na moda e serem sustentáveis
Na base da conferência Sustainable Fashion Business está a premissa de que a indústria da moda é muito mais do que roupa, sapatos ou acessórios. Este é um setor económico de peso na economia global e por ano gera 2,5 mil milhões de dólares em todo o mundo. Em Portugal, o setor representa cerca de 5% do PIB nacional.
E se os consumidores querem estar a par das últimas tendências de moda, também querem cada vez mais que as peças que usam reflitam as suas preocupações de sustentabilidade.
Este foi aliás um dos índices de compra que mais aumentou na valorização dos consumidores norte-americanos e europeus, após o início da pandemia: cerca de 15%, segundo um estudo desenvolvido pelo Business of Fashion e pela consultora McKinsey & Company. Segundo o relatório 2020 Resale Report, da plataforma ThredUp, a venda online de roupa em segunda mão deverá crescer 414% nos próximos 5 anos.
Ao mesmo tempo, dados da Fundação Ellen MacArthur mostram que produzimos hoje o dobro da roupa do que há 20 anos e que apenas 1% da roupa que utilizamos é reciclada, enquanto cerca de 75% é queimada ou depositada em aterros. São ainda necessários 342 milhões de barris de petróleo, por ano, para produzir toda a roupa que ainda inclui plástico na sua composição, de acordo com a mesma organização. No que diz respeito ao consumo de água, 7500 litros é a quantidade média necessária para produzir um único par de jeans, o que equivale à quantidade que um adulto consome durante 7 anos. Segundo a UNCTAD, das Nações Unidas, toda a água usada pela indústria da moda durante um ano dava para combater as carências de água de cerca de 5 milhões de pessoas em todo o mundo.
“Aliar estas duas realidades é um caminho que será tomado por cada vez mais marcas, tornando-se um negócio cada vez mais rentável e um investimento seguro”, refere a organização da conferência em comunicado.
No evento vão estar presentes marcas relevantes a nível internacional como a Pangaia, Tommy Hilfiger e a Farfetch, entre outras. Juntam-se projetos inovadores de criativos como Alan Crocetti, designer de joias, Thomas Berry, diretor de sustentabilidade da Farfetch, Laura Balmond, responsável pelo projeto Make Fashion Circular da Fundação Ellen MacArthur, e Priya Ahluwalia, vencedora do Prémio LVMH 2020. E também nomes nacionais que têm revolucionado a produção de moda sustentável, como é o caso de Mafalda Mota Pinto, CEO da Scoop, Elsa Parente, CEO da RDD Grupo Valérius e Alexandra Pinho, CEO da LMA.
A conferência conta, ainda, com a presença de João Pedro Matos Fernandes, ministro do Ambiente e da Transição Energética, e José Sá Fernandes, Vereador do Ambiente, Clima, Energia e Estrutura Verde da Câmara Municipal de Lisboa.
Ao longo do dia serão discutidos temas como: o lugar de Portugal na produção de moda sustentável, a importância da economia circular, o financiamento Capital Verde a empresas com foco na sustentabilidade. Além das experiências de produção sustentáveis apresentadas na primeira pessoa, será ainda possível conhecer alguns projetos através de uma exposição que irá decorrer na Academia de Ciências.
“Fomos desafiados pelo vereador Sá Fernandes responsável da Lisboa Capital Europeia Verde a desenvolver um projeto singular e relevante para o futuro da moda e dos têxteis no nosso país, expondo os casos de sucesso internacional e desconhecidos a nível nacional. A SFB irá trazer a Portugal marcas de referência no mundo da moda internacional, através do seu testemunho, e apresentar Portugal como pioneiro e parceiro estratégico para o sucesso do negócio, bem como o futuro da moda sustentável”, revela Catarina Santos Cunha, citada em comunicado.
A conferência Sustainable Fashion Business está integrada no programa da Lisboa Capital Verde Europeia 2020 e será uma conferência híbrida.
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